20 fevereiro 2018

PRECISAMOS FALAR SOBRE BOLSONARO: O MESSIAS QUE EU NÃO ESPERAVA


O nome Messias tem origem Hebraica e significa ungido. Parece ser uma informação aparentemente irrelevante, mas que soergue sua importância quando pronuncio o nome completo de Jair Messias Bolsonaro, político e militar brasileiro, conhecido por esbravejar sandices para um povo ainda mais ensandecido. Talvez por possuir um sobrenome carregado de tamanha significância, ele se sinta especial a ponto de ferir ideologias e conceitos, elencados a duras penas por diversas militâncias sociais, para que as minorias obtivessem breves chances de serem reconhecidas em meio a um Estado que simplesmente negligencia o “diferente”. Esbravejante, ele não poupa adjetivos ao disferir seus ataques aos grupos considerados por ele escórias da sociedade. Me valendo dessa máxima, também não economizarei os adjetivos para descrevê-lo. Infame, vil, pernicioso, ordinário, pífio, salafrário, desprezível, belicoso, oportunista, hipócrita, são insuficientes para retratar aquele ser. Mas haverá mais. Antes, entretanto, é preciso entender o porquê de suas atrozes opiniões serem conclamadas por grande número de seguidores, em meio a uma progressão perene do conservadorismo político no Brasil.

Talvez a história da humanidade nos dê vários indícios para entendermos hoje o fenômeno Bolsonaro. Ao longo dela, vários nomes foram, e são, venerados como verdadeiros salvadores, seres que conseguiram se sobressair no tempo e espaço, seja através de convicções religiosas, seja por motivações bélicas, ideológicas, ou ainda por intermédio de discursos violentos dissimulados por ideais pacificadores. De Jesus Cristo ao mito do Sebastianismo, passando por Antônio Conselheiro em Canudos à Hitler no holocausto nazista, muitos foram os homens seguidos por multidões ávidas por absorver as ideias dos seus ídolos, alguns deles grandes manipuladores controversos, preocupados apenas em disseminar suas ideologias, nem sempre humanísticas, mas sempre prontas a responder aos anseios sociais de suas épocas. Bolsonaro garante o seu lugar nessa seleta lista, não apenas por possuir Messias como um dos seus nomes, mas sim por impor um messianismo político através de uma linguagem incendiária no tocante às lacunas sociais existentes no país.

Ele se vale desta premissa, bem como os seus bajuladores, cujas bases remontam à Ditadura Militar, período usado como justificativa pelos Bolsonarianos como modelo ideal para que a ordem social seja, de fato, estabelecida no país. Para tanto, evidentemente que a militarização é a mola propulsora dessa solução, o mote que falta, na visão desses bárbaros, para que questões como segurança pública sejam qualitativas. É a paz armada numa sociedade que não tem esse direito assegurado pelo Estado há anos e agarra-se a práticas reacionárias para, quiçá, resolver as falhas na criminalidade. Mas, Bolsonaro vai além. Ele é adepto do chavão “bandido bom é bandido morto”, de queimar criminosos, a favor do porte legal de armas para toda a população como medida preventiva à vida, dentre outros subterfúgios que seduzem as massas carentes e esquecidas a acatar as ideais insanas daquele político. São pessoas como ele e seus seguidores irrefletidos os reais responsáveis pela banalização da criminalidade, através de discursos que inflamam um revanchismo social através de incitação da barbárie, numa nação onde Maria Eduarda, de 13 anos, é morta a tiros de fuzil e Amarildo nunca fora foi encontrado.

Sobre o messianismo político, a expressão foi cunhada pelo Filósofo, historiador e linguista, o búlgaro nacionalizado francês Tzvetan Todorov. Nas palavras dele, “o messianismo político, que é um messianismo sem messias, utiliza-se de basicamente dois meios para atingir seus objetivos: a revolução e o terror – crava Todorov”. Ora, é justamente o que tem feito Bolsonaro nas suas idas e vindas Brasil à fora: propagar motins, insurgir negativamente contra os ideais de liberdade, rebelar-se contra os direitos humanitários conquistados pelas minorias, suplantar valores igualitários como respeito às diferenças e, de quebra, impor um recorte social já hegemônico: hétero, branco, militar, classe média, sulista e, claro, religioso Cristão, em detrimento de outras ramificações sociais nesse sentido. Logo, quem não se enquadra nesses moldes deve ser ignorado, ou, eliminados da sociedade. É a mesma filosofia usada pelos Alemães com a ideologia controversa do arianismo. Da mesma forma que, na formação do Brasil, a oligarquia branca e católica atribuiu aos negros a ausência de suas almas. É o que hoje Bolsonaros fazem ao subjugar as mulheres das relações políticas e sociais, mesmo com as exaustivas e necessárias lutas feministas.

Soma-se a isso as declarações de cunho homofóbico, machista, misógino, racista, antissemitistas, belicosas, criminosas, antiéticas, incongruentes e inconsequentes do falso Messias chamado Bolsonaro, que fazem dele um espetáculo à parte na sociedade. Hediondo com as palavras, apropria-se delas como um soldado de posse de uma metralhadora na mão prestes a ceifar a vida de malfeitores. Então, numa rajada de balas, solta violentos ataques, que se fossem alvejados por qualquer outro como eu ou você que está lendo este texto, resultaria em prisão inafiançável. Por isso que no Clube Hebraica ele não restringiu sua linguagem ao lançar suas bases políticas, caso venha se tornar eleitorável à presidência da república na próxima eleição. Entre as inacreditáveis, inaceitáveis e impronunciáveis reverberações ditas estavam o desrespeito ao povo Quilombola, a retirada das poucas terras existentes aos povos indígenas, a supressão das verbas destinadas a ongs, a permissão para a população utilizar armas de fogo, dentre outras menções incompreensíveis de serem proferidas por alguém representante legal de um povo e aparentemente esclarecido. Na verdade, na política BBB (da Bala, do Boi e da Bíblia), falta apenas um beligerante como cereja do bolo.

Em contrapartida, engana-se que tamanhas atitudes desumanas diminuem a popularidade deste político entre as massas. Nitidamente midiático, em qualquer vereda onde percorra seu rastro é seguido por fãs alucinados pelas ideias bárbaras defendidas pelo Messias Moderno. São os “Bolsomitos”, “Bolsominios”, “Bolsonarianos”, neologismos criados para designar os fiéis adoradores desse político marqueteiro. Como devotados à causa Bolsonariana, esses indivíduos propagam abertamente sua paixão pelo seu ídolo: são camisetas com diversos dizeres; discussões acirradas nas redes sociais, apologias a práticas animalescas como a castração química em caso de estupro e campanha antecipada para que ícone deles venha a se tornar o soberano do país, o Messias sebastianista dito há pouco que livrará a sociedade de todos os males atuais. Mais lamentável ainda é saber que o perfil dos adeptos às pautas políticas daquele cidadão nem sempre são pessoas que estão no topo da pirâmide social. É o caso do Fernando Holiday, Vereador do DEM, homossexual e negro e amante das ideologias de Bolsonaro, nas quais muitas delas atacam inclusive o que esse rapaz carrega na pele e na essência.

Tamanha inadequação soa irracional, a priori, mas, se analisada cautelosamente, encontra alicerces que possam justificar tais desarmonias entre os públicos que defendem a linha de raciocínio tortuosa de Bolsonaro. Como um bom populista que se tornou, semelhante a Vargas e Lula, este seu ferrenho opositor, ele mexe nas feridas sociais mais complexas e de aparente difícil resolução. É a segurança que não protege; a saúde que não melhora; a educação que não conscientiza. São as lutas feministas, sexuais e de etnia que se rebelam contra o Estado. São as redes sociais difundindo mais violência que conhecimento. Tudo isso é pano de fundo para o perfil político conservador deste cidadão. Em Como Conversar Com um Fascista, a Filósofa e Escritora Márcia Tiburi se derrama em páginas para tentar decifrar a complexa barreira que há entre esses neo-fascistas, que se utilizam do não diálogo para impor suas ideias. Além disso, por se saber do caos corruptível que assola a sociedade brasileira, eis que surge o perfil messiânico perfeito para pôr ordem na casa: homem, hétero, casado, na família comercial de margarina, claro, e carregado de “inovações” terroristas travestidas de revolucionárias, para trazer uma ordem que pode afundar ainda mais o país.

No entanto, o que se vê é o silenciamento da mídia, da sociedade e de vários setores civis às calamitosas manifestações desse indivíduo em rede nacional. Há um temor em se declarar contrário aos pensamentos dele ou há muitos indivíduos, sobretudo famosos que coadunam com ele, mas preferem não se manifestar para não ter suas imagens maculadas. Facínora, Bolsonaro já deferiu agressões contra os Deputados Federais Jean Wyllys e Maria do Rosário. Com ela, foi machista e misógino. Com Jean, fez questão de não esconder sua homofobia. Em ambos os casos não houve maiores sanções contra o Deputado. Da mesma forma que quando ele ataca negros, quilombolas, índios, ongs, mulheres, entre outros, ninguém se mobiliza para pedir uma retratação social, como ocorreu há poucos dias com o ator global José Mayer. Esperei ver hastags furiosas, difundindo protestos contra tantas manifestações de ódio disfarçadas de opinião. Torci para que a mídia fizesse uma cobertura digna das atrocidades, para criar um levante de discussões na sociedade. Queria que o STF, a Câmara dos Deputados, o Presidente da República, os artistas, os anônimos, alguém tão inconformado quanto eu, expusesse seu repúdio contra aquele senhor. Nada. Nem uma palavra. Apenas o emudecimento resignado do conformismo, que insiste em manter as coisas como estão.

Precisamos falar sobre Bolsonaro, suas intenções e o contexto em que ele protagoniza. Nenhum desses elementos estão aí por acaso. A ascensão de Donald Trump, nos EUA, bem como o da extrema Direita em várias partes da Europa, são cenários análogos à realidade brasileira. Também precisamos analisar os discursos imbrincados nas falas daquele cidadão. Silvana Duboc vai dizer que as palavras sempre ficam. Disso, infere-se o quanto pronunciamentos discriminatórios podem ser nefastos para uma sociedade que convive com isso em suas bases culturais e, sobretudo, histórica há séculos. Mais lamentável ainda é quando reverberações preconceituosas são ditas por pessoas de grande influência social, como é o caso de Bolsonaro. Os reflexos de tais declarações, sustentadas por um povo sofrido e fragilizado pelo esquecimento social, fortalecem as violências simbólicas e explícitas que diversas pessoas como eu tentam combater paulatinamente. Além disso, não podemos nos emudecer diante de tanta tagarelice perversa, nem nos intimidar com posturas autoritárias, ditatoriais que preferem os extremos ao diálogo, à transformação social pacífica e abalizada pelos preceitos da Constituição Federal. Precisamos olhar para Bolsonaro como uma tentativa abrupta de um povo, que negligenciado por todos os lados, fincou-se na imagem de um anti-heroi, tipo Macunaíma, para que num passe de mágica solucione nossos problemas na base da selvageria. Nenhum imediatismo pode sustentar a esperança de um país melhor, quando o escolhido para nos representar, não reproduz o desejo de todos. Então, precisamos de um novo Messias, porque Bolsonaro não é o que eu esperava para o Brasil. Não é o que nós merecemos para o país.

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