14 julho 2012

Quem realmente se prostitui?



A prostituição é uma das atividades mais conhecidas em todo o mundo. Sua prática, para alguns, coincide com o surgimento do homem na terra, enquanto, para outros, essa atividade se corporifica a partir do momento em que o sexo se tornou tabu nas sociedades modernas. Precisando, assim, de “profissionais” que realizassem fantasias lascivas, contrárias ao que era considerado correto. Logo, tal prática configura-se como a transgressão da ordem monogâmica vigente, sobretudo em países como o Brasil, onde essa atividade recebe o “status” pejorativo da promiscuidade. Ora, se de fato a prostituição está ligada àquela palavra, então, o paradigma desse fenômeno ganha uma dimensão mais ampla, visto que, atualmente, muitas pessoas exercem atividades promíscuas e não são rechaçadas por isso.

Maquiagem marcante, roupas sensuais, músculos torneados, esses sãos alguns dos atributos daqueles que utilizam do próprio corpo como instrumento de trabalho. De fato, aceitar a prática da prostituição, para muitos, é algo dificílimo, pois nossa inexorável visão acaba discriminando certos fenômenos muito antes de entendê-los. Isto porque, na sociedade em que vivemos, há o apelo “silencioso” para que cada indivíduo constitua família. Esta, é claro, fundamentada na concepção da monogamia, a qual é aceita pela ortodoxia religiosa e, posteriormente pela moral e os famosos, mas controversos, “bons costumes”. Logo, sexo em troca de dinheiro torna-se a desconstrução de tudo isso, numa quebra avassaladora dos valores pregados, e historicamente disseminados pelas sociedades ao longo do tempo.

No entanto, em muitos momentos, cometemos atos prostituídos e nem ao menos nos damos conta disso. Se a prostituição tem como principal característica a rotatividade dos parceiros, algumas vezes sem ato sexual propriamente dito, então, muitas pessoas são tão vadios quanto muitos profissionais que trabalham com esse tipo de serviço. Por exemplo, muitas pessoas saem à noite para se divertir e acabam beijando inúmeros parceiros; transando com estes e quando não, pegando doenças e até uma gravidez indesejada. Ou seja, enquanto a meretriz assumida se previne de doenças e só transa por uma significativa quantia de dinheiro, outras, consideradas “honestas” e de “boa família” fazem tudo isso, mas não recebem o mesmo rótulo discriminatório.

Também criticamos pessoas famosas, ou recém-lançadas na mídia, que volta e meia estão posando em algumas revistas especializadas em nudismo, de gêneros diversos; ou taxamos estas de vulgares por aparecem em fotos sensuais em sites e nas inúmeras redes sociais que se proliferam na internet; por puro marketing ou hedonismo moderno. No entanto, muitos anônimos sentem conscientemente o desejo de estampar uma dessas revistas, seja por uma questão de pertencimento, já que vivemos numa sociedade que nos obriga a participar de determinados perfis para sermos aceitos; seja por pura lascividade, numa vontade incontrolável de exibir as intimidades para outrem. 

Além disso, exibimos fotos sensuais em sites e redes sociais, dignas de muitas capas pornográficas conhecidas em todo o país. Mesmo assim, não recebemos o título de prostituto por isso, visto que não há uma renda envolvida nisso. Muito embora, a única diferença entre ambos os casos está na questão financeira e, sobretudo na sinceridade das cocotes e michês que se aventuram nas avenidas e prostíbulos espelhados pelo país, enquanto as pessoas “de bem” fazem algo similar ou até pior, porém cobrem-se com o manto do simulacro hipócrita.

Nessa linha de raciocínio, somos contra a prostituição infantil, visto que esta prática furta o direito da criança de viver uma fase da vida, tão importante para sua construção enquanto sujeito, não só psicologicamente, mas social e, sobretudo sexualmente. Porém, muitos adultos, sem perceber, aguçam a curiosidade dos infantes para temas ligados a sexualidade, sexo, numa época onde o corpo e mente desses jovens não está preparado para absorver esse tipo de informação. Isso ocorre em ocasiões simples, quando, por exemplo, deixamos jovens assistirem a programas inadequados, com cenas de beijos ardentes e até mesmo de sexo, propriamente dito. O resultado disso, são adolescentes cada vez mais prostituídos e iniciados numa vida sexual precoce, imprudentes e irresponsáveis, perpetuando os já altos índices de doenças, abortos e traumas ligados a uma sexualidade mal construída. Entretanto, não enxergamos dessa forma o fenômeno da iniciação juvenil, preferindo encontrar outros culpados para as falhas que “inconscientemente” cometemos com esse grupo.

Outro ponto polêmico ligado à prostituição refere-se à troca de favores sexuais por uma simbólica, ou às vezes farta, quantia em dinheiro. Essa manobra não é nova, uma vez que em vários momentos da civilização, moças e rapazes eram oferecidos como objeto de consumo de grandes autoridades em épocas distintas da história da humanidade. Em contrapartida, na era atual, tal prática encontra severas críticas, porque quem a realiza está ampliando o conceito de coisificação humana, a qual, nesse contexto, diz respeito à dessubjetivação do indivíduo. Em outras palavras, quem se vende por dinheiro lança mão do seu emblema de humano, racional, dessa matéria sócio e biologicamente aceita por todos, para se tornar um objeto consumível e, posteriormente descartado. Ora, não é só no ato da prostituição que as pessoas deixam de ser humanas para se tornar verdadeiros animais irracionais.

Nesse sentido, muitas pessoas podem ser consideradas como verdadeiras coisas, pois constantemente se vendem por dinheiro desonesto, diferente de muitos profissionais do sexo, que pagam suas contas em dia e ainda exercem sua cidadania de forma mais contundente do que muitos hipócritas que circulam pela sociedade. Quem diga os políticos do nosso país, que ano após ano, entram e saem do poder, mas pouco, ou quase nada fazem de significativo para o Brasil avançar de verdade. Além dos falsos religiosos, que usam a fé do povo para enriquecimento próprio, como constantemente tem sido mostrado em matérias, as quais pastores, bispos, padres etc., ampliam suas rendas a partir da boa vontade dos fieis, tudo em nome de Deus. Enquanto isso, preferimos crucificar as pessoas que fazem parte do mundo da prostituição, pois é muito mais fácil arremessar pedras nos corpos de quem assume uma posição ativa no mundo, ao invés de metralhar certos grupos que não contribuem com nada de significativo para o bem do povo.

Aí, alguém pode ousar em perguntar, o que a prostituição pode trazer de benéfico para a sociedade? Primeiro, a quebra de paradigma. Se há prostitutos (as) nas ruas é porque há uma necessidade humana de fantasiar o sexo, de transcender do politicamente correto e buscar novas formas de prazer, rompendo esse engessado modelo do qual vivemos, que é lindo na teoria, mas na prática, em quatro paredes, é bem diferente. Segundo, porque externa a selvageria humana. Não podemos nos esquecer de que somos animais e como tal, sentimos desejos ardentes pelo outrem, vontades estas que são sepultadas vivas por uma moral ultrapassada, a qual não acompanha o desenvolvimento humano em completude. E, terceiro, porque nós não fomos criados para sermos monogâmicos. Essa prática está relacionada a uma ditadura religiosa, atestada e comprovada historicamente. Mesmo assim, somos obrigados, por aqui, a engolir o discurso unilateral da relação humana, desprestigiando outras possibilidades afetivas e sexuais.

Rotular a prostituição como algo lascivo, pecaminoso e transgressor é minorar uma discussão que tem suas bases bem mais profundas do que se parece. Na verdade, ninguém se prostitui por que quer, mas sim porque é levado a tal, principalmente no Brasil, onde as desigualdades abissais criam uma porta de entrada para esse tipo de trabalho, o qual oferece dinheiro rápido, porém com grandes obstáculos. A exposição às ruas está sujeita a todo tipo de violência, a aquisição de doenças e o pior, aos olhares preconceituosos daqueles que se acham donos da moral e carregam o discurso do politicamente correto. Portanto, antes de insultar, agredir ou até mesmo humilhar alguém que escolheu este caminho, é coerente buscar formas de entender o que tem levado cada vez mais pessoas a esse tipo de serviço, e qual a importância dessa prática milenar na sociedade atual, pois nada que fosse tão ruim duraria tanto. Só dessa maneira, poderemos elucidar alguns mitos que circundam esse mundo de sujeira e ilusão, descobrindo que nem sempre os vulgares são aqueles que estampam na face suas fantasias.

2 comentários:

  1. para mim prostituição é qualquer coisa q vc faça em troca do seu corpo, mas respeito isso pq cada um é livre para usar seu corpo como bem entender.

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  2. Parabéns pelo texto! Eu concordo com tudo isso, até porque pra mim prostituição do corpo não é nada,''feio'' mesmo é quem vende o caráter. Porém, infelizmente, ainda vejo muitas pessoas julgando mais a ''moral indivídual''(como se comporta em relação a sí) do que a ''moral social'' (como se comporta em relação ao outro).

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