24 março 2013

O fanatismo no futebol brasileiro: quem ganha e quem perde?


O futebol, enquanto esporte e, portanto, entretenimento, é tão saudável quanto qualquer outro que é praticado pelo país. Entretanto, guardadas as devidas proporções, ser um atleta futebolístico por aqui é tão importante, quiçá mais, do que passar no vestibular, conseguir uma casa própria, um carro, ou até mesmo angariar a independência financeira. Isto porque o futebol se instaurou na lista cultural da nação, da qual contabiliza os símbolos cruciais que cada cidadão deve possuir para ser “brasileiro”. Explicando melhor, para ser membro dessa “pátria mãe gentil”, o indivíduo, quase que obrigatoriamente, precisa acompanhar, gostar e torcer por times estatuais e o nacional, como forma de pertencimento, como se fosse uma identidade patrícia. Infelizmente, por causa dessa imposição, a devoção do povo tornou-o fanático, visto que ganhar ou perder não é uma dicotomia que se encerra dentro de campo, mas num confronto, um duelo final entre as torcidas ganhadoras e perdedoras, e sempre termina entre mortos e feridos.

A paixão nutrida por muitos brasileiros pelo futebol é algo inegável. Nosso país mantém uma íntima e doentia relação com este esporte, que se tornou referência nacional, tanto para quem é de fora quanto para os que aqui residem.  Nos campos, percebe-se que a adoração do povo é tamanha, visto que, organizados em torcidas, a população se aglomera para torcer pelo time e seus respectivos jogadores. Nesse cenário, como é comum, a rivalidade paira, já que a ideia principal desse entretenimento é vencer o time adversário. Acontece que a disputa não se encerra muitas vezes no meio do campo e acaba se estendendo para fora dele. Tal fenômeno pode ter várias razões, mas, possivelmente, o fanatismo de uma sociedade hipnotizada pela cultura de enriquecimento desses atletas, bem como seu estilo de vida, contribui para fomentar nos torcedores os sentimentos mais controversos.

Dentre eles, pode ser citada, a priori, a questão do “status” que esse esporte exerce. Com jogadores ganhando verdadeiros rios de dinheiro, não é de se surpreender que a população, que vive predominantemente com salários abaixo da realidade desses atletas, vislumbre-se com este universo. A ostentação personificada em carros de luxo, viagens, mansões dignas dos abastados xeiques, mulheres deslumbrantes, muitas baladas e festas regadas a sofisticação e glamour, despertam os sentimentos mais díspares na população. Então, cria-se uma divisão: de um lado, a grande massa que deseja fazer parte de tudo isso, pois o futebol os faz acreditar que com pequenos lances de pernas, qualquer indivíduo pode conquistar essa “The Never Land” esportiva. Enquanto isso, do outro lado está à minúscula camada esclarecida que se entristece profundamente ao ver a valorização dada a esse esporte enquanto outros, bem como outras atividades humanas, não recebem o mesmo prestígio.

Esse mundo ilusório criado pelo futebol acaba de alguma forma aguçando algo que já faz parte da personalidade humana, o senso de competição. Competir, nesse sentido, não se limita apenas a visão maniqueísta de que se há ganhadores, há perdedores. Verifica-se isso na reconfiguração dos embates entre os torcedores pós-jogos. São multidões guiadas pela selvageria, agindo como verdadeiros justiceiros, como representantes de cada um dos times envolvidos, em busca de um acerto de contas. Isso quando não acontece dentro do próprio estádio, como no polêmico caso do torcedor do Corinthians que foi atingindo enquanto torcia pelo seu time. Tudo isso acontece porque o próprio futebol passa uma imagem controversa do que é competir. Na verdade, no campo não está em jogo o interesse do time X ou Y, mas a necessidade de fazer nomes e carreiras de jogadores, os quais são vendidos e trocados como meros objetos. Além do passe deles, está à venda a sua imagem perante a torcida, esta que sempre espera o melhor e não aceita a derrota como consolação.

O mais recente entre o mar de casos que ensanguenta as notícias em torno dos jogos futebolísticos envolveu uma criança de dois anos, Lucas Luiz. Segundo informação, ele foi atingido por uma pedrada no rosto dentro do ônibus, antes do início de um “clássico” entre dois grandes times pernambucanos. Depois de hospitalizado, a criança segue se recuperando, mas ficará com grandes cicatrizes no rosto, além de sequelas traumatizantes que poderão acompanhá-lo pelo resto da vida. Esse é, dentre muitos, apenas um aperitivo dos grandes pratos vivos que são servidos ainda quentes e acabam agonizando em coletivos, táxis, ruas e avenidas do país. São invasões em ônibus, com direito a depredação de tudo o que é público e privado. Os assaltos também são potencializados, já que os torcedores andam em infantaria, como se estivessem numa guerra, invadindo residências e destruindo tudo o que estiver ao alcance deles. Sem contar que em muitos lugares o policiamento é insuficiente para, no mínimo, conter a ação desses indivíduos que não sabem o significado da palavra perder.

Devido a essa postura paradoxal, fica nítido que não há no futebol uma filosofia pautada no respeito a todos os envolvidos. Se cada time e jogador semeassem na mídia uma conduta honrada, a qual perdedor não se equiparasse a derrotado, possivelmente teríamos outro perfil do torcedor em campo. No entanto, o que se vê é o inverso disso. A necessidade de ganhar, de eliminar, de derrotar o outro a tudo custo transformou lazer em guerra, alegria em tristeza e, o pior, vida em morte. Entre os adendos possíveis, vale acrescentar que numa sociedade onde a grande maioria da população está acostumada a perder, vivendo entre o esquecimento e a miséria, é de se compreender porque projetar no futebol o desejo de sempre vencer. Por essa razão, muitos fãs apaixonados pelo seu time não aceitam a derrota, não querem ser vistos como incapazes, fracos e incompetentes. Eles querem sentir, apenas por um momento, a duvidosa sensação de vitória, para confortar os tormentos que os esperam fora do campo.

Vida marginalizada que não se limita apenas aos torcedores. Muitos jogadores de futebol, que tiveram uma infância entre a miséria, pobreza e violência, parecem que não conseguem se desvencilhar fácil do seu penoso passado. Os estigmas disso são reacendidos nos escândalos envolvendo grandes nomes desse esporte, os quais financiam o tráfico de drogas, com porte de arma ilegal e com transações duvidosas entre grandes magnatas do crime. Além disso, a fama desperta nessas pessoas, ofuscadas e iludidas pelos fortes refletores do campo, as posturas mais controversas e, nesse sentido, inesperadas pela torcida. São atletas envolvidos em casos de pedofilia, tendo relações sexuais com prostitutas, homossexuais e a até travestis, desconstruindo a atmosfera hipócrita da heterossexualidade no futebol. Outros que não se respeitam, destratando os colegas de trabalho com ofensas racistas e homofóbicas. Sem contar naqueles que estão mergulhados nas drogas, lícitas ou não, e que sob efeito delas agridem família amigos e, inevitavelmente os torcedores.

E é esse o mundo de sonhos, onde o dinheiro, a fama e o sucesso são os atrativos que iludem aqueles que buscam uma vida de mordomia, luxo e sucesso. É por isso que os torcedores não conseguem se controlar em apenas torcer salutarmente pelo seu time e jogador. Eles querem mais, mas não conseguem dizer isso só em aplausos, vaias, gritos e xingamentos. Eles precisam bater no outro, destilar sua raiva no adversário, para se sentirem aliviados de algo que eles mesmos desconhecem. Na verdade, eles querem ser o atleta em jogo, viver a vida dele, com seus hábitos e estilo de vida. A sociedade que vai ao campo receber uma enxurrada de cartões vermelhos é a mesma que vive no amarelo e acredita que um dia receberá um verde, para sair das mazelas sociais e psicossociais que são obrigadas a viver. Enquanto os devidos cartões não são dados, os jogadores, reais e imaginários, digladiam-se dentro e fora de campo, num espetáculo alienado pela supervalorização de atletas e inferiorização do humano. Quem ganha com isso é difícil dizer, porém os perdedores não. Eles são muitos e estão no outro dia vestidos com o time do coração gritando que é gol. E que venha o próximo clássico...

5 comentários:

  1. Olá amigo
    Sinceramente ando desiludido com o futebol. a violência tomou conta dos estádios, os jogadores não têm mais amor a camisa, e os dirigentes só pensam eu roubar. Sempre fui torcedor fanático pelo Cruzeiro de BH, e hoje infelizmente, me limito a ouvir o jogo pelo rádio ou ver pela TV.
    Bjux

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  2. Há muito tempo não me inteiro sobre futebol, perdi o estímulo, após compreender que existe um mar de falcatruas e manipulações que cegam o torcedor. Um dos grandes motores da fúria do torcedor, ao meu ver, é a transferência de todos os seus problemas, existenciais, domésticos e sociais, ao time de futebol, adversário ou não, e a sua torcida. Durante o jogo, felicidade e tristeza misturam-se, como um coquetel psicotrópico. Neste ambiente delirante, vinga-se do baixo salário, do desemprego, da sogra, do governador. Se o time ganha, é pura felicidade e a vida se resolve numa boa. Caso o time perca, a vida é miserável, o torcedor é um nada, precisa descarregar a ira existencial represada. Ooprimido, a saída mais rápida é encontrar outro mais fraco, para oprimir. Para lembrar-se que existe.

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  3. todo fanatismo por futebol tem um fundo de sindrome de vira-lata

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  4. todo fanatismo por futebol tem um fundo de sindrome de vira-lata

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  5. Infelizmente hj vi uma garota que conheci a pouco tempo, e fico impressionado com o fanatismo dela pelo Flamengo. É algo surpreendente! Pra ela si perder nem adianta falar com ela. Parece q encontra alegria em dizer sou campeão, enquanto deixa um amor de verdade de lado. Sinto com vonta hj de parar de ver futebol. Pois jamais trocaria alguém q amo por um jogo. Nem faria essa pessoa triste e a deixaria pra ver uma final.
    Minha felicidade si encontra nela. Não nao no futebol.ironico pois sou homem é ela mulher.ne onde num país o q mais acontece é o contrario. Dói .

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