DIOGO E VICTOR - Graduandos em Letras - UPE
INTRODUÇÃO
Comparar a estrutura de uma obra literária que foi repassada para o cinema é algo que, nas palavras de alguns estudiosos da área, seria inconcebível. Isto porque, ambas as manifestações artísticas oferecem diferentes tipos de arcabouço para o entendimento de uma determinada obra. Contudo, Tratando do filme Ilíada, é impossível não fazer distinção entre a obra literária e a adaptação cinematográfica. A primeira, por conter a gênese da criação, oferece um leque de detalhes sobre a trama, levando o leitor a compreender não só o tema em questão, mas também absorver as peculiaridades cultural, social e, sobretudo religiosa vivida pelos povos antigos. Em contrapartida, o filme, por ser mais sucinto, acaba fragmentando a obra para que se encaixe nos padrões ditados pela indústria do cinema. Esse corte brusco fez com que na Ilíada dois pontos importantes divergissem da narrativa apresentada no livro: O primeiro refere-se à falta da intervenção dos deuses do Olimpo; A outra se refere a Aquiles ser o personagem central do filme, fazendo com que toda à trama gire em torno dele. Outros aspectos também são bem visíveis, como omissão de alguns personagens existentes na obra literária, até fatos não contidos em tal obra.
DE HOMERO A WOLFGANG PETERSEN
Adaptar para o cinema uma obra literária, respeitando o máximo possível da legitimidade que ela apresenta, é uma façanha digna para poucos. Isto por que, retratar nos mínimos detalhes o que está sendo narrado por um livro é algo praticamente impossível, visto que a estrutura deste último permite uma maior maleabilidade na construção de sentido por parte do leitor. Este por sua vez, interage mais diretamente com a mensagem que o autor se propôs a passar, criando um fluxo de imagem típico do livro. Existe, nesse sentido, uma pequena viagem, na qual o autor comanda todo o trajeto, enquanto o leitor apenas desfruta das surpresas e peripécias que serão desvendadas a cada nova pagina lida. Isso não quer dizer que a releitura feita pelo cinema não possa ter o mesmo vislumbramento. Apenas acreditamos que o contato entre o leitor e o livro é maior tanto quantitativa, quanto qualitativamente, pois o grau de intimidade é crescente. O cinema, por sua vez, tem o dom de materializar a mensagem que o autor tentou passar no livro. Através de uma linguagem mais próxima da realidade da maioria dos telespectadores, ele vai fazer com que uma determinada obra se torne atrativa aos olhos, despertando na sociedade a vontade de ir a uma sala de cinema para conferir como ficou a releitura de uma dada obra. Essa manobra feita pelas empresas cinematográficas é o conhecido chamariz, mecanismo propagandista que dá conta de atrair público. Infelizmente essa tática acaba prejudicando diretamente o enredo de alguns filmes baseados em adaptações, quando o interesse é apenas publicitário ou monetário. Preocupa-se muito com a contratação atores/atrizes de renome, investe-se alto em efeitos especiais, mas esquece-se de contemplar certos pormenores do livro, aumentado assim suas diferenças em relação ao filme. Devido a essa disparidade, crescem as criticas aos filmes que tentam adaptar grandes clássicos da Literatura Universal ao cinema. No entanto, o cinema, inserido em seu valor, ainda é o meio mais acessível das pessoas terem contato com determinados cânones, visto que, no Brasil, o hábito de leitura não é culturalmente prioritário.
ONDE ESTAVAM OS DEUSES DO OLIMPO?
Essa pergunta foi feita por todos aqueles que leram a obra Ilíada e, em seguida, assistiram ao filme de Tróia. Muitos esperaram que os deuses agissem da mesma forma como no livro: interferindo diretamente nas batalhas, ora favorecendo os gregos, ora os troianos. No entanto, tal participação não ocorreu no longa. Basicamente a história adaptada de Tróia narra o rapto de Helena pelos troianos, desencadeando uma árdua batalha entre os dois povos. É lamentável deixar de incluir a questão mitológica da época, algo que exercia grande influência no cotidiano das pessoas. Como se sabe, naquele período ocorria adoração a vários deuses, ou seja, o Politeísmo. As pessoas cultuavam e faziam sacrifícios em troca dos pedidos feitos aos deuses. Zeus, Poseidon, Ades, Atena eram algumas das inúmeras divindades que eram cultuadas pelos gregos. O que chama a atenção é o perfil no qual esses deuses eram apresentados. Cheios de vícios, defeitos e desejos carnalizados, os deuses do olimpo faziam constantes interferências na rotina das pessoas. Na batalha de Tróia, narrada na Iliada, é marcante a presença desses deuses, favorecendo gregos e troianos nos momentos em que lhes conviessem. Já no filme, existia uma constante preocupação em mostrar mais os conflitos do que a questão religiosa vivida pelos personagens. No longa-metragem de Petersen, no que se refere ao quesito religião, merecem certo destaque apenas alguns personagens: Príamo, rei dos troianos, homem de extrema devoção aos deuses; E a jovem Briseida, que no filme aparece em algumas cenas mostrando toda a sua crença e adoração aos deuses. Enquanto isso, os outros personagens não demonstram muita fé aos tão famosos deuses do Olimpo. O resultado disso é uma narrativa deslocada contextualmente, no que se prefere centralizar a historia apenas em torno de um só personagem e esquece-se de mencionar fragmentos importantes do livro que seriam cruciais para a compreensão da obra.
A GUERRA DE TRÓIA É A GUERRA DE AQUILES?
Quem assistiu ao filme de Tróia percebeu que o personagem central da trama não era bem a disputa entre gregos e troianos. Existia um entre todos os personagens da trama que se sobressaía entre os demais. Esse personagem era Aquiles, filho de Peleu e Tétis, o semideus, como era constantemente chamado no filme. Os leitores do livro que em seguida assistiram a adaptação para o cinema perceberam que a questão comercial acabou prevalecendo no momento da construção do enredo de Tróia. O papel de Aquiles, interpretado pelo galã Brad Pitt, contribuiu para elevar o filme na escala de superprodução, resultando na comercialização exacerbada do filme.Evidentemente que, ao produzir um filme que tenha como ponto de partida a historia de uma lendária batalha entre dois grandes impérios, é de se esperar que haja essa preocupação dos produtores, no que diz respeito à arrecadação das bilheteiras do cinema. Porém, associado a isso deveria estar ligado à descentralização do personagem de Aquiles no filme. Não que o seu papel, tento na obra quanto no cinema, não tenham sido relevantes. Pelo contrário, ele foi um dos maiores, quiçá o maior guerreiro que os gregos e, possivelmente os troianos, tenham visto.Aquiles se torna o personagem central do filme, restringindo a aparição de outros personagens que tiveram a sua parcela na construção da temática da obra. Muitos tiveram pequenas participações, enquanto outros nem sequer foram citados no filme. O resultado é uma exaltação ainda maior da figura de Aquiles, em detrimento dos outros personagens.
DIVERGÊNCIAS ENTRE O LIVRO E O FILME
• A Ilíada não narra a morte de Aquiles, como aparece no filme;
• A o obra de Homero tem como tema central a ira de Aquiles, a guerra e suas conseqüências;
• Pátroclo, além de ser mais velho que Aquiles, mantia relações homossexuais com o primo;
• Heitor, após executar Pátroclo, coleta a armadura que o grego usara, esta era, na verdade, o traje de Aquiles. Tal detalhe não é retratado no filme;
• Vulcano, a pedido de Tétis, forja uma nova armadura para Aquilies. Esta era extremamente luxuosa e resistente, o que garantiu a vitória de Aquiles sobre Heitor;
• O estopim do desentendimento entre Aquiles e os gregos foi a atitude de Agamémnom tomar-lhe a escrava Briseida. Agamémnom o faz por ter entregado sua própria escrava, Criseida, cuja não aparece no longa;
• Com a queda de Tróia, Helena volta à Esparta e para Menelau, o que também não é retratado no filme;
• O enredo de Ilíada se encerra com o funeral de Heitor, fato desobedecido no cinema.
CONCLUSÃO
Adaptar uma obra literária é uma tarefa árdua. Muitas vezes essa adaptação não contempla todo o enredo que o livro produziu. No cinema, vários clássicos da literatura passaram por essa experiência, muitos com êxito, outros, porém, ficaram limitados a interpretações simplórias, superproduções vazias e cortes gigantescos, comprometendo assim a essência da obra em questão. Com a Ilíada, tal fenômeno aconteceu, pois muitos detalhes importantes forma omitidos, enquanto outros foram explorados exageradamente.Como foi dito antes, não se espera que o cinema consiga comportar todos os detalhes que uma grande obra literária pode apresentar. Contudo, espera-se, por outro lado, que o limiar que separa o cinema do livro se torna cada vez mais amplo. A ideia é que haja um elo semântico que permita ao leitor identificar nos meandros de cada cena representada no cinema alusões da mensagem criada pelo autor original da obra.
mto bom me ajudou bastante na pesquisa
ResponderExcluirMuito esclarecedor... parabéns.
ResponderExcluirMuito esclarecedor... parabéns.
ResponderExcluirAdorei
ResponderExcluirExcelente visão.
ResponderExcluirExceto alguns detalhes...
Sua observação é baseada em Iliada, porém a guerra de troia não se baseia apenas na iliada. Após o funeral de Heitor (Onde se termina a iliada do grande Homero) o filme continua assim como a historia da guerra de troia também, não foi uma criação do roteiro adaptado ao filme. Agora, de fato, concordo com sua visão onde o filme nal respeitou a história da guerra de troia tal como em Iliada e as demais fontes da mesma. Abraços e parabéns!