01 julho 2013

Forever Young


Em vários momentos da história da humanidade é fácil encontrar lendas e mitos em torno da fonte da juventude. Caracterizada ora como um lago, ora como um poço, a verdade é que se acreditava na possibilidade de retardar os efeitos do tempo a partir do momento que alguém bebesse a água desses locais ou mergulhasse nos seus límpidos aquíferos, quase celestiais. Essas nascentes milagrosas já não povoam o nosso imaginário como antes. Agora, ao invés de fontes, temos uma infinidade de recursos, dos mais empíricos aos mais tecnológicos, os quais prometem “corrigir” as marcas gravadas pelo tempo. Assim, comercializados e, posteriormente vendidos como verdadeiras fórmulas mágicas, muitos produtos passam a ideia ilusória da juventude eterna, oferecendo em academias, cirurgias, frascos e maquiagens o elixir da felicidade imposto pela cultura “Peter Pan”. Aprisionados nessa terra do nunca, homens e mulheres se submetem aos mais controversos tratamentos para parecerem dez ou vinte anos mais jovens, alimentando a ideia errônea de que ser feliz está restrito a rostos congelados cirurgicamente.

Parecer, e não ser, este é o lema que tem levado muitos indivíduos a serem escravos das artimanhas culturais da sociedade atual, a qual vende, a todo instante, bálsamos miraculosos capazes de retroceder a idade como num passe de mágica. Nesse conto de fadas, as maiores vítimas são as mulheres. Elas que no passado eram cultuadas por suas curvas sinuosas e, por vezes, rechonchudas. Hoje, porém, sofrem com a plastificação da beleza, numa sociedade cada vez mais magra e fotoshopada. Sobre elas ainda, no Brasil, recai o peso da mulher tipo exportação, já que o nosso país é conhecido mundialmente pela exuberância feminina, sobretudo daquelas que encartam o carnaval. Acontece que nem todas são altas, lindas e magras. Nem tão pouco possui corpos malhados e com curvas simetricamente sinuosas. A maioria delas está fora desses padrões e, por essa razão, se tornam as principais vítimas da indústria da beleza. E é na mais tenra idade onde a escravidão começa. Sutilmente, as meninas se encantam ainda na infância, por maquiagens, joias, sapatos e uma infinidade de outros apetrechos do gênero. Educadas a estarem sempre maquiadas e com as roupas da moda, a família impõe, às vezes inconscientemente a essas futuras mulheres, uma vida plastificada.

Por essa razão, muitas delas perpetuam estes estamentos sociais ao extremo. Sabendo disso, a industrialização de cosméticos cada vez mais inovadores e milagrosos cresce a cada dia. É o batom que aumenta os lábios, deixando-os mais viçosos e juvenis; antirrugas poderosíssimos capazes de encobrir as cicatrizes deixadas pelos anos; e em meio a tudo isso, truques de beleza para combinar cores e texturas, não apenas para estar bonita, mas para esconder a idade real. Isso, no entanto, não quer dizer que não podemos cuidar do nosso corpo e, principalmente do rosto. De fato, manter uma boa aparência é, além de um hábito saudável, uma forma de estar bem consigo mesmo. Entretanto, o que vem acontecendo com muitas mulheres é a o inverso disso. Elas não querem ser ou estar bonitas. Mas, além disso, aparentar menos idade, numa luta constante e frustrada contra o tempo. Nesse sentido, Caetano Veloso estava certo quando musicalmente disse: “é que narciso acha feio o que não é espelho”. Ou seja, o que muitas dessas mulheres temem é encontrar o próprio reflexo no espelho e a partir dele compreender que não há nada que possa atenuar drasticamente as feições cravadas pelos anos passados.

Mesmo assim, elas não desistem fácil de encontrar a receita do rejuvenescimento. Quando a maquiagem já não dá conta de esconder o que o tempo insiste em mostrar, entram em campo as cirurgias plásticas. Nesse sentido, nosso país é um dos que mais realizam procedimentos cirúrgicos estéticos no mundo. São Botox cada vez mais bizarros, peitos siliconados que mais parecem bombas nucleares prestes a explodir, lipoaspirações, peles esticadas ao máximo que deixariam com inveja o “Senhor Fantástico” do famoso quarteto em quadrinhos. Tudo para estar mais “lindas” e atraentes às exigências dessa sociedade escrava da beleza neoparnasiana. Em contrapartida, tais modificações exigem além de coragem uma boa quantia em dinheiro. Aquelas que podem pagar se submetem a estas transformações e procuram clínicas especializadas, com todo o respaldo que o dinheiro pode comprar. Já muitas outras se arriscam em ambientes clandestinos, com médicos e materiais de quinta categoria, saindo das salas de cirurgias piores do que quando entraram. Nos dois casos, contudo, o risco de morte povoa os corpos dessas mulheres que sonham em ter o corpo perfeito.

Entretanto, o perigo da incessante busca pela juventude eterna não se encerra nesses pontos. Com a imposição midiática, famosos de áreas diversas exercem um fascínio enorme nos costumes e na vida de uma sociedade superapegada ao rótulo. Nas telas das emissoras, mulheres e homens “perfeitos” propagam um ideal de beleza doentio e, muitas vezes, inalcançável. São corpos aerodinâmicos, malhados, marombados e sarados. Modelos estéticos convidativos, os quais induzem quem estar do outro lado a aderir a tais formas. Na mídia também há outra postura periculosa a qual diz que quem é belo, consequentemente é mais feliz no amor, no trabalho e na vida. Então, logo surgem as indagações e as frustrações sobre a própria aparência. Por que eu não tenho o lábio da Angelina Jolie? Por que eu não sou alta, bela e magra como a Top Model internacional Gisele Bündchen? E, por que eu não nasci com o charme e a beleza do ator Reynaldo Gianecchini? Quando esses questionamentos não são saudavelmente respondidos acabam resvalando em práticas doentias como anorexia, bulimia e tantas outras psicoses, as quais levam centenas de indivíduos a óbito ano a ano.

Nessa odisseia pela forma perfeita, não é só as mulheres que estão no epicentro narcisista da sociedade. Os homens também começaram a dividir espaço com elas e há muito tempo transitam nesse terreno. Hoje, mais livres dos preconceitos sociais que impuseram neles o perfil de macho alfa, eles fazem quase tudo e mais um pouco que as mulheres fazem. Cada vez mais a ala masculina ocupa as academias, musculando braços, bíceps, peitos e pernas, cobiçando cada vez mais os atributos desejados tanto pelas mulheres quanto por muitos homens. No entanto, quando a silhueta desejada não é adquirida através dos exercícios físicos, eles também se aventuram em tratamentos estéticos mais sofisticados. É por isso que vemos tantos deles colocando implantes de silicone em diversas partes do corpo, fazendo às sobrancelhas, depilando as pernas, e tantos outros recursos antes limitados a atmosfera feminina. Toda essa mudança de conduta fez com que os homens extrapolassem seus limites, como fez o americano Justin Jedlica, de 32 anos. Na sua obsessão pela beleza, ele fez 90 modificações cirúrgicas para ficar “idêntico” ao Ken, famoso namorado da boneca Barbie.

E quem não tem posses para isso? Para estes restam os riscos dos emagrecimentos rápidos e infalíveis que prometem perda de dezenas de quilos num piscar de olhos. Sobram também frustrações e uma vida fadada a infelicidade, já que não há sentido condicionar a existência a um protótipo corpóreo, do qual a forma física se sobreponha aos valores humanos. A relatividade da beleza é inquestionável, mas estamos presos ao “Retrato de Dorian Gray”, tal qual aquele que foi escrito sabiamente em outrora por Oscar Wilde. Tanto nesta obra quanto na vida real, não queremos largar o nosso passado jovem e viril, pois aprendemos que a felicidade está restrita a juventude e o fato de perdê-la significa deixar de ser feliz, ou simplesmente deixar de existir. É por isso que, em silêncio, em casa, nas academias e tantos outros lugares onde possam ver seus reflexos, homens e mulheres se perguntam: “Espelho, espelho meu, existe alguém mais bela (o) do que eu?”. E se veem monstruosamente artificiais, opacos pela maquiagem excessiva, ou estranhamente cirurgiados para agradar aos padrões sociais. Infelizes, essas pessoas esquecem que “o tempo voa...escorre pelas mãos. Mesmo sem se sentir. E não há tempo que volte...”. Por isso que é importante se permitir e se gostar do jeito que se é, mesmo que os seus atributos estejam fora dos requisitos preestabelecidos pela sociedade. Ser feliz ainda é um estado de espírito e não há nada pior do que viver uma vida de engano, fingida e superficial.

Um comentário:

  1. Isso é fato, Diogo. Muito bem colocado. Vaidade em demasia se torna uma doença.

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