Uma matéria na edição de novembro de 2010 da
revista Superinteressante fazia uma controversa pergunta (e esta não quer calar
mesmo): “Por que o Brasil lê pouco?”. As causas seriam pelo menos três - falta
desta tradição, no país; pessoas que não trazem o hábito de casa; e a não
formação de novos leitores, item que vai diretamente para a conta das escolas. E o alto
preço da falta de intimidade com os livros apareceu nos desastrosos números da
última prova de redação do Enem, realizada nesta semana: dos pouco mais de 6
milhões de estudantes inscritos, 529 mil tiraram nota zero e somente 250
conseguiram a nota máxima, entre esses, duas pernambucanas - Andréia Lira (18
anos) e Marianne Rodrigues (17).
Evidentemente, a performance das duas não traduz a
qualidade da educação no estado, mas pode ser justificada por pelo menos um dos
três motivos citados pela revista na tentativa de explicar o reduzido universo
de leitores do país: elas leem muito e desde cedo, o que nem serve para
justificar aquela (falsa) crença de que a facilidade de escrever é privilégio
apenas de quem tem perfil para a área de ciências humanas - Andréia Lira (18
anos) está de olho em uma vaga no curso de engenharia e Marianne Rodrigues
(17), no de medicina. Ou seja, mostraram que sem a força do hábito salvador e a
virtude do esforço individual, poderiam, na melhor das hipóteses, ficar entre
os quase 5,5 milhões que escaparam de fazer parte da vexatória lista.
Aliás, a coleção de vexames encontrados nas provas
de redação do Enem podem não levar o candidato a uma vaga na universidade, mas
ajudam a alimentar o humor nacional como nenhum outro assunto. Isso porque,
além de o português estropiado arrancar gargalhadas, ainda existem as pérolas
que nascem de raciocínios deformados pela falta de informação e conhecimento, o
que parece dar sentido à frase “muitos brasileiros foram do analfabetismo à TV
sem passar na biblioteca”. São estas pessoas que, na tentativa de preencher o
espaço do texto, escrevem absurdos como “nos dias de hoje a educação está muito
precoce” ou “está muito difícil de achar os pandas da Amazônia”. E ainda em
torno de temas ligados à natureza, alguns do tipo “os desmatamentos de animais
precisam acabar” e “os lagos são formados pelas bacias esferográficas”.
Se por um lado o desempenho de Andréia e Marianne
atrai holofotes para Pernambuco, por outro evidencia que feitos semelhantes são
uma raridade por aqui quando deveriam aparecer mais amiúde, como resultado de
uma educação comprometida com o futuro. E, é claro, não existe educação de bom
nível sem que o estímulo à leitura nasça em casa e encontre na escola e no
espaço público ambientes propícios para se fortalecer.
Não custa lembrar que, em Pernambuco, a política de
manutenção e criação de novas bibliotecas simplesmente não existe, as que
conseguiram sobreviver até hoje são poucas e servem apenas para abrigar acervos
ultrapassados. Daí se conclui o óbvio: também não há políticas de governo para
estimular o gosto pela leitura, que é essencial não apenas na hora da redação
do Enem, mas em todas. “Quem não lê, não pensa, e quem não pensa será para
sempre um servo”, escreveu certa vez o jornalista Paulo Francis, apoiado por um
dos slogans mais verdadeiros da publicidade brasileira: “Quem não lê não fala,
não ouve, não vê”.
Destruiu muito!
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