12 junho 2010

Arte e Sociedade




Arte e Sociedade. As relações entre a arte e a sociedade tem sido encaradas de múltiplas formas.
Uns encaram os artistas como simples seres mais ou menos passivos que se limitam a expressar ou espelhar as ideias da sociedade e seus grupos dominantes, ou ainda a servirem os interesses do poder, nomeadamente em termos propagandísticos.
Outros autonomizam a função dos artistas e encaram-nos como interpretes das preocupações ou dos valores de uma sociedade, muitas vezes antecipando-se mesmo à sua própria evolução, revelando as conseqüências de determinadas tendências sociais. Neste sentido, a arte tem funcionado como um instrumento de crítica social.
Não podemos, como é obvio, reduzir as criações artísticas apenas ao tempo em que foram produzidas, a arte manifesta essa invulgar capacidade também de o superar. Para a compreensão da criação artística, temos que levar em conta dois planos essenciais: 1.Sociedade onde decorrem as vivências e as aprendizagens do artistas; 2. O imaginário real ou fictício que o artista materializa em cada obra. 3. O próprio artista que nunca deixa de "pôr tudo aquilo que é no mínimo que faz" (Fernando Pessoa).







Morte e Vida Severina

O meu nome é Severino, como não tenho outro de pia.
Como há muitos Severinos, que é santo de romaria,
deram então de me chamar Severino de Maria;
como há muitos Severinos com mães chamadas Maria,
fiquei sendo o da Maria do finado Zacarias.
Mas isso ainda diz pouco: há muitos na freguesia,
por causa de um coronel que se chamou Zacarias e
que foi o mais antigo senhor desta sesmaria.
Como então dizer quem fala ora a Vossas Senhorias?
Vejamos: é o Severino da Maria do Zacarias,
lá da serra da Costela, limites da Paraíba.
Mas isso ainda diz pouco: se ao menos mais cinco
havia com nome de Severino filhos de tantas
Marias mulheres de outros tantos, já finados,
Zacarias, vivendo na mesma serra magra e ossuda em que eu vivia.
Somos muitos Severinos iguais em tudo na vida:
na mesma cabeça grande que a custo é que se equilibra,
no mesmo ventre crescido sobre as mesmas pernas finas,
e iguais também porque o sangue que usamos tem pouca tinta.
E se somos Severinos iguais em tudo na vida,
morremos de morte igual, mesma morte severina:
que é a morte de que se morre de velhice antes dos trinta,
de emboscada antes dos vinte, de fome um pouco por dia (de fraqueza e de doença é que a morte severina ataca em qualquer idade, e até gente não nascida).
Somos muitos Severinos iguais em tudo e na sina:
a de abrandar estas pedras suando-se muito em cima,
a de tentar despertar terra sempre mais extinta,
a de querer arrancar algum roçado da cinza.

João Cabral de Malo Neto

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