23 setembro 2013


É incrível como tabulamos certos assuntos. Mais incrível ainda é saber que esses mesmos assuntos geralmente giram em torno do sexo e seus “mistérios”.  Mistérios que vendem livros, ganham quadros em programas de auditório, circulam em mesas redondas e tantos outros debates pelo país; entre outras pautas importantes sobre esse tema.  Em meio a isso, a virgindade surge como um mito. Ser virgem numa sociedade que apela, grita, vocifera por sexo é o mesmo que não ser desse planeta, ou, é como se o indivíduo possuísse algo de especial, divino, sacralizado no meio das pernas. Nos esquecemos, porém, que uma coisa necessariamente não tem nada a ver com a outra. Na verdade, por diversas razões santificamos o nosso corpo nesse aspecto para ludibriar nossos reais pensamentos lascivos. Geralmente para passar a falsa ideia de pureza para o outrem. Ou, entregamos abruptamente nossa virgindade, movidos pelas pulsões intimamente humanas ou pelas constantes imposições sociais. Nisso tudo paira a dúvida: quando é o momento certo para se fazer sexo pela primeira vez?

Ser ou não ser mais virgem, eis a questão. Inevitavelmente, todos nós passamos por esse dilema na construção da sexualidade humana. A tão temida primeira vez é ansiada por alguns e procrastinada por outros, por razões diversas em contextos também variados. Se no passado possuir o corpo intocado significava ter maiores chances de construir uma família pautada na decência e nos bons costumes, hoje a realidade é bem diferente. Não que a decência e os bons costumes tenham sumidos por completo. Entretanto, não há mais esse peso na responsabilidade matrimonial que obriguem casais de se unirem totalmente intactos no tocante sexo. O que há hoje é algo bem mais perigoso: a utilização maniqueísta da virgindade. De um lado, meninos e meninas pressionados pelas esferas sociais a romper essa fase a todo custo e, do outro, um pequeno grupo utilizando a virgindade como uma relíquia moralizada que deve ser preservada até o altar.
Nesse embate, as meninas são as que mais sofrem. Tolhidas desde cedo por essa sociedade ainda machista, elas são bloqueadas de manifestar suas vontades sexuais pela família, pela sociedade, pela religião e tantas outras esferas que secundarizam os desejos femininos. Sem dúvidas, a pressão familiar, imposta pela sociedade para que a menina se torne uma mulher direita, de bem e honesta, aparece como uma das principais causas disso. Muitos lares ainda educam suas filhas a serem e se casarem virgens, como se isso indicasse honestidade e honradez plena. De fato, quando se quer esperar um pouco mais para se concretizar tal feito, isso deve ser respeitado. Mas, não podemos, enquanto familiares, impor que a virgindade seja encarada como uma honraria ao macho alfa, que terá o maior prazer em desvirginar a sua amada, como num ritual. Ao fazer isso, estaremos regressando a outros tempos, dos quais meninas serviam de oráculos em cerimônias mágicas ou sagradas.
Na verdade, a teatralização em torno do primeiro ato sexual é fruto de todo esse misticismo que envolve a liberação sexual. Acreditava-se, e ainda acreditamos que, entre as mulheres, a pureza deve ser guardada até os últimos instantes. Alimentando isso vem à idealização da virgem Maria servindo de modelo para que meninas se inspirem nisso como devoção. Por isso que muitas sonham em casar-se de branco, pois pretendem fazer parte desse sonho imposto pela tradição religiosa, mesmo que por dentro a vontade de romper esse paradigma seja imensurável. E muitas acabam perdendo sua virgindade de outra forma. Para deixar de ser virgem basta perder a pureza, a inocência e isso muitas delas já não possuem mais, já que há outras formas de se fazer sexo, sem necessariamente ter a penetração pênis e vagina. Além disso, nossa cultura do sexo trata rapidamente de introduzir, muitas vezes de forma errônea, essas jovens no submundo do prazer. É por essa razão que muitas garotas subvertem esse sistema e se entregam deliberadamente aos prazeres, trazendo consequências como gravidezes indesejadas e até doenças. Então, era melhor esperar a hora correta? O melhor era ensinar a essas jovens a ter autonomia e maturidade sobre o seu corpo. Só assim evitaríamos puritanismo e promiscuidade exacerbados.
Na outra ponta do iceberg estão os meninos. Para quem não sabe, eles também sofrem e muito quando o assunto é virgindade. Mesmo vivendo numa sociedade onde o macho dita costumes e regras, quando o assunto é virgindade, nem mesmo ele escapa. Não é muito comum encontrarmos rapazes, nesta sociedade que o inicia cada vez mais cedo no sexo, virgens. Quando isso ocorre rapidamente tratamos de elaborar teorias mirabolantes para justificar o fato. “Acho que ele deve ter algum problema de saúde”; ele pode ter vergonha do tamanho do pênis, só pode!”; “talvez ele seja gay e não quer assumir e fica inventando essa de virgem”. Essas e outras atrocidades são proferidas por muitos ignorantes ao discutir esse tema sob o enfoque masculino. Isso porque, se a mulher sofre para manter a sua virgindade até a data “correta” eles penam para iniciar o quanto antes a vida na cama. Para isso vale tudo: comprar filmes e revistinhas estimulantes, levar a prostíbulos, contratar prostitutas, tudo para que o varão perpetue os estamentos sociais sobre o sexo dominante de que faz parte. Devido a essas atitudes, muitos deles enveredam pelos prazeres sexuais de uma forma incompleta e, muitas vezes perigosa.
No meio disso tudo, há aqueles que se utilizam da virgindade para moralizar a vida social. Numa cultura onde o sexo é altamente banalizado, quem consegue conter seus desejos se torna emblematicamente sacralizado. De certo modo, aqueles e aquelas que escolhem resguardar suas intimidades para momentos mais específicos, com pessoas criteriosamente escolhidas e em momentos planejados, devem ser indiscutivelmente respeitados por isso. No entanto, certos indivíduos usam sua assexualidade para tachar o outro de lascivo, promiscuo e vulgar. Ora, se uns tem o direito de esperar um pouco mais, outros podem realizar tal feito quando assim desejarem. Essa postura conservadora de alguns em relação ao desejo alheio é fruto, sobretudo, da influência religiosa na sociedade. Muitas igrejas pregam filosofias castas, as quais restringem o sexo apenas ao momento do casório. Certo ou errado, alguns absorvem esses conceitos distorcidamente e desconsideram o instinto animal existente em cada um de nós. Em outras palavras, por mais racionais que sejamos na hora da cópula somos tão ou mais selvagens que muitas feras indomáveis.
É por essa razão que os índices envolvendo traumas na primeira relação sexual são bastante comuns. Depoimentos de meninas frustradas com a primeira vez mal realizada, antes ou depois do casamento, brotam aos montes. Da mesma maneira que rapazes despreparados para o ato sexual guardam os constrangimentos e traumas desse momento pelo resto da vida. Diante de tudo isso fica claro que o problema não está em perder ou não à virgindade, nem o melhor momento para tal. A discussão maior gira em torno do sexo. Ele que ainda não é debatido de forma madura entre pais, educadores e religiosos. Por essa razão é que existe essa bifurcação na sociedade: de um lado os que sacrificam seus prazeres e sensações em prol de uma virgindade longínqua e, do outro, aqueles que subvertem esses ditames, nem sempre da melhor forma. Enquanto nada de significativo é feito em torno dessa problemática, a sociedade segue seu curso sexual conturbado e distorcido. Mais e mais jovens são impelidos a seguir um desses caminhos, os quais muitas vezes não levam a felicidade sexual tão desejada por muitos. Dessa forma, o mas prudente é desmistificar a áurea de pecado e santificação sobre a virgindade humana e tentar criar caminhos menos traumáticos para aqueles que cedo ou tarde trilharão o inevitável caminho do prazer.

OS MISERÁVEIS

Vitor nasceu no jardim das margaridas
Erva-daninha nunca teve primavera
Cresceu sem pai sem mãe sem norte sem seta
Pés no chão, nunca teve bicicleta.

Já Hugo não nasceu, estreou
Pele branquinha, nunca teve inverno
tinha pai, mãe, caderno e fada-madrinha.

Vitor virou ladrão
Hugo salafrário
Um roubava por pão
O outro para reforçar o salário.

Um usava capuz
O outro gravata
Um roubava na luz
O outro em noite de serenata.

Um vivia de cativeiro
O outro de negócio
Um não tinha amigo, parceiro
O outro, sócio.

Retrato falado Vitor tinha cara na notícia
Enquanto Hugo fazia pose pra revista.
O da pólvora apodrece impenitente
O da caneta enriquece impunemente
A um só resta virar crente
O outro é candidato a presidente.

SERGIO VAZ


 
 
Acabei de assistir o novo clipe do cantor country Steve Grand, "Stay". Fiquei maravilhado com o vídeo, pelo seu talento, beleza e principalmente sua coragem de se assumir gay desde o começo de sua carreira. Verifiquei os comentários do vídeo, todos mega positivos, mostrando apoio e suporte a nova estrela em ascensão.
 
 
Porém, além de me sentir bem ao final do vídeo, também me questionei: porque não se mostra o mesmo apoio aos vídeos do "Bonde das Bonecas"? Cuja característica também é de ser um grupo que se revelou a pouco tempo e com integrantes gays? Bom, a diferença entre os vídeos do cantor americano e do grupo brasileiro são gritantes: ele é lindo, possui dinheiro pra fazer uma boa produção, possui talento musical apurado, canta em inglês, canta música country com uma pegada pop, possui pose e um jeito masculino, resumindo: está na moda e de acordo com vários aspectos que são chaves do sucesso.
 
Enquanto o bonde das maravilhas é aquele grupo de dançarinos cuja aparência física não é o esperado, vídeos de baixa qualidade de produção, poses e danças bem femininas, são brasileiros e principalmente: dançam funk, o som da periferia, sem nenhuma técnica musical apurada e com suas letras irreverentes e indecentes.
 
 
O cantor recebe uma chuva de elogios enquanto o grupo de dançarinos recebe uma chuva de críticas em seus vídeos, e não só (ou nenhuma) crítica construtiva, mas sim criticas duras e xingamentos que desmoralizam as poses e a afronta que a dança do Bonde das Bonecas ousam em executar, e os comentários quase sempre com tonalidade homofóbica. Por que o cantor não recebe comentários homofóbicos se ele também é gay? O meu palpite: porque ele é gay, mas é lindo, tem dinheiro, instrução, é estrangeiro, tem pose masculina, ou seja, um gay "limpinho". O Bonde das Bonecas mostram o que são e de onde vieram, um grupo de "bichas" da periferia que só querem dançar os sucessos atuais dos grupos de funk ou até mesmo lançam suas próprias produções, não ousam tentar a fórmula de sucesso que o cantorexecuta, são elas mesmas e pagam por isso.
 
Nossa homofobia então é seletiva? Toleramos o gay rico, bonito e masculino e gongamos a bicha pobre, feia e feminina? Muitos podem me dizer que isso tem a ver apenas com a questão dos estilos musicas diferentes, mas eu aposto que muitos que fizeram os comentários negativos nos vídeos do grupo do Bonde das Bonecas já se depararam com outros vídeos de estilos musicas que não eram o seu preferido, e mesmo assim, não precisaram descer sua chuva de comentários maldosos. Porque então o vídeo deles necessita ser tão negativado? É realmente a respeito do estilo musical que estamos falando? Eu duvido muito.
 
Eu ouso chutar que é negado ao Bonde das Maravilhas o direito de fazer sua arte não só pelo fato de serem gays e dançarem funk, mas por não terem uma beleza esperada pela maioria, por terem vídeos de produção pobre e por serem pintosas. Todos deviam poder executar sua arte, ninguém é obrigado a gostar, mas ninguém deveria ter o direito de humilhar ninguém por ousar dançar, cantar ou atuar, por mais "ruim" que aparente ser. Nem todos possuem a mesma oportunidade (ou intenção) de preparar uma mega produção que aparente num vídeo clean e arrumadinho, mas todos possuem o mesmo sonho de poder executar sua arte em paz, nós não podemos arrancar esse sonho com os requintes de crueldade de nenhum artista, por mais que o tipo de arte executada não seja do nosso gosto. Ah, como é bom ser gay quando se é rico, bonito e masculino, não é mesmo?
 
Visto no: Aliança Jovem
 
Sociedade deficiente
A invisibilidade e desprezo com os portadores de deficiência não são comportamentos atuais. Desde a Roma Antiga vê-se o menosprezo com essa população ao sacrificar os filhos que nasciam com algum tipo de impossibilidade. Atualmente, a inclusão social desses indivíduos ainda é um grande desafio no cenário brasileiro.
O nosso país é composto de 800 milhões de deficientes físicos, entre eles 9.300 são cadeirantes, segundo o IBGE (Inst. Bras. de Geo. e Est.). Contudo, as políticas adotadas recentemente para acessibilidade dessa grande população no contexto social são mínimas. As calçadas que parecem ajudar são usadas como pretexto para desvios de verbas, culminando na corrupção.
Um outro problema enfrentado por esses está relacionado ao mercado de trabalho. Vistos como incapazes, foi necessário que o poder público criasse uma legislação para impor multas às empresas que não apresentassem um percentual mínimo de funcionários portadores de alguma deficiência física. Mas a farsa consiste em pensar que a oportunidade oferecida é fruto de uma bondade, quando na verdade, é resultado de precauções a prejuízos.
Além disso, a realidade escolar é bastante limitada ao abranger estudantes portadores de deficiência. A maioria das instituições públicas de ensino não está apta a atender as peculiaridades desse grupo. Mesmo com a determinação da ONU (Org. das Nações Unidas), que consiste na educação igualitária a toda sociedade, o sistema de educação não é amplo e está desabilitado de infraestrutura e professores qualificados para a demanda.
Portanto, como ação primordial para mudar essa realidade de ineficiência, é necessária uma mudança no pensamento social para uma consciência de inclusão. Além disso, uma transformação voltada à capacitação de professores para atender aos deficientes de modo que as principais necessidades de inclusão social sejam supridas. 
Aluna: Acsa Macena
Professor: Diogo Didier
Meninos e meninas têm as mãos queimadas por ácido e perdem as digitais dos dedos no processo de quebra da castanha de caju. Mesmo após denúncias, o problema persiste no Rio Grande do Norte.
 
Passado um primeiro momento de grande arrancada na prevenção e eliminação do trabalho infantil no Brasil, do início dos anos 1990 a meados dos anos 2000, o país enfrenta um novo desafio para manter o ritmo de queda. Enquanto a primeira fase foi marcada pela retirada de crianças e adolescentes das cadeias formais de trabalho, o novo desafio são as piores formas de exploração, como o processamento da castanha, que o poder público tem mais dificuldade de erradicar. O trabalho informal e precário atinge especialmente os adolescentes e jovens e está relacionado à evasão escolar e à falta de alternativas oferecidas pelo mercado. A erradicação requer um plano com ações, metas e indicadores. E uma ação política coordenada.
 
Muitos leitores ficam irritados quando conectamos trabalho infantil ou escravo ao nosso consumo, o que significa nos inserir como parte beneficiária da cadeia de escoamento. Pois não deveriam. Não é culpa que se busca com a transparência da origem dos produtos que consumimos, mas essa informação é fundamental para pressionar governos e empresas a adotarem políticas a fim de garantir que isso não aconteça. Afinal de contas, a ignorância é um lugar quentinho.
 
A reportagem é de Daniel Santini, da Repórter Brasil, que foi a João Camara, no Rio Grande do Norte, verificar as condições das crianças que perdem as digitais no processamento da castanha:
 
 
Olhe a ponta do seu dedo. Repare no conjunto minúsculo de linhas que formam sua identidade. Essa combinação é única, um padrão só seu, que não se repete. As crianças que trabalham na quebra da castanha do caju em João Câmara, no interior do Rio Grande do Norte, não têm digitais. A pele das mãos é fininha e a ponta dos dedos, que costumam segurar as castanhas a serem quebradas, é lisa, sem as ranhuras que ficam marcadas a tinta nos documentos de identidade.
 
O óleo presente na casca da castanha de caju é ácido. Mais conhecido como LCC (Líquido da Castanha de Caju), esse líquido melado que gruda na pele e é difícil de tirar tem em sua composição ácido anacárdico, que corrói a pele, provoca irritações e queimaduras químicas. No vilarejo Amarelão, na zona rural de João Câmara, as castanhas são torradas – além de corroer a pele, o óleo é inflamável – e quebradas em um sistema de produção que envolve famílias inteiras, incluindo as crianças.
 

colocara uma legenda aqui
Com a pele cada vez mais lisa, as pontas dos dedos perdem as digitais, e as linhas e traços de identidade se esfacelam (Fotos Daniel Santini/Repórter Brasil)
 
O óleo é pegajoso. Basta pegar uma castanha e quebrá-la para ficar com a pele manchada por alguns dias. Nem todas as crianças e os adultos que trabalham no processo sabem que o óleo é ácido. Muitos acham que a mão fica assim machucada por conta da água sanitária utilizada para tirar o preto encardido da mão depois de horas seguidas manuseando e quebrando as castanhas torradas. “Se fosse assim, as pessoas que usam água sanitária para limpeza estariam roubadas! É o óleo LCC que tem uma ação irritante, ele é cáustico, produz lesões e chega a retirar as digitais”, explica o médico Salim Amed Ali, autor de diferentes estudos sobre doenças ocupacionais para a Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho (Fundacentro), do Ministério do Trabalho e Emprego. A perda da identidade não é permanente. Com o tempo, as digitais voltam se a pessoa se afastar da atividade.
 
Sobrevivência - O médico fez pesquisas específicas sobre a saúde de trabalhadores de unidades industriais de processamento de castanhas de caju e diz que a atividade pode ser considerada insalubre. No caso em questão, em que a produção é totalmente artesanal e as famílias dependem do trabalho para sobreviver, ele destaca quão contraditória é a situação. “A subsistência está calcada em condições de trabalho inviáveis. Para viver, o sujeito precisa se submeter a condições inaceitáveis e as crianças acabam sacrificadas. Não dá para aceitar isso em pleno século 21”, afirma.
 
Um menino e uma adolescente se revezando ao redor da mesa. A garota é quem cuida do fogo, alimenta a lata improvisada com cascas de castanha e controla as labaredas espirrando água com uma garrafinha. A fumaça sobe e cobre seu rosto. Um cachorro dorme perto do fogo. Eles estão nessa atividade desde a madrugada, começaram às 3 horas. É preciso começar cedo, no sol do sertão nordestino, não dá para continuar com o calor de meio-dia.
Os trabalhos começam cedo, devido ao calor do sertão nordestino; ao meio-dia, o sol é muito forte para prosseguir
 
O garoto tem 13 anos e, assim como a irmã, cursou até a quarta série do ensino fundamental mas tem dificuldades para ler e escrever. Largou a escola na quinta série porque teria de viajar uma hora de ônibus para ir até uma que atende alunos mais velhos, localizada na área urbana de João Câmara – trabalhar e estudar ao mesmo tempo já é difícil quando a escola é perto; quando não há escolas perto, impossível. Ele quebra as castanhas com agilidade, seus dedos fininhos seguram, selecionam e escapam das pancadas duras.
 
São poucas as palavras, ambos trabalham em silêncio e as respostas são curtas. Na mesa vizinha, os mais velhos reclamam da falta de água – a que a prefeitura tem entregue para abastecer as cisternas do bairro é salobra. “Dá dor de barriga e aí a gente tem de comprar água de garrafa, vê se pode”, conta uma mulher de 63 anos, que já passou fome e acha melhor que as crianças trabalhem com castanhas do que colhendo algodão ou roçando pasto para o gado, atividades que exerceu quando criança.
Meninas, meninos, pais, mães e famílias inteiras se misturam para organizar a produção das castanhas
 
Em outra unidade de produção, uma família adapta o ritmo à existência de um recém-nascido. Uma adolescente, também de 15 anos, se reveza com o marido de 18 anos e sai, de tempos em tempos, para amamentar o bebê. “Eu lavo as mãos bem antes de pegá-lo, para não sujá-lo”, conta a mãe, antes de fazer uma pausa às 4 horas. O trabalho costuma ir até as 11 horas e, à tarde, todos trabalham tirando a pele fininha.
 
O emprego de crianças na quebra da castanha de caju está incluído na lista de piores formas de trabalho infantil, ao lado de atividades como beneficiamento do fumo, do sisal e da cana-de-açúcar. A situação a que estão submetidas as crianças de João Câmara (RN) não chega a ser novidade. A auditora fiscal do trabalho Marinalva Cardoso Dantas, coordenadora do Fórum Estadual de Erradicação do Trabalho da Criança e de Proteção ao Adolescente Trabalhador, tem realizado sucessivas ações de fiscalização, denunciado a situação e cobrado soluções. “Não dá para aceitar que as crianças continuem nessa situação, mas não basta reprimir, é preciso oferecer alternativas”.
 
Além de identificar as crianças e reunir informações para relatório a ser entregue ao Conselho Tutelar da cidade, ela também tem procurado cobrar providências por parte da prefeitura sobre a situação das famílias. Os programas sociais são considerados insuficientes pelos moradores, que reclamam da atuação do poder público. “Sabemos do que está acontecendo, mas até agora não conseguimos avançar”, admite Maria Redivan Rodrigues, secretária de Assistência Social e primeira-dama de João Câmara, que promete solucionar o problema em um ano, até setembro de 2014. O Brasil se comprometeu a erradicar as piores formas de trabalho infantil até 2015, mas, mesmo com denúncias, situações com a de João Câmara persistem.
 
Em 24 de fevereiro de 2012, o promotor Roger de Melo Rodrigues, do Ministério Público Estadual, abriu o Inquérito Civil nº 06.2012.00003777-7 após denúncias. “Ele disse que ia processar as famílias, tentou proibir as pessoas de trabalhar, deixou todo mundo apavorado. Foi muito ruim”, diz Ivoneide Campos, presidente da Associação Comunitária do Amarelão. “A fumaça faz mal, a gente sabe, mas as famílias não querem mudar o método com que sempre trabalharam. E não adianta forçar, tem de transformar em querer, ajudar na busca de alternativas”, defende.
 
Procurado para comentar a reclamação, o promotor negou, em nota, que sua atuação tem sido meramente repressiva. Ele diz que “os problemas relacionados à queima de castanha, tais como impacto ambiental, danos à saúde dos moradores e trabalho infantil, não têm passado desapercebidos do Ministério Público Estadual” e que “em vez de buscar a repressão de delitos relacionados ao caso, esta Promotoria tem priorizado o diálogo com a respectiva comunidade, já havendo sido realizadas duas reuniões no local com todos os interessados e representantes de órgãos municipais, estaduais e federais, objetivando a construção de um consenso para solucionar o caso”.
 
O promotor reclama, porém, que embora “busque uma resposta adequada e legítima aos problemas, tem enfrentado alguma resistência relacionada ao costume já enraizado, da parte de algumas famílias locais, de proceder à queima de castanhas ao alvedrio dos respectivos danos decorrentes, o que não impedirá uma atuação isenta e efetiva para a resolução do caso”.
 
Potiguar - Entre as famílias que dependem do processamento de castanhas de caju para sobreviver estão as de um assentamento localizado na região de índios Potiguar, um dos poucos núcleos  remanescentes dessa etnia que no passado povoou o estado inteiro. Os ganhos são mínimos. A castanha crua é comprada de pequenos produtores da região de Serra do Mel. Um saco de 50 kg rende, em média, 10 kg de castanha processada. As famílias contam que ganham de R$ 30 a R$ 100 por semana, vendendo a produção a intermediários que revendem em feiras e mercados de cidades.
Assim que as castanhas estão torradas, as mãos se levantam; pancadas quebram uma noz, depois outra e outra, e outra
legenda ae
O óleo se esparrama em torno das unhas, pela ponta dos dedos e, quando se vê, as mãos inteiras já estão cheias de ácido
 
“Tentamos identificar quem lucra com isso, mas é um sistema muito primitivo. As indústrias organizaram a produção e estão processando diretamente as castanhas, não identificamos nenhuma envolvida. Os intermediários são pequenos comerciantes que adquirem o produto diretamente com as famílias”, explica o auditor fiscal José Roberto Moreira da Silva.
 
Criatividade na busca por soluções para as famílias não falta. Nilson Caetano Bezerra, do Fórum Estadual de Erradicação do Trabalho da Criança e de Proteção ao Adolescente Trabalhador Aprendiz, por exemplo, sonha em fazer parcerias com as empresas de produção de energia eólica, que fazem multiplicar o número de torres de geração na região, para empregar adolescentes como aprendizes. E em providenciar máquinas para que os adultos não tenham de manusear as castanhas torradas. Experiências com mecanização já aconteceram, mas o descasque manual ainda é o preferido porque a taxa de desperdício é menor.
Mesmo que já exista formas de produção mecanizadas, ainda há preferência pelas técnicas manuais, que seriam mais produtivas
 
Em fevereiro, o juiz Arnaldo José Duarte do Amaral, titular da 9ª Vara do Trabalho de João Pessoa, visitou a comunidade e também encontrou as crianças trabalhando na produção de castanhas. Ele escreveu um artigosobre a questão e, desde então, tenta articular soluções e envolver mais interessados em resolver o problema. “Quando estive lá como juiz, me perguntavam se ia prender alguém. Não é esse o papel do judiciário, o objetivo não é prender ninguém, é achar solução”, diz, defendendo a formação de cooperativas e mecanismos de economia solidária como o melhor caminho para erradicar o trabalho infantil e melhorar a condição de trabalho dos adultos. “A gente tenta corrigir essas questões há séculos, sem sucesso. Não bastam ações repressivas, que vão além de tentar punir.”
 
(Reportagem produzida em parceria com Promenino/Fundação Telefônica Vivo, e publicada também no site Promenino, que reúne mais informações sobre combate ao trabalho infantil)
Visto no: blog do Sakamoto
 
Entre o mundo virtual e o real
          A atividade lúdica sempre esteve presente no cotidiano social. Entretanto, com a Revolução Tecnológica, os jogos eletrônicos passaram a arrebatar milhões de jovens brasileiros, levando-os ao gasto de tempo exacerbado e também à fuga da realidade.
          Entre os vários benefícios ocasionados pela tecnologia; os prejuízos causados pelo gasto de horas em frente a aparelhos eletrônicos são imensuráveis. Além da agressividade, como mostra o caso dos irmãos Willian Buckner (16) e Joshua (14), que atiraram contra uma rodovia uma rodovia estadual em Tenessee, Estados Unidos, após jogar “Grand Theft Auto”, são gerados problemas de postura, sedentarismo e até obesidade.
         Ainda pode-se considerar a interferência nas relações e interações grupais. Já a fuga da realidade é ocasionada pela vontade de ser o melhor, já que na vida real nem sempre é possível. Consequentemente, o desempenho nas aulas é a área mais afetada, de acordo com o psiquiatra Daniel Spritzer, coordenador do Grupo Estudos sobre Adições Tecnológicas (Geat).
         Assim, tendo-se em vista o grande poder de alienação que os aparelhos eletrônicos possuem, algumas hegemonias políticas tentaram utilizar-se dessa ferramenta a fim de manipular a população. Com o propósito de reforma educacional, os alunos da rede pública em Pernambuco receberam “tablets” sem nenhum tipo de instrução quanto ao uso, ocasionando a criação de uma rede de jogos internos que dispersava-os durante as aulas.
          Portanto, estabelecer uma eficiente restrição legal para a execução de jogos eletrônicos seria uma das maneiras de resolver os prejuízos ocasionados por esses. Além disso, é necessário obter um bom senso através de propagandas que instruam o tempo ideal do uso de tecnologias para que haja a separação do mundo virtual do real.
Aluna: Acsa Macena
Professor: Diogo Didier
Gente que teve a indigência da cidadania carimbada pela coragem de passar um batom
 
Uma das primeiras vezes que vi uma transexual foi em uma roda familiar em volta de uma revista Fatos e Fotos.
 
Anos 1980, edição daquelas de Carnaval.  Roberta Close, no ápice da fama, cercada de rapazes sarados, em algum baile carioca. Ouvi logo a porrada: “Safados que se aproximam de uma peste dessa”. Safados eram os caras. Peste, Roberta. Outras vezes em que vi e ouvi sobre transgêneros, palavras do calibre de safado e peste vinham na esteira.
 
Vi Rogéria dando entrevista a Hebe Camargo. “Essa bicha velha ainda faz sucesso. Já devia ter sido morta pela aids”.
 
Cláudia Raia interpretou uma que volta para casa já mulher para surpresa de todos na novela As Filhas da Mãe. “Como é que pode um negócio desses na televisão? É para desmoralizar”.
 
Eu as vi nas ruas, na madrugada, na vida. Certa vez um taxista emendou: “Olha as bichas tudo sem-vergonha. Deviam levar um tiro”.
 
Nas boates gays, elas, em grupo, como em um cercado imaginário. Poucos se aproximam. Poucos querem papo.
 
“Queima o filme” é a crença e a desculpa. “Se juntar com travesti? Deus me livre. Quero distância” é a prática.
 
Assisti a um breve documentário de uma parada gay em Nova Iorque onde havia uma transexual lésbica. Deu aquele tilt no meu juízo. Como pode um cara que gosta de mulher, virar mulher para pegar mulher? “Encosto espiritual. Cuca em total desordem”, raciocinei na ignorância.
 
Perto do Parque do Ibirapuera, em São Paulo, uma sambava em frente a uma batucada, em um domingo ensolarado. “Depois não quer levar curra. Um veado desses”, já disparou um colega gay.
Aprendi dia a dia que transgênero o mundo resumia, e ainda resume, em traveco ou sapa braba.
 
Reles gay/lésbica que exagerou ao cúmulo do absurdo. Errados demais, que não precisavam da metamorfose, que para gostar do mesmo sexo são dispensáveis peitos e bundas de silicone ou retirar seios e criar barba. Poderiam ser homens e mulheres como qualquer outro, na linha “normal”, se curtindo ocultos, para evitar choque nas vistas alheias.
 
Dizem ser eles sujeiras na comunidade. Que perto deles se acaba qualquer disfarce, o poder de se misturar à paisagem. Como sirenes apitando, holofotes acesos. Não mais se é invisível.
 
Sempre me foi, ainda é, martelado que não passam de ladras, traficantes, certeza de chave de cadeia, de navalhada na cara. Que o ideal é passar longe. Que servem apenas para dar se rir dos trejeitos e da voz. Para dublar no palco, naquele momento diva. Mas que fiquem lá. Distantes. Nos bastidores.
 
Sempre me dizem que enganam os homens, que se mascaram de mulher para fisgá-los quando bêbados e desonrá-los. Armadilhas humanas. Que ficar atento se há volume entre as pernas ou no pescoço é imprescindível para não trocar gato por lebre e se evitar a vergonha eterna.
 
O adjetivo, a definição e as consequências ligados aos transgêneros que me chegam são os piores.
 
Que odiá-los/las, no mínimo, escanteá-las/los, é o mais prudente a fazer.
 
E a gente cresce, acredita e se formata em mentiras. Cria medo de tocá-las/os, de conversar. Faz de conta que não viu, desvia de fininho, se algum/a chega perto e puxa assunto.
 
A gente acha que é o certo segregá-las/os. Que vai se preservar, que escapará das suspeitas, que nada no mundo pode ser pior se a ligação for estabelecida. A gente acha por que o medo de ser discriminado a reboque é real e forte, maior que a solidariedade e a necessidade de entendê-los/as.
Raro se escuta sobre como se nasce em um corpo quando a alma pede outra identidade

Raro se escuta sobre como se nasce em um corpo quando a alma pede outra identidade. Quando se escuta, tantas vezes não se quer ouvir, se quer seguir no que pregam por aí. E, assim, se integra à massa, se desvia das discussões, se é aceito como uma opção melhor, que não fere tanto os padrões emoldurados, se vira, digamos, um “gay exemplar”.
 
O interesse em saber como elas/es constroem a consciência de si mesmos quando o entorno diz que eram para ser de outro jeito se resume a quase zero. O senso comum basta. Um desumano “problema deles. Quem manda querer ser mulher quando se é homem, ser homem quando se é mulher? Coisa nada a ver. Que feio. Loucura. Aberração”. Curiosidade mínima pelo que sentem, o que passam.
 
Nem aí para os tratamentos, cirurgias e dores aos quais se submetem. A gente acha simplesmente desnecessários, injustificáveis passar por tudo isso por uma pinta mais forte. Volta o cruel “problema deles. Culpa deles/as se acabam no isolamento, na prostituição, na sarjeta”.
 
A gente presume que não é para amá-las/los. Que quem gosta, se apaixona, assume e vai viver com um/a deles/as deveria pegar um homem ou uma mulher de “nascença”, que se crê como os de verdade. Que seus amantes devem ser tão desvirtuados quanto, tarados ao máximo, tão indignos de ser gente quanto.
 
A gente, gota a gota, se torna insensível. Não liga se eles/as  transformam o corpo com o que têm a mão, pela falta de grana, de informação, pela necessidade urgente de se enxergar perto do que se quer. Nem damos bola se acabam agredidas/os por cafetões, pela polícia, entre si.
 
A gente acha que pediram por isso, que escolheram ser assim, que aguentem ser alvos de pedradas, latas de cerveja, balas de revólver dos pitbulls precisados de autoafirmação.
 
A gente desdenha em saber o sofrimento na escola quando eram estudantes, em alguma loja na hora de comprar sapatos, com os rostos se virando espalhando raiva quando entram em algum restaurante, com pais e mães carregando filhos para longe quando se aproximam, as chacotas que nunca cessam.
 
A gente faz de conta que não é com a gente, que a porrada que pega na pele delas/es não pega na nossa. A gente as/os usa para desviar o preconceito  e sairmos ilesos, como se a mira homofóbica fosse única e os barcos fossem vários e distantes.
 
Mas a gente pode mudar. Pode dar um basta na idiotice. Ter uma luz, querer se informar. Aí nos aparecerem histórias como a de Katie Hill e Arin Andrews, ambos trans, apaixonados um pelo outro. Felizes. Como a de Laysa Machado, que já catou comida no lixo e virou diretora de uma escola estadual no Paraná, apoiada pelos alunos.
 
Feliz. Como a de Lea T., filha de Toninho Cerezo, crescida no ambiente supermachista do futebol, hoje modelo de sucesso, admitindo dores físicas e mentais, dúvidas e certezas, após o genital trocado. Mas em frente. Feliz. Como a de Laerte Coutinho, que passou a usar vestido e maquiagem e afiou mais seus quadrinhos pela causa dos direitos iguais. No ativismo. Feliz.
 
E mais  histórias chegam, a cabeça dilata, se abre, o coração acolhe. O com aparência de menina passa a  menino, gostando de meninos e meninas. A menina, antes menino, mas que curte só meninas. A que foi expulsa logo cedo de casa e só teve o sexo vendido como escapatória. A que conseguiu ser professora. A que se formou dermatologista. Relatos lidos e escutados deles/as e não mais de quem as/os julgava e condenava pelo ouvir dizer.Diversos casos, orientações, receios, convicções. Parecidos em tantos pontos, longínquos em outros mais.
 
Felicidades contagiantes por um RG com o nome pelo qual se lutou tanto, por um casamento que se sonhou demais, pelo discurso que se faz para um público atento e aberto a compreender. Tristezas pelas notícias de suicídio de quem ruiu, por quem padeceu em mãos assassinas.
 
Gente que teve a indigência da cidadania carimbada pela coragem de passar um batom e botar um vestido ou dar um corte militar no cabelo e calçar coturnos, Gente que  a vida tratou com agressividade, que responde com um I Will Survive dos mais animados. Que sempre deu a cara para bater, aos gritos de “Existimos!”, enquanto tantos enrustidos e envergonhados achavam que o melhor era a penumbra, não provocar, suportar a submissão.
 
Gente a quem peço minhas desculpas pela meu passado de equívocos. Eu não vivo mais lá.
 
Visto no: NE 10

08 setembro 2013

Amor e ódio, céu e inferno, claro e escuro, Deus e o Diabo, brancos e negros, héteros e gays, religiosos e ateus, homens e mulheres. Percebe-se que a construção da humanidade foi sedimentada através de embates, impasses entre o mais forte e o mais fraco, o certo e o errado, o aceitável e o inaceitável. Esse maniqueísmo, em parte, foi positivo, pois criou os limites entre o bem e o mal, afastando do convívio social alguns riscos nocivos à vida. No entanto, outros foram agressivamente prejudiciais para as relações humanas, uma vez que tinham como pilar o preconceito e a discriminação do diferente, geralmente pautado em argumentos fracos e historicamente antagônicos. A exemplo, pode-se mencionar o inflexível machismo preponderante em várias sociedades, sobretudo a brasileira. Símbolo da herança patriarcal, ser homem por aqui, dentro dos padrões do macho alfa, é sinônimo de governança. Imperialismo esse seguido à risca por súditos inconscientes que, precocemente aprenderam que ele manda e ela, passiva, obedece.
Essa diferenciação entre os gêneros acontece muito antes da concepção. Isto porque, muitos pais nutrem um desejo cultural de gerar filhos homens, varões, que irão perpetuar o legado patriarcal familiar. Tal conduta, sócio e historicamente conhecida, foi determinante para que o machismo reinasse até hoje na sociedade. Por causa dele, mulheres, homossexuais e qualquer outro grupo “afeminado” sofrem por não possuir a herança dominadora daquele grupo. Na verdade, é a semente da segregação sexual que é plantada no berço, determinando quem irá ser a caça e o caçador. Ou seja, ser do sexo masculino é sinônimo de controle, dominação, territorialismo e outras tiranias do gênero, enquanto o oposto recebe instantaneamente significados diferentes a esses.
Entre os vitimados, as mulheres são indubitavelmente as principais vítimas dessa cultura separatista. Segregadas aos trabalhos do lar, a “Amélia” do passado ainda encontra resistência para se firmar perante a sociedade onde o macho é o centro das atenções. Entre as múltiplas diferenciações estão àquelas ligadas a atmosfera trabalhista, das quais o sexo feminino ainda ganha valores inferiores ao oposto. Tal prerrogativa ocorre, mesmo com a ascensão delas no mercado de trabalho, porque muitos deles creem na incapacidade das mulheres, como se estas tivessem sido destinadas apenas aos serviços domésticos. Ou seja, qualquer transgressão a esse sistema significa ultrapassar uma fronteira intransponível, passível de retaliação pelos os que pensam dessa forma. Felizmente, essa mentalidade vem sendo mudada, mesmo que na força, por algumas que não se deixam intimidar por tais visões.
Por outro lado, deve-se pontuar também a questão do gênero enquanto apelo sexual. O menino aprende desde cedo que é o caçador, hábil e viril, e as meninas são as suas incontáveis presas. Determinados a cumprir o destino que lhes foi designado, muito garotos crescem com essa postura, da qual a garota deve sensualizar para ele, servir de objeto sexual a ser facilmente consumida quando ele bem desejar. Sabendo disso, a cultura midiática tratou rapidamente de potencializar essa visão através dos comerciais de bebidas, filmes, novelas, seriados, entre tantos outros dos quais a mulher está no segundo, terceiro, no finalíssimo plano. E não é difícil de encontrar jovens ou maduras mulheres que se renderam a essa prática predatória. Inconscientemente, muitas delas se deixam levar por esses estamentos, já que foram educadas por essa redoma e, por isso, não conseguem encontrar os subsídios para fugir dela. Quando encontram, porém, são tachadas de assexuadas, feministas, lésbicas, revoltadas, apenas por discordar desse sistema onde o mais forte, os homens, sempre devem vencer.
Nesse nicho desumano, outro fator acabou sendo prejudicado: a sexualidade da mulher. Por perder a autonomia do próprio corpo, ao longo da história, ela se acostumou a ser o “sexo frágil”, “a costela de Adão”. A parte e nunca o todo, naqueles sentidos. Essas desvantagens corroboraram na tardia sexualidade feminina, a qual só deu os primeiros passos em meados do século XX, com o BOOM da minissaia e do biquíni. Mesmo assim, ainda hoje, questões ligadas ao aborto, fecundação, separação, traição, soam como verdadeiros estigmas para aquelas que ousarem transgredir o já estabelecido mundo masculino. É por essa razão que o senso comum penitencia as mulheres que abortam; que não desejam ter filhos; que se casam e se separam quando acham convenientes; e que traem seus companheiros por diversas razões. Todos esses feitos, também realizados pelos homens, só são criminalizados entre as mulheres por causa dessa cultura que inferioriza um gênero e enaltece outro, como se a genitália fosse o determinante para a construção do caráter humano.
Porém, isso não se limitou apenas as fêmeas. A homossexualidade também sofre a duras penas o dissabor dessa sociedade centrada no macho. Isto porque, aprende-se desde cedo que há uma anormalidade entre os indivíduos que sentem desejos por pessoas do mesmo sexo. Eles, os gays, são vistos como a deformação do macho ideal, bruto, grosso, viril e truculento. Aquele que coça o saco, chama palavrão, torce fanaticamente por algum time de futebol e, se possível, ainda bate na companheira para sustentar a sua masculinidade perante a sociedade. Logo, a homossexualidade aparece neste contexto como um defeito de fábrica, uma afronta ao imperialismo que o homem vem historicamente perpetuando. Na verdade, os gays são tudo aquilo que a virilidade masculina tentou afastar da sua personalidade: eles são femininos. Ou seja, a homossexualidade não é aceita também, porque se remete ao universo mulheril, este considerado inferior, frágil e submisso.
E, engana-se quem pensa que a semente do machismo deixou de ser plantada. Ela vigora nos terrenos vertiginosos das famílias mais conservadoras, onde a herança patriarcal se mantém viva em discursos dos quais os meninas são ensaiadas a serem donas de casa, nas fadadas brincadeiras de bonecas. Também ganha espaço em algumas religiões e nos seus respectivos posicionamentos, que subestimam as mulheres, inferiorizando-as muitas vezes. Tudo isso numa sociedade onde a genitália determina quem ganha e quem perde. É meio controverso pensar que isso ainda aconteça, sobretudo numa era ditada pela efemeridade das relações humanas e pelo desapego que muitos nutrem sobre o próprio corpo. No entanto, quando a questão se refere a domínio, as nomenclaturas macho e fêmea surgem exatamente nesta ordem alfabética, para deixar claro a secundarização feminina perante o homem, a sociedade e até ela mesma.
Percebe-se, portanto, que as problemáticas em torno da imposição de gênero estão ligadas a questões meramente culturais. Não há, nem nunca houve sexo inferior ou superior. O que há é uma ditadura ridícula que tenta desumanizar o outro baseado apenas nas suas genitálias. Enquanto não se percebe isso, homens e mulheres vão repassando, conscientes ou não, esse perigoso legado para outras gerações, dificultando o extermínio de tais pensamentos. É por isso que o machismo ainda ganha força na sociedade, porque ele brota no berço, logo nas primeiras horas de vida de meninos e meninas. É como se o destino de ambos os sexo estivesse traçados para cumprir distintos caminhos: ele, ser forte, hétero, dominador, garanhão e bem sucedido. Ela, porém, ser frágil, meiga, feminina, dominada, recatada e se possível uma excelente dona de casa. Para desconstruir isso, basta a sociedade entender que entre homem e mulher só existe uma semelhança: a humanidade. E esta deve ser irrevogavelmente respeitada. Ou seja, independente de sexo, o que deve prevalecer é, antes de tudo, o ser humano.
           Ao se observar o panorama da formação cultural do Brasil, palavras como pluralidade e miscigenação são frequentemente utilizadas. No entanto, aceitar o argumento sem analisar profundamente nosso cenário cultural, pode ser um equívoco, uma vez que ainda há um preconceito em relação a culturas consideradas de massa. Isto leva uma parte da sociedade a pensar que cultura é algo restrito a poucos. Pois, muitos acreditam que a verdadeira cultura está nas musicas e nos escritores que são socialmente aceitos pela elite, que por sua vez constitui e minoria.
            Neste cenário de preconceitos, há quem diga que ler obras de autores com o estilo Augusto Curi e Ágatha Christie é algo desnecessário, visto que suas formas de escrita não oferecem elementos enriquecedores para a formação cultural da sociedade, uma vez que não são tão reconhecidos quanto uma obra de William Shakespeare. Contudo, como se sabe, qualquer conhecimento é válido. Isto porque, sem dúvidas, a leitura traz consigo um grande poder de transformação, mudando assim a forma de pensar e agir da sociedade, não importando se é lido pela massa ou pelas elites.
            Além disso, como se sabe, os diferentes estilos musicais também vêm sofrendo com este preconceito. Ritmos como funk, brega e sertanejo caipira, são os principais alvos de uma sociedade culta, uma vez que segundo muitos, são estilos musicais de pobres, negros e moradores de favelas. No entanto, esses ritmos vêm trazendo benefícios a regiões que outrora eram isoladas, mas hoje, servem de berço para os novos artistas que estão surgindo ao longo dos anos. Como é o caso do Pará, antes esquecido e hoje reconhecido por seus artistas, como Gaby Amarantos e a Banda Calypso. 
 
            Infelizmente, o que poucos conseguem enxergar, é que muitos desses “artistas de morro”, expressam através de suas músicas, as deficiências da nossa sociedade tão cheia de mazelas e preconceitos. Uma nação que por ser considerada miscigenada e acolhedora, deveria dar ouvidos ao que cada cantor tem a falar. Suas letras expressam insatisfação com a política, a violência nas comunidades carentes, o descaso com os moradores de rua, conflitos pessoais, entre tantos outros problemas que estão cada vez mais presentes na vida de grande parte da população.
 
            Portanto, faz-se necessário que cada indivíduo passe a entender o verdadeiro significado de cultura. É preciso que a sociedade compreenda que cultura não se trata apenas daquilo que é apreciado pelos mais cultos, mas sim, pode ser considerada uma maneira que muitos encontram para expressar suas necessidades e pensamentos sobre o mundo. Um dos grandes problemas da nossa sociedade é utilizar a cultura como forma de nivelamento social, quando muitas vezes, os mais eruditos, não absorvem para a vida nada do que ouvem ou leem.
Aluna: Juliana do Nascimento
Professor: Diogo Didier
Juninho aprende a ser homem, macho, como se espera, é o que tem que ser
 
Juninho nasceu. Dia de festa na família, de orgulho. O filho varão. Quarto azul, roupinhas azuis. Azul é o ursinho. Azul é o chocalho. Trata-se de um menino, homem, e tem logo que ser identificado com tal. Não deixar dúvidas.

Juninho é carregado pelos tios e logo seu pênis, mesmo diminuto, é louvado. "Pintão!". "Esse puxo ao tio!" As tias se apressam em arranjar um par para quem tem um dia de vida. "Agora a filha de Maria e João tem com quem namorar", diz uma. "Tem também a de Pedro e Juliana", lembra outra. Chegam logo a um consenso que ele dará conta de todas.

É garanhão. É homem. Surge a conclusão que ele estava virado para o lado direito, pois, nessa posição, poderia ficar de olho na menininha ao lado no berçário. Conversa vai conversa vem, alguém lança a teoria que quando ele chora as garotinhas se calam para escutar o grito másculo do conquistador.

Juninho é homem e como homem será criado. É uma família que nutre a testosterona, a macheza, com muito cuidado. Não podem fraquejar, por tudo a perder.

O menino cresce e é teleguiado na ordem. Bola e carrinho. Falcon e Comandos em Ação. Um dia Juninho tocou em uma Barbie. De imediato foi repreendido. "Não é para menino". Ele beijou um amiguinho na bochecha. Recebeu uma bronca maior. Roubou um beijo na boca da coleguinha.
 
Quanta alegria dos pais, que fingiram desaprovar diante dos familiares da garota, mas comemoraram em casa o avanço do amado homenzinho. "Esse não nega. Vai pegar todas. Hehehehe!" Como o pai está feliz.
 
É gradual. Juninho aprende a ser homem, macho, como se espera, é o que tem que ser. O tio o abraça e pergunta: "Quantas namoradas já tem na escola?" Juninho responde: "Sete". O abraço fica ainda mais apertado. Respondeu assim... na obrigação, no escapa. De tanto ser questionado e ficar perdido sem saber o que falar, contou as amigas de classe e jogou o número na inocência. Foi premiado, viu que agradou. Tempos depois aumentou para oito. Mas comemorado ainda. Juninho fixou que quanto mais aumenta a soma, mais homenageado é.

Aprendeu. Homem tem que pegar muitas, tem que contar que pega muitas e aí causa contentamento. Mulher é feita para ser apanhada. Juninho já sabe que isso "é coisa de homem", que "homem é assim mesmo", "que quem quiser que prenda suas cabritas que o meu bodinho está solto". Juninho fixou.

http://produtos.ne10.uol.com.br/saojoao/wp-content/uploads/2013/08/juninho3.jpg

Chegou na adolescência e tem consciência de que o mundo é machista, desde o começo é desse jeito, fim de papo. Ele dos que saem e paqueram. Dos que se ligam em uma garota e vão para cima. Dos que acham que a fêmea tem que ceder, que sua cantada é imbatível, que insistir é fundamental.
 
Juninho aprendeu com os parças que a mulher vai ali para ser incomodada, que ela faz doce, mas ela está querendo, que não tem que abrir para o beicinho dela, que macho que é macho não desiste. Ele já beijou forçando, puxou cabelo, levou tapa na cara e bateu de volta.

Juninho modelou a mente para identificar a menina para ficar e a para namorar. Normas que ele segue à risca, porque homem que é homem de respeito não se liga à vagabunda, não quer ouvir "tás com uma rodada?". Para namorar é a menina com menos fama de ficante possível. A comportada. A virginal. Para dar uns pegas é a liberta, a sem amarras, que ele conhece como piranha. A que não vai rejeitá-lo. A que taxaram como sempre disponível. Que é ir lá e pimba!, já pegou. Que se recusar ele tem o direito de reclamar: "Como assim ele ser recusado?", "Como assim aquela puta posar de difícil?". Juninho não entende. Não admite. Não foi o que lhe disseram desde sempre, está fora do eixo.

Não é o que lhe cobram. Juninho sabe que precisa corresponder. Caso algum requisito do macho ideal falte em sua ficha, ele tem que pagar. Preço, para ele, duro.

Se Juninho tropeçar diante da banca examinadora, que nunca para de fiscalizar, é chamado de gay. Instantâneo. Se fraqueja na caça sexual, é veado. Se usa um sapato fora das regras, é boiola. Se pede um chá na cantina da escola, é bicha.

Inadmissível para ele. Juninho foi doutrinado para pensar que, mas que tudo, homossexualidade é o que há de pior. Que seus tios e tias, primos e primas, avôs e avós, mãe e pai, sempre o guiaram no cabresto, com tanta pressão, tanta vigilância, tanto esforço, para evitar a desgraça. Que ele pode ser tudo. Machista, tarado, bandido, dar desfalque, trair um amigo, ser violento, mandar pessoas para o hospital. Tudo. Menos a desonra de ser gay.

Juninho treme apenas em pensar na possibilidade de que alguém bote sua macheza em dúvida. Nunca. Logo ele que para desmerecer chama logo de veadinho. Logo ele que vai para o estádio torcer e grita sem parar "Fulano, veado", "Time de mariquinhas". Que nem cogita ter um jogador homossexual manchando as cores de seu manto sagrado. Que caso ocorra vai ameaçar o cara,manda sair, já em pânico pela chacota que o adversário vai fazer pelo resto da vida.

Logo Juninho que não lava um prato, nem arruma a cama por ser trabalho de mulher. Logo ele que abusa dos gesto viris. Que abraça amigo quase na porrada para que o afeto não seja confundido com delicadeza. Que grita palavrão quando uma garota de minissaia passa, que coleciona Playboys, que de jeito nenhum chora porque nada a ver ser sensível, que transa mesmo sem estar a fim apenas para manter a reputação intacta.

Que acha que o mundo corre perigo de enveadar por causa dos direitos LGBTs. Que ficou sabendo que ativista homossexual é gayzista, que ser homofóbico é apenas bater em gays, que destratar, querer que continuem subcidadãos, subalternos, é defender o orgulho hétero, as famílias, a ordem natural. Que acha o mundo é hipócrita, já que ninguém quer ter filho gay, mas ficam defendendo.

Juninho é algoz e vítima. O mundo, que ele tanto acredita ser imutável, que como está deveria ficar, solidificou aos poucos, desde quando bateu suas primeiras palminhas, o que ele prega.

O mundo de Juninho é o de verdades velhas, fabricadas por interesse, de seus antepassados, que ele absorveu como suas. De que há pessoas subordinadas, que o lugar delas é aquele, que não têm nada que contestar. Elas têm é que se contentar.

Juninho é um rei. Está no lucro. Posto no topo da cadeia alimentar, em um ecossistema onde outros são presas. Para capturar, acasalar, procriar ou para destruir. Ele luta para perpetuar seu lugar dominante.

Juninho não atenta, em seu silêncio crítico e criativo, o quanto ele nada tem de atitude. De ele mesmo. É um papagaio, uma cópia. Um escravo, que asfixiou uma parte de si para dar satisfação, se moldar ao que se quer dele. É passivo.

Mas Juninho está nem aí, nem vai chegando. Raciocínios novos são frescuras de veado. Ficar lamentando injustiça é mimimi de veado. Homem bebe, arrota e dá no couro. E fica tudo bem.

Juninho tem mais é que se preocupar com o casamento que se aproxima. Com menina que ele desvirginou e engravidou. Não está muito na de juntar as escovas de dente, já caiu na greia dos companheiros, de que vai para a forca, que perder a liberdade, mas ele se compromete a não deixar a farra e a pegação. "Mulher em casa nada impede mulher na rua". E arranca gargalhadas. Se não der certo, separa e volta por completo para a curtição.

O importante é que Netinho nasce daqui a seis meses. Enxoval azul já encomendado. Max Steel e Hot Wheels na prateleira. Netinho vai puxar ao pai. Macho todo.
 
Visto no: NE10
 
Gritos que fizeram história
Sem dúvidas, é possível observar que o suposto sexo frágil está conseguindo romper cada vez mais um fragmento do seu estigma fraco. É admirável o que elas conquistaram ao longo da história. Rompendo silêncios seculares, conseguiram a liberdade sobre o seu corpo a partir da conquista da pílula anticoncepcional, conquistaram o direito ao divórcio, ao voto e a inserção no mercado de trabalho. Hoje, elas abandonaram o estereótipo de dona do lar e mostraram que também podem ocupar cargos que ates eram considerados exclusivamente masculinos. Diante disso, é possível observar que a mulher já obteve muitas conquistas, no entanto ainda há muito a ser feito em prol dela.
Entre o silencio do passado e anova polifonia, entre as esposas obedientes e as independentes, a legião de executivas e uma eleição com duas candidatas à Presidência da República, existe um histórico de proibições e censuras. Estes foram estagnados em uma longa batalha pela conquista da independência feminina. Tal vitória resultou no surgimento de mulheres que fizeram e continuam fazendo a diferença ao longo da história do nosso país. Como exemplo temos Dilma Rousseff, Anita Garibaldi, que lutou ao lado do seu marido na Guerra dos Farrapos, e Maria da Penha.
É importante destacar que mesmo diante de tantas conquistas, a mulher ainda é bastante inferiorizada. Salários baixos, falta de respeito e violência infelizmente são as amarras que ainda estão presas ás mulheres. Segundo dados do IBGE, até o ano de 2012, o salário da mulher ainda é aproximadamente 30% mais baixo que o do homem, são por tais descasos que cada vez mais pessoas vão as ruas reivindicar, mostrando que estão dispostas a mudar o modo de pensar da sociedade, a correr atrás dos seus objetivos e recusar as imposições. Como disse Clarice Lispector: “Porque há direito ao grito, então eu grito”.
Sendo assim, fica claro que apesar da ascensão ainda há muita coisa a ser feita em prol do gênero. O que elas querem de fato é igualdade de salários, mais representação política, respeito, menos violência e que seus gritos sejam ouvidos, para que possam caminhar em direção a um mundo onde as reivindicações por direitos que deveriam ser garantidos a elas, não sejam mais necessárias. Para que finalmente sejam chamadas de sexo forte. Essas são as Marias citadas por Milton Nascimento, mulher com força, raça, gana e que tem fé na vida para alcançar seus objetivos.
 
 
Aluna: Juliana Do Nascimento Ferreira
Professor: Diogo Didier
     
      Professores e professoras apaixonados acordam cedo e dormem tarde, movidos pela ideia fixa que podem mover o mundo. Apaixonados, esquecem a hora do almoço e do jantar: estão preocupados com as múltiplas fomes que, de múltiplas formas, debilitam as inteligências.

     As professoras apaixonadas descobriram que há homens no magistério igualmente apaixonados pela arte de ensinar, que é a arte de dar contexto a todos os textos. Não há pretextos que justifiquem, para os professores apaixonados, um grau a menos de paixão, e não vai nisso nem um pouco de romantismo barato. Apaixonar-se sai caro!

     Os professores apaixonados, com ou sem carro, buzinam o silêncio comodista, dão carona para os alunos que moram mais longe do conhecimento, saem cantando o pneu da alegria. Se estão apaixonados, e estão, fazem da sala de aula um espaço de cânticos, de ênfases, de sínteses que demonstram, pela via do contraste, o absurdo que é viver sem paixão, ensinar sem paixão.

     Dá pena, dá compaixão ver o professor desapaixonado, sonhando acordado com a aposentadoria, contando nos dedos os dias que faltam para as suas férias, catando no calendário os próximos feriados.

     Os professores apaixonados muito bem sabem das dificuldades, dos desrespeitos, das injustiças, até mesmo dos horrores que há na profissão. Mas o professor apaixonado não deixa de professar, e seu protesto é continuar amando apaixonadamente.

     Continuar amando é não perder a fé, palavra pequena que não se dilui no café ralo, não foge pelo ralo, não se apaga como um traço de giz no quadro. Ter fé impede que o medo esmague o amor, que as alienações antigas e novas substituam a lúcida esperança.

     Dar aula não é contar piada, mas quem dá aula sem humor não está com nada, ensinar é uma forma de oração. Não essa oração chacoalhar de palavras sem sentido, com voz melosa ou ríspida. Mera oração subordinada, e nada mais.

     Os professores apaixonados querem tudo. Querem multiplicar o tempo, somar os esforços, dividir os problemas para solucioná-los. Querem analisar a química da realidade. Querem traçar o mapa de inusitados tesouros.

     Os olhos dos professores apaixonados brilham quando, no meio de uma explicação, percebem o sorriso do aluno que entendeu algo que ele mesmo, professor, não esperava explicar. A paixão é inexplicável, bem sei. Mas é também indisfarçável.
          A história do país eterniza tragédias que marcaram a vida de alguns e tiraram a vida de muitos. Estas calamidades são provocadas por pura negligência, pois como se sabe, no Brasil infelizmente, muitas vezes não há uma preocupação em salvar vidas e de precaver minuciosamente de situações de desespero. Esta falta de responsabilidade resulta na quantidade de pessoas mortas e feridas e nas famílias enlutadas que perderam seus entes queridos.
Como se sabe, é alarmante o número de mortes no país por falta de fiscalização em alguns ambientes. Como exemplo temos algumas boates e casas noturnas que estão muitas vezes como o alvará vencido, não possuem saídas de emergência e nem extintores suficientes. Além disso, em alguns casos, os seguranças são treinados para intimidar e agredir, e não para salvar vidas. Como foi o caso do incêndio na boate Kiss, que causou a morte de 242 pessoas.
            Indubitavelmente, as leis existem, mas por ganancia, descaso e principalmente por falta fiscalização, boates são incendiadas, moradores de prédios são soterrados, bujões de gás e fogos de artifícios explodem, grupos afundam em barcos superlotados e pessoas morrem em parque de diversões por causa de brinquedos defeituosos. Enquanto isto acontece, em alguns casos ninguém vai preso e estas tragédias caem esquecimento da população, até que uma nova negligência faça com que estas histórias se repitam e façam novas vítimas.
Infelizmente, esse é o retrato do nosso país. A preocupação com o dinheiro está sendo colocado na frente da preocupação com a vida. Diferentemente do que acontece aqui, na Inglaterra, as pessoas têm na memória os incêndios que ocorreram no século XVII e já pensam na precaução. Lamentavelmente, aqui acontece o oposto. Quanto mais tragédias acontecem, mais as pessoas  insistem no erro. Deixando mais evidente o descaso que existe na nossa sociedade.
            Dessa forma, fica claro que precisamos de pessoas mais preocupadas com  a segurança da população. Precisa-se também de fiscalizações e punições mais severas, para que diminua o número de pessoas mortas por falta de responsabilidade. Como disse Einstein: “Só duas coisas são infinitas, o universo e a estupidez humana, mas não estou seguro sobre o primeiro”. Portanto, para que essa frase deixe de ser uma verdade evidente, é preciso que a população se mobilize em prol da vida e exija mais fiscalização para que as tragédias sejam evitadas.
 
Aluna: Juliana Do Nascimento Ferreira
 
Professor: Diogo Didier
Dois homens desconfiados na cama
Ilustração: Lumi Mae

Sharon Stone estava numa festa em Hollywood quando desapareceu acompanhada de uma atraente mulher. As duas só voltaram muito depois… a sobremesa já estava sendo servida. Mas ela também adora fazer sexo com homens. Sua secretária se encarregava de marcar os encontros amorosos. Essas indiscrições foram divulgadas pelo jornal Sunday Mirror e fazem parte da biografia não autorizada da atriz.
 
Outra estrela americana, Jodie Foster, teve seu desejo sexual por mulheres revelado num livro escrito por seu próprio irmão. Entrevistada pelos jornais declarou: “Tive uma ótima educação, que nunca me fez diferenciar homens e mulheres.” Esses são apenas alguns exemplos dos incontáveis casos de bissexualidade famosos.
 
Apesar de haver estudos mostrando que muitas pessoas já sentiram, de alguma forma, desejo por ambos os sexos, o resultado da pesquisa me surpreendeu. Das quase 18 mil que responderam à enquete da semana, a maioria transaria com alguém do mesmo sexo. É inegável a mudança das mentalidades.
 
Na Idade Média a atividade homossexual era considerada crime e nunca pôde ser exercida sem punição. Nos séculos 12 e 13, desenvolveu-se uma política rigorosa para lidar com a homossexualidade. O Concílio de Nablus em 1120 estabeleceu que o adulto sodomita do sexo masculino seria queimado pelas autoridades civis.
 
O rei Eduardo I da Inglaterra e o rei Luís IX da França também decretaram a morte pelo fogo para os homossexuais e Afonso X de Castela determinou que os homossexuais fossem castrados e pendurados pelas pernas até a morte. Assim, os homossexuais foram colocados no mesmo nível dos assassinos, hereges e traidores.
 
Antes da Revolução Francesa, a homossexualidade era vista como pecado, mas não havia clareza no conceito desse termo. No começo do século 19, o discurso sobre a homossexualidade oscila entre duas hipóteses: para os conservadores é preciso condenar; para os liberais é uma doença que se deve compreender e tratar.
 
No final do século, surgem novas concepções sobre a homossexualidade, que passa a caracterizar uma espécie em particular. O médico húngaro Benkert cria, em 1869, o termo “homossexualidade”. A palavra homossexual vem do grego homo e significa “o mesmo”, designando aqueles que sentem atração pelo mesmo sexo. A invenção de novas palavras como “homossexual” e “invertido”, altera a ideia que se tinha dessas pessoas, que passam a ser vistas como doentes.
 
O Relatório Kinsey publicado em 1948 contribuiu para a tese da bissexualidade humana. Nele é apresentado o continuum hetero-homossexual e a fluidez dos desejos sexuais. Numa escala de zero a seis, a tendência heterossexual e homossexual existiria na maioria das pessoas. A inclinação heterossexual exclusiva teria o grau zero, variando até a inclinação homossexual exclusiva no grau seis da escala.
 
Cada grau intermediário corresponde a uma proporção mais ou menos forte de inclinação homossexual ou heterossexual. Foram pesquisados por Kinsey e seus colaboradores 16 mil americanos e os resultados mostraram que, embora apenas 4% da população masculina fosse exclusivamente homossexual desde a puberdade, 37% dos homens e 19% das mulheres tiveram, entre a puberdade e a idade adulta, pelo menos uma experiência homossexual culminando em orgasmo. Pouco tempo depois, Masters e Johnson confirmaram em suas pesquisas as teses de Kinsey.
 
Embora a homossexualidade seja, até hoje, considerada por muitos heterossexuais como uma perversão, um comportamento antinatural e passível de condenação moral, a aversão que provoca não recebe mais apoio substancial dos médicos. Em 1973, a Associação Médica Americana retirou-o da categoria de doença e atualmente o próprio termo perversão desapareceu quase completamente da psiquiatria.
 
Nas últimas décadas, enquanto o movimento feminista reconsiderava as identidades e papéis sexuais, a homossexualidade era afetada por mudanças tão profundas quanto aquelas que influenciaram a conduta heterossexual. Mas apesar de toda a liberação dos costumes, os gays ainda são hostilizados pela maior parte da sociedade.
 
Nada melhor para ilustrar a homofobia e a hipocrisia da sociedade em que vivemos — na qual a maioria das pessoas defende os direitos humanos — do que a frase de Leonardo Matlovich, soldado da Força Aérea Americana condecorado por sua atuação na Guerra do Vietnã e expulso da corporação em 1975 por homossexualidade: “A Força Aérea me condecorou por matar dois homens no Vietnã e me expulsou por amar um.”
 
Marjorie Garber, professora da Universidade de Harvard, que elaborou um profundo estudo sobre a bissexualidade, compara a afirmação de que os seres humanos são heterossexuais ou homossexuais às crenças de antigamente, como: o mundo é plano, o sol gira ao redor da terra. Acreditando que a bissexualidade tem algo fundamental a nos ensinar sobre a natureza do erotismo humano, ela sugere que em vez de hétero, homo, auto, pan e bissexualidade, digamos simplesmente “sexualidade”.
 
Regina Navarro Lins é psicanalista e escritora, autora de 11 livros sobre relacionamento amoroso e sexual, entre eles o best seller “A Cama na Varanda” e “O Livro do Amor”. Atende em consultório particular há 39 anos, realiza palestras por todo o Brasil e é consultora e participante do programa “Amor & Sexo”, da TV Globo. Nasceu e vive no Rio de Janeiro.
 
Visto no: UOL