O que mede o grau de
inteligência de uma pessoa é, sem dúvidas, o dinamismo. Alguém que é dinâmico
consegue não só fazer e ser muitas coisas ao mesmo tempo, mas também tem o dom
de se adequar as várias realidades da vida e as pessoas a sua volta. É um ser
que não menospreza o outro, mesmo sabendo que esse outro seja de um nível
intelectual “inferior”. Afinal, infelizmente, aprendemos que ser inteligente é
está dotado de um currículo que comprove isso, quando na verdade a inteligência
vai muito além de uma folha de papel. Inteligência é sensibilidade. Quem é
sensível é capaz de se perceber no mundo e, por essa razão, capaz de perceber o
mundo em si. Essa autorreflexão é determinante para a mudança de tomada de consciência
pessoal e coletiva. É quando dizemos assim: “Ele/ela é um exemplo a ser
seguido/seguida”. Entretanto, em meio a pseudointelectualidades, não enxergamos
que há mais pessoas inteligentes do que imaginávamos.
Se ser inteligente é ser
dinâmico, então temos uma penca de intelectuais não valorizados perto de nós. Conheço
diversas mães, que mesmo com pouca escolaridade, conseguem ser mães,
profissionais e mulheres, numa rotina de vida que poucos acadêmicos
suportariam. Elas, sem currículo ou diplomas, vão além da criação e encarnam o
papel de analistas, assistentes sociais, psicólogas, terapeutas, mesmo sem
nenhum conhecimento dessas profissões. São seres de uma inteligência indescritível,
mas que não são valorizadas, porque não fazem parte dos parâmetros
academicistas. O que é uma pena, pois muitas mulheres, e homens também, exercem
tarefas dignas de grandes estudiosos, como lidar com adolescentes com os
hormônios a flor da pele; o chefe que acorda mal humorado e escolhe justamente você
para descontar a raiva; e o parceiro insatisfeito com a relação. São questões
que exigem um jogo de cintura incrível, que vai da retórica aristotélica aos
conceitos psicanalíticos de Freud.
No entanto, não vemos
isso como elemento que compõe a inteligência, simplesmente porque nos ensinaram
desde cedo que ser inteligente é trabalhar com o cérebro e não com o corpo.
Todo o trabalho braçal está desqualificado de ser algo producente neste
sentido. Essa herança histórica, e na minha visão errônea, nos faz perder a
chance de ver e conhecer tantas pessoas intelectuais presentes em nosso cotidiano.
Basta uma breve conversa com aqueles que ocupam profissões de menor valor
social para constatar a complexidade de suas obras. Ser pedreiro, padeiro,
cozinheiro, marceneiro, encanador, eletricista, dona ou dono de casa, entre
outras carreiras de menor prestígio social, tem igual ou semelhante importância
para o funcionamento da vida em sociedade. E todos aqueles que as exercem são
grandes pensadores, pois conseguem exercer suas profissões com esmero e
talento, mesmo não sendo reconhecidos social e financeiramente por isso.
É fácil para muitos de
nós tachar de irrelevante profissão X ou Y
de alguém, sobretudo numa época onde as pessoas não buscam mais se
profissionalizar apenas pela vocação em determinada área, mas sim pelo bônus
que ela trará. Mais fácil é ainda classificar como burro aquele atendente que
passou o troco errado por engano no supermercado; o operador de telemarketing
que gaguejou no meio da ligação; o frentista que colocou mais gasolina do que
você tinha pedido; o garçom que cobrou os dez porcento pelo bom atendimento
feito, mas que você não quer pagar. Dessas e outras situações, difícil mesmo é
enxergar que naquele ser há muito mais do que um mero serviçal. Talvez seja
alguém tão ou mais inteligente do que você e, por diversas questões, está
ocupando um cargo de menor prestígio social. Porém, estar numa posição desprivilegiada
socialmente não quer dizer que o indivíduo se encontre afundado na ignorância. Pobreza
e inteligência, podem ser parentes próximos, mas não são sinônimos, e isso tem
que ser entendido pelos “intelectuais”.
Não sei andar de bicicleta.
Depois de várias quedas na infância, percebi que não sou hábil a andar em duas
rodas. Também não sei assobiar. Meus lábios, por alguma razão, não conseguem
emitir esse silvo. Nadar está fora de cogitação. Na praia, arrisco-me a ficar
com água acima da cintura, desde que esteja acompanhado de amigos. Se for em
piscinas, procuro a parte mais rasa para não pagar mico. Na lista de
incapacidades ainda estão todas e quaisquer atividades que exijam cálculos
matemáticos. Os números nunca foram parceiros legais comigo e vice-versa. Diante
disso, havia uma frustração da minha parte quando lembrava que não sabia fazer
isso ou aquilo outro. Pior ficava quando via amigos e colegas próximos
realizando tarefas das quais eu desejava, mas nem sonhava em realizar. Quando a
maturidade bateu à porta, finalmente percebi que não era burro por não saber fazer
o que os outros faziam. Tinha outras habilidades e precisava me orgulhar delas.
Mais importante do que
isso foi quando brotou em mim a admiração por aquelas profissões
desprestigiadas socialmente. Percebi que não sou capaz de cozinhar em largar
escala; construir uma casa ou um prédio; consertar um problema na fiação
elétrica da minha casa; nem tão pouco trabalhar com dinheiro na mão, desde
contador a atendente de supermercado.
Porém, hoje consigo admirar quem possui essas habilidades e digo que
quem as realiza possuem uma imensa inteligência. Mais do que isso, sei qual é o
meu lugar e até onde posso ir. Evidentemente que qualquer pessoa pode aprender
a fazer qualquer coisa, desde que tenha interesse para isso. Mas, não se pode
negar que há uma propensão maior de alguns indivíduos para uma área e outras não.
Seja como for, menosprezar quem resolveu seguir um caminho distante dos
conceitos acadêmicos é burrice, pois força, talento e criatividade não estão
limitados à academia.
Na verdade, muitos não se
veem como inteligentes, porque não têm a dimensão de como são importantes para
a sociedade. Nesse momento, o papel da academia é determinante para
desconstruir tal pensamento, já que é nela que as mentes “pensantes” moldam a
vida social. Cada membro de colégios e universidades espalhados pelo país devem
contribuir para isso. Só a educação libertária fará com que valorizemos todos
independente do grau de instrução que possuam. A questão aqui não é valorizar
aqueles que não estão estudando, mas encontrar neles o potencial criativo que
possuem e trazê-lo à luz. É burrice medir a inteligência apenas pela capacidade
de livros lidos e cálculos feitos. Isso é importante sim, mas não se pode
ignorar quem não possui essas habilidades, caso isso aconteça ai sim há
ignorância. E ninguém é burro em totalidade que não seja capaz de exercer algum
papel nessa sociedade. Como dizia Albert Einstein “a
mente que se abre a uma nova ideia jamais voltará ao seu tamanho original”.
Alargue a sua mente.