A capacidade de sentir
emoções é algo inerentemente humano. Nossa espécie carrega essa dádiva
sensorial, a qual se configura nas múltiplas representações dos nossos
sentimentos, sejam eles bons ou ruins. De fato, esse diferencial fez com que a
humanidade evoluísse e conseguisse se distinguir dos outros animais, já que
possuímos o dom da racionalidade, do pensar, e com este mecanismo foi possível
transformamos o mundo num local habitável. No entanto, parece que o homem esqueceu
sua essência e não consegue mais olhar para sua própria espécie com igualdade. Atos
de caridade, compaixão, fraternidade, hombridade, são escassos das nossas
práticas sociais, uma vez que estamos muito ocupados pensando nos bens que
queremos armazenar, ou nos sonhos, geralmente matérias, que desejamos
concretizar.
Esse comportamento animalesco é notável em várias ocasiões, principalmente quando a realidade salta aos nossos olhos, cobrando uma posição, exigindo que algo seja feito com rapidez. Quando ouvimos os alertas dos cientistas dizendo que o planeta está morrendo, devido ao aquecimento global, logo ficamos apreensivos e muitas vezes até duvidamos se isso é realmente verdade. Entretanto, continuamos com a cultura do consumismo, a qual vem paulatinamente destruindo o ecossistema e talvez afetando o habitat das próximas gerações. Também manifestamos sentimentos repulsivos contra a fome, à miséria, causadas pelo leviatã da desigualdade social. No entanto, quanto mais ricos ficamos, mais ampla fica a distância entre nós desses problemas, já que é mais fácil culpar os políticos por isso também.
Enquanto a nação se prepara para receber a copa do mundo e depois as olimpíadas, com grandes investimentos na construção de estádios, estradas, reestruturação dos meios de transporte, hotéis, ampliação e reforma de aeroportos, e tantas outras mudanças – todas inegavelmente positivas para o país. Nossas crianças, por outro lado, ainda passam fome, moram em habitações subumanas e não tem acesso a uma educação que prime pela qualidade do ensino. Além disso, muitas famílias não tem acesso à saúde de qualidade, nem tão pouco a saneamento básico, garantindo a higiene necessária a cada indivíduo. Ao invés disso, muitos possuem apenas as migalhas oferecidas pelo governo através de projetos sociais que não resolvem o problema da desigualdade, mas apenas servem de paliativos, que não conseguem cicatrizar as profundas feridas desses e de outros problemas.
Dignidade, franqueza, generosidade, honradez, humildade, simplicidade, respeito, estes, e muitos outros sentimentos, parecem ser raros, tão como algumas espécies de animais que fatalmente sucumbiram ao tempo ou foram aniquiladas pela cobiça, crueldade, egoísmo, ganância, irresponsabilidade, maledicência, prepotência, entre tantos outros predicados negativos que possam caber ao homem moderno. Ele que, lamentavelmente vive num intenso paradoxo: viver na modernidade, vislumbrando um futuro promissor, mas destruindo o presente com ações desumanas, que inevitavelmente afetarão o seu próprio futuro. Essa dualidade é fruto do modelo de vida que foi impelido pelo capitalismo, uma vida de aquisições matérias despreocupada com a formação interior, a qual é responsável por humanizar as nossas ações.
Em contrapartida, parece que mesmo no obscurantismo do nosso comportamento atual, ainda há pessoas que emanam uma luz de salvação e conseguem sobressair-se das trevas das quais nós mesmos criamos. Exemplos não faltam, pois ao longo da história, muitos foram os que se renderam a benevolência, no intuito de mudar a vida do próximo, muitas vezes sem querer nada em troca; Jesus Cristo é o principal deles. Entre Seus ensinamentos estão amar o próximo como a ti mesmo, coisas que muitos, como Ele, fizeram até o fim da vida com total esmero. Dedicação exercida, por exemplo, por figuras como Zilda Arns, que entregou a sua vida a ajudar pessoas desconhecidas, dando-as uma chance de terem uma existência mais digna e humana.
Também quem não se lembra do nosso saudoso médium Chico Xavier. Ele que causou polêmica no país com suas cartas psicografadas, das quais serviam de elo entre os mortos e os vivos e que ajudavam a confortar a dor de muitas pessoas que perderam seus entes queridos. O que poucos sabem é que, mais do que fazer contato com o além, Chico, junto com a filosofia Espírita, praticava a caridade, ajudando as pessoas não só espiritualmente, mas emocional e também materialmente. Doações eram feitas para os mais necessitados que, como ele mesmo dizia, eram pessoas que estavam em transição e precisavam de um apoio nessa vida. Outra figura religiosa que dedicou sua vida a ajudar o próximo foi Madre Tereza de Calcutá. Sua generosidade ajudou muitos necessitados e serviu de expoente para muitos outros religiosos se questionarem sobre seu real papel na terra, como difusores do amor divino; e não apenas meros reprodutores.
Essas e muitas outras personalidades, anônimas ou notáveis, religiosas ou não, fizeram algo em prol do próximo, deixando de lado um pouco da sua vida para enxergar a do outro. Tarefa essa que não é fácil de ser exercida, visto que vivemos sobre a pressão do consumo e muitas vezes esquecemos que a vida não é apenas angariar fortunas, mas também conquistar amigos, fazer bem ao próximo e ajudar os que realmente precisam, sem distinção e, principalmente preconceitos. Não precisamos de religião para ser solidários. Basta apenas ter determinação e boa vontade para mudar as coisas. Sair da nossa zona de defesa e partir para o ataque, não só contra os governantes, os que já possuem a sua parcela de culta, mas, sobretudo contra nós mesmo. Contra o nosso egoísmo cego e a nossa individualidade desumana. Só assim poderemos lentamente consertar as falhas criadas por nós mesmos.