O ambiente escolar é
conhecido como o segundo lar de crianças e adolescentes onde eles serão paulatinamente
preparados para a vida em sociedade. Neste local, espera-se que eles aprendam o
necessário para uma vida autônoma acerca de inúmeros temas, sobretudo aqueles
mais polêmicos e pouco discutidos pelos familiares desses jovens. Entre esses
assuntos, a questão do sexo é uma das mais complexas de serem debatidas, tanto
em casa quanto na escola. Infelizmente, este último ainda trata-o com fins
meramente procriativo, ignorando vetores paralelos relacionados ao prazer,
gênero, identidade de gênero e orientação sexual. Por causa dessa lacuna, esses
pequenos indivíduos, muitas vezes despreparados e inseguros, vão encontrar as
respostas para suas inquietações na prática, a qual nem sempre é realizada de
forma salutar. Ou, no pior dos casos, vedam-se em baús, guardando dentro deles
a chance de serem felizes e realizados sexualmente.
Parece polêmico de
início, mas poderia ser possível sim, principalmente entre adolescentes do
ensino médio das escolas públicas e privadas do país. Por não tratar com
naturalidade sobre esse tema, os jovens cada vez mais se aventuram nos terrenos
movediços do sexo de forma imatura e irresponsável. Isto ainda se dá na
atualidade porque os pedagogismos em torno desse assunto não focam no X da questão,
beirando apenas pontos superficiais em torno da camisinha e do uso ou não desta.
Por isso que as estatísticas em torno de Infecções Sexualmente Transmissíveis –
IST, não param de crescer. Mesmo na era da informação, da camisinha acessível e
de tantos outros métodos contraceptivos, a quantidade de jovens com doenças venéreas
e AIDS continua a crescer. Além de tudo isso, gravidezes indesejadas encurtam as
vidas de mentes incipientes, obrigando-os muitas vezes a passar por uma
maturidade precoce. Tudo isso é o reflexo de uma educação evasiva quanto ao
sexo, a qual ainda não direciona esforços mais contextuais em torno dessa
questão.
Tal conduta, porém, soa
contraditória. Num país conhecido internacionalmente pela sua postura
libertária, onde mulheres desfilam seminuas, ou mesmo nuas, em pleno carnaval;
que estampam capas de revistas eróticas (aliás, homens também o fazem); onde a
erotização está presente na mídia, na música, na publicidade e em tantos outros
veículos informacionais, parece controverso, até antagônico, negar o direito
dos jovens de discutir a sexualidade deles de forma mais plural. No entanto, a
contradição se dá porque o Brasil, mesmo com o rótulo de “país onde tudo pode”, na realidade é um dos mais conservadores
nesse sentido. Não aprendemos a lidar com os nossos desejos e ainda os tratamos
de maneira sacralizada, penitenciando as nossas vontades ao ponto de não nos
permitir sentir o que deveria ser naturalmente sentido: prazer. Talvez, a herança
religiosa herdada dos nossos colonos portugueses tenha sido o principal entrave
neste âmbito, causando bloqueios que se fazem presentes até hoje sobre as
questões ligadas a sexo.
Por
causa dessa educação sexual reducionista, a sociedade vem sendo polarizada
entre os “assexuados” e os “transgressores”, ambos os frutos do tabu humano
quanto aos desejos mais inerentes de sua espécie. Os primeiros não se referem à
conceituação biológica da coisa, mas correspondem aos conservadores, aqueles
que detêm nas mãos as rédeas morais da sociedade. Na perspectiva desse grupo,
sexo apenas com o voto sagrado do casamento, visando geralmente à procriação de
um novo ser e, consequentemente a formação da família. Esse perfil
comportamental em torno das práticas sexuais é defendido geralmente pelas
religiões de cunho cristão, as quais destacam o sexo como uma prática
matrimonial. No entanto, os contrários a esse modelo transgridem as normais
vigentes para buscar as sensações mais hedonistas possíveis, sobretudo aquelas
que são “rejeitadas” pelo moralismo social, mas que são amplamente realizadas
no sexo cotidiano (e no não cotidiano também). Neste grupo, homens e mulheres
que subvertem o estabelecido são rapidamente tachados como fornicadores,
lascivos e promíscuos, sentenças estas muitas vezes dadas por pessoas
amarguradas e frustradas sexualmente.
Se houvesse uma
atmosfera respirável em casa e na escola, quando o sexo viesse à tona, não
existiriam tantas pessoas com problemas, medos, vergonhas e, principalmente
culpas quanto às práticas sexuais que realizam ou são/foram forçosamente obrigados
a realizar. Por isso que a quantidade de pessoas frustradas quanto ao sexo pode
ser medida nas incontáveis salas de consultórios ou nas avenidas e bordeis
espalhados pelo país. No primeiro caso, médicos, psicólogos e especialistas
diversos tentam encontrar soluções para as carências sexuais de seus pacientes,
que não foram educados a sentir prazer e a realizar suas fantasias, mas sim a
serem máquinas procriativas para agradar os padrões heteronormativos sociais.
Já o segundo caso é o mais antigo e comum. Cada vez mais, homens e mulheres,
insatisfeitos com suas vidas sexuais, buscam em locais específicos o prazer que
lhes foi furtado desde a adolescência. Sabendo dessa demanda, o mercado
pornográfico investe maciçamente nesse setor, com saunas, boates, salas de
swing, de stripper e tudo o que universo do sexo pode proporcionar. Além é
claro da comodidade, e perigo, oferecido por aqueles que se oferecem em sinais
de trânsito dos grandes centros urbanos.
Quando
vemos essas prostitutas, michês e travestis na rua, não conseguimos entender o
que leva tantos indivíduos a buscar nesse ramo um mecanismo de sobrevivência. Explicamos
a nossos jovens que tal prática é errada, mas não dizemos a razão disso. Se há
um mercado de prostituição tão diversificado é óbvio que há uma intensa demanda
da pessoas/clientes carentes e ansiosos para realizar suas fantasias sem os
tabus hipócritas impelidos pela sociedade. Elas, então, buscam nesses profissionais
a chance de interromper as próprias fronteiras morais para se aventurar naquilo
que todo ser humano deveria ter direito, sem necessariamente pagar: o prazer. E
esse refúgio só acontece porque não há uma educação que prime pela liberdade
sexual de homens e mulheres desde a sua tenra idade. É evidente que a juventude
deve aprender desde cedo a se proteger de doenças sexualmente transmissíveis, a
não engravidar indevidamente, mas ela também tem o direito de ser orientada
quanto aos prazeres que deve sentir e da forma que achar conveniente. A educação
não pode ser provinciana ao ponto de impor um modelo sexual apenas focado na
procriação e esquecendo-se de que gozar, literalmente falando, é um ato
benéfico que merece ser sentido por todos, sem preconceitos e tabus.
Enquanto a nossa educação
leva nota zero nesse sentido, os jovens vão em busca dos pontos extras na
prática e sem muita ou nenhuma responsabilidade. Assim, é comum encontrar
menores de idade na mídia transando em locais públicos, envolvidos em surubas,
sensualizando na net, com fotos dignas das grandes revistas eróticas do gênero.
Quando crescem, mesmo com uma vida ativa sexualmente, eles não estão curados
das infecções causadas por uma educação rasa nesta perspectiva. Homens casados,
com filhos e aparentemente bem resolvidos, arriscam suas vidas, suas relações e
sua imagem em busca de prostitutas, michês e travestis, pois não foram
ensinados desde cedo a respeitar suas próprias preferências sexuais e encontram
na clandestinidade do sexo a válvula para externarem suas carências. Com as
mulheres a coisa ainda é bem pior. Por serem ainda educadas a não sentir prazer,
muitas não se sentem encorajadas a buscar na rua o que falta em casa, pois
foram ensinadas que o prazer está limitado ao ambiente conjugal e deve ser
feito da forma mais tradicional possível. Logo, quando alguma delas assume que
se masturba, que transa com múltiplos parceiros, que faz swing, etc., são
imediatamente tachadas de putas, vadias, piriguetes e outros adjetivos do
gênero.
Tudo isso ainda
acontece em pleno século XXI, porque não aprendemos e falar, discutir e ensinar
o sexo naturalmente aos nossos jovens. Presos a cegonhas e limitados a heteronormatividade,
nossa juventude cresce, “vive” e morre muitas vezes sem a oportunidade de sentir
um bom orgasmo, e isso só mudará com uma educação subversiva que transgrida
esse sistema e apresente novas rotas nesse sentido. Imagine, então, entrar numa
sala de aula e encontrar uma professora ensinando técnicas prazerosas de como
fazer sexo oral e, numa outra sala, o professor se debruça sobre as técnicas do
sexo anal e de como ele pode ser realizado entre os parceiros sem tabus? Imagine
também que, ao virar o corredor, outros alunos assistiriam aulas, no pátio do
colégio, sobre as zonas erógenas de homens e mulheres e entenderiam que a
vagina e o pênis podem e devem ser desvendados além da estratificada questão da
concepção da vida que gira em torno deles? A naturalização do sexo, sem
eufemismos e psicopedagogismos, ajudaria meninos e meninas a descobrirem
mecanismos individuais capazes de construir a própria sexualidade e encontrar
nela os prazeres necessários para serem realizados nesse sentido. Complicado?
Talvez! Impossível? Jamais! Se as escolas se empenhassem mais nisso, talvez
muitos dos “males” causados pela falta de orientação sexual diminuiriam
significativamente, e a juventude cresceria com menos complexos desnecessários.
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