Em vários momentos da
história da humanidade é fácil encontrar lendas e mitos em torno da fonte da
juventude. Caracterizada ora como um lago, ora como um poço, a verdade é que se
acreditava na possibilidade de retardar os efeitos do tempo a partir do momento
que alguém bebesse a água desses locais ou mergulhasse nos seus límpidos
aquíferos, quase celestiais. Essas nascentes milagrosas já não povoam o nosso
imaginário como antes. Agora, ao invés de fontes, temos uma infinidade de
recursos, dos mais empíricos aos mais tecnológicos, os quais prometem “corrigir”
as marcas gravadas pelo tempo. Assim, comercializados e, posteriormente
vendidos como verdadeiras fórmulas mágicas, muitos produtos passam a ideia
ilusória da juventude eterna, oferecendo em academias, cirurgias, frascos e
maquiagens o elixir da felicidade imposto pela cultura “Peter Pan”. Aprisionados nessa terra do nunca, homens e mulheres se
submetem aos mais controversos tratamentos para parecerem dez ou vinte anos
mais jovens, alimentando a ideia errônea de que ser feliz está restrito a
rostos congelados cirurgicamente.
Parecer, e não ser, este
é o lema que tem levado muitos indivíduos a serem escravos das artimanhas
culturais da sociedade atual, a qual vende, a todo instante, bálsamos
miraculosos capazes de retroceder a idade como num passe de mágica. Nesse conto
de fadas, as maiores vítimas são as mulheres. Elas que no passado eram
cultuadas por suas curvas sinuosas e, por vezes, rechonchudas. Hoje, porém,
sofrem com a plastificação da beleza, numa sociedade cada vez mais magra e
fotoshopada. Sobre elas ainda, no Brasil, recai o peso da mulher tipo
exportação, já que o nosso país é conhecido mundialmente pela exuberância
feminina, sobretudo daquelas que encartam o carnaval. Acontece que nem todas são
altas, lindas e magras. Nem tão pouco possui corpos malhados e com curvas
simetricamente sinuosas. A maioria delas está fora desses padrões e, por essa
razão, se tornam as principais vítimas da indústria da beleza. E é na mais
tenra idade onde a escravidão começa. Sutilmente, as meninas se encantam ainda
na infância, por maquiagens, joias, sapatos e uma infinidade de outros apetrechos
do gênero. Educadas a estarem sempre maquiadas e com as roupas da moda, a família
impõe, às vezes inconscientemente a essas futuras mulheres, uma vida
plastificada.
Por essa razão, muitas
delas perpetuam estes estamentos sociais ao extremo. Sabendo disso, a
industrialização de cosméticos cada vez mais inovadores e milagrosos cresce a
cada dia. É o batom que aumenta os lábios, deixando-os mais viçosos e juvenis;
antirrugas poderosíssimos capazes de encobrir as cicatrizes deixadas pelos
anos; e em meio a tudo isso, truques de beleza para combinar cores e texturas,
não apenas para estar bonita, mas para esconder a idade real. Isso, no entanto,
não quer dizer que não podemos cuidar do nosso corpo e, principalmente do
rosto. De fato, manter uma boa aparência é, além de um hábito saudável, uma
forma de estar bem consigo mesmo. Entretanto, o que vem acontecendo com muitas
mulheres é a o inverso disso. Elas não querem ser ou estar bonitas. Mas, além
disso, aparentar menos idade, numa luta constante e frustrada contra o tempo. Nesse
sentido, Caetano Veloso estava certo quando musicalmente disse: “é que narciso acha feio o que não é espelho”.
Ou seja, o que muitas dessas mulheres temem é encontrar o próprio reflexo no
espelho e a partir dele compreender que não há nada que possa atenuar
drasticamente as feições cravadas pelos anos passados.
Mesmo assim, elas não
desistem fácil de encontrar a receita do rejuvenescimento. Quando a maquiagem
já não dá conta de esconder o que o tempo insiste em mostrar, entram em campo
as cirurgias plásticas. Nesse sentido, nosso país é um dos que mais realizam
procedimentos cirúrgicos estéticos no mundo. São Botox cada vez mais bizarros,
peitos siliconados que mais parecem bombas nucleares prestes a explodir, lipoaspirações,
peles esticadas ao máximo que deixariam com inveja o “Senhor Fantástico” do famoso quarteto em quadrinhos. Tudo para
estar mais “lindas” e atraentes às
exigências dessa sociedade escrava da beleza neoparnasiana. Em contrapartida,
tais modificações exigem além de coragem uma boa quantia em dinheiro. Aquelas que
podem pagar se submetem a estas transformações e procuram clínicas
especializadas, com todo o respaldo que o dinheiro pode comprar. Já muitas
outras se arriscam em ambientes clandestinos, com médicos e materiais de quinta
categoria, saindo das salas de cirurgias piores do que quando entraram. Nos dois
casos, contudo, o risco de morte povoa os corpos dessas mulheres que sonham em
ter o corpo perfeito.
Entretanto, o perigo da
incessante busca pela juventude eterna não se encerra nesses pontos. Com a
imposição midiática, famosos de áreas diversas exercem um fascínio enorme nos
costumes e na vida de uma sociedade superapegada ao rótulo. Nas telas das
emissoras, mulheres e homens “perfeitos” propagam um ideal de beleza doentio e,
muitas vezes, inalcançável. São corpos aerodinâmicos, malhados, marombados e
sarados. Modelos estéticos convidativos, os quais induzem quem estar do outro
lado a aderir a tais formas. Na mídia também há outra postura periculosa a qual
diz que quem é belo, consequentemente é mais feliz no amor, no trabalho e na
vida. Então, logo surgem as indagações e as frustrações sobre a própria aparência.
Por que eu não tenho o lábio da Angelina Jolie? Por que eu não sou alta, bela e
magra como a Top Model internacional Gisele Bündchen? E, por que eu não nasci com
o charme e a beleza do ator Reynaldo Gianecchini? Quando esses questionamentos
não são saudavelmente respondidos acabam resvalando em práticas doentias como
anorexia, bulimia e tantas outras psicoses, as quais levam centenas de
indivíduos a óbito ano a ano.
Nessa odisseia pela
forma perfeita, não é só as mulheres que estão no epicentro narcisista da
sociedade. Os homens também começaram a dividir espaço com elas e há muito
tempo transitam nesse terreno. Hoje, mais livres dos preconceitos sociais que
impuseram neles o perfil de macho alfa, eles fazem quase tudo e mais um pouco
que as mulheres fazem. Cada vez mais a ala masculina ocupa as academias,
musculando braços, bíceps, peitos e pernas, cobiçando cada vez mais os
atributos desejados tanto pelas mulheres quanto por muitos homens. No entanto,
quando a silhueta desejada não é adquirida através dos exercícios físicos, eles
também se aventuram em tratamentos estéticos mais sofisticados. É por isso que
vemos tantos deles colocando implantes de silicone em diversas partes do corpo,
fazendo às sobrancelhas, depilando as pernas, e tantos outros recursos antes
limitados a atmosfera feminina. Toda essa mudança de conduta fez com que os
homens extrapolassem seus limites, como fez o americano Justin Jedlica, de 32
anos. Na sua obsessão pela beleza, ele fez 90 modificações cirúrgicas para
ficar “idêntico” ao Ken, famoso namorado da boneca Barbie.
E quem não tem posses
para isso? Para estes restam os riscos dos emagrecimentos rápidos e infalíveis
que prometem perda de dezenas de quilos num piscar de olhos. Sobram também
frustrações e uma vida fadada a infelicidade, já que não há sentido condicionar
a existência a um protótipo corpóreo, do qual a forma física se sobreponha aos
valores humanos. A relatividade da beleza é inquestionável, mas estamos presos
ao “Retrato de Dorian Gray”, tal qual
aquele que foi escrito sabiamente em outrora por Oscar Wilde. Tanto nesta obra
quanto na vida real, não queremos largar o nosso passado jovem e viril, pois
aprendemos que a felicidade está restrita a juventude e o fato de perdê-la
significa deixar de ser feliz, ou simplesmente deixar de existir. É por isso
que, em silêncio, em casa, nas academias e tantos outros lugares onde possam
ver seus reflexos, homens e mulheres se perguntam: “Espelho, espelho meu, existe alguém mais bela (o) do que eu?”. E se
veem monstruosamente artificiais, opacos pela maquiagem excessiva, ou
estranhamente cirurgiados para agradar aos padrões sociais. Infelizes, essas
pessoas esquecem que “o tempo
voa...escorre pelas mãos. Mesmo sem se sentir. E não há tempo que volte...”.
Por isso que é importante se permitir e se gostar do jeito que se é, mesmo que
os seus atributos estejam fora dos requisitos preestabelecidos pela sociedade. Ser
feliz ainda é um estado de espírito e não há nada pior do que viver uma vida de
engano, fingida e superficial.
Isso é fato, Diogo. Muito bem colocado. Vaidade em demasia se torna uma doença.
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