A maior burrice que
podemos fazer ao entrar em um relacionamento é excluir aquelas pessoas que, na nossa
solteirice, nos preencheram o vazio da solidão, porém, é o que mais acontece.
No afã do encantamento, rapidamente números são apagados da agenda, mensagens
comprometedoras são deletadas e aqueles contatos, que saciaram a ausência de
uma cia, são renegados ao esquecimento. Os bem intencionados argumentarão que
isso é uma prova de amor, de fidelidade, palavras muito grandes para serem
usadas levianamente, ainda mais quando pouco se conhece de quem está ao nosso
lado. Em muitos casos, quando começamos um envolvimento com alguém, há muitas
incertezas em jogo. Entretanto, ávidos para dar uma resposta imediatista ao
nosso par, desfazemos laços importantes com os contatinhos que tínhamos, os
quais, na pior das hipóteses, são os únicos dispostos a nos oferecer alguma
forma de afago quando o que idealizamos não dá certo.
Como a dinâmica a dois
ganhou novos contornos com a internet, os relacionamentos seguem em gigabytes
unindo almas ávidas a se arriscarem no convívio com o outro. Levar em
consideração o advento tecnológico é imprescindível para dar credibilidade aos
contatos. Isto porque, por mais vislumbre que se crie por alguém na vida real,
a rede tem ofertado hiper possibilidades de envolvimento. São aplicativos,
salas de namoro, chats, todos dispostos a acalentar nossas necessidades, sejam
elas afetivas ou sexuais. Logo, se afobar na escolha de alguém, sem estar certo
dos reais sentimentos envolvidos na questão, não só amplia a incidência de se
optar por uma alternativa errada, como também nos faz agir por impulso,
renegando aqueles contatos que tiveram, e tem, a sua serventia. Essas tomadas
de decisões imprudentes costumam vir carregadas de arrependimentos depois,
quando aquilo que deveria durar uma vida nem chega a ser um namoro de verão.
Em muitos desses casos,
ao começar um envolvimento com alguém, há muitas incertezas em jogo acerca da
durabilidade daquela história. Não há garantias de que os sentimentos sejam
recíprocos e, o pior, duradouros. Hoje, devido aos arranjos conjugais que
começam com um click e terminam em outro, é cada vez mais complexo assegurar a
duração de uma vida a dois. Porém, iludidos com uma ideia frágil de fidelidade,
muitos de nós faz uma demonstração abrupta de comprometimento eliminando os
contatinhos da lista telefônica e demais redes sociais. O problema é que, em
diversos exemplos, a pessoa que se dizia disposta a estar conosco pode mudar de
ideia. Então, nos vemos duplamente sós: sem os contatos e sem a promessa de uma
aliança vindoura. Muitos podem alegar que quem chega a esse ponto peca pelo
amadorismo. Porém, não há profissionalismo nem experiência capaz de nos impedir
de fazer uma escolha equivocada. No campo do sentimento estamos na arquibancada
torcendo para que o nosso time ganhe, mas, muitas vezes, o jogo vira.
Nesse sentido, há
conexões que precisam ser mantidas, mesmo que não venham com a promessa de algo
a longo prazo, mas que sejam capazes de saciar lacunas presentes, antes daquela
pessoa especial de fato surgir em nossas vidas. Porém, concordo que há contatos
e contatos. Alguns merecem ser tratados no diminutivo, pois pouco acrescentam a
nossa história de vida. Outros, todavia, deveriam ser alocados em outra
categoria, porque se tão presentes na dinâmica diária que muitas vezes é
impossível pensar em um desenlace. Evidentemente que esse pensamento é
repudiado numa sociedade pseudo monogâmica como a nossa. Preferimos ir de encontro
a nossa natureza para atender a anseios externos incapazes de compreender e,
sobretudo, suprir o nosso lado mais animalesco, aquele que deseja sim várias
pessoas, amá-las sem o jugo da condenação, sempre tão rápido e raso em
sentenciar os transviados.
Ter opções não pode ser
visto como traição quando o outro não nos garante a devida segurança. Até que
alguém se torne prioridade para nós, não podemos descartar as inúmeras
possibilidades de conhecer, estar ou quiçá viver com alguéns, no plural, desde
que seja algo consentido, devidamente compactuado entre as partes e seguro para
os envolvidos. Entretanto, os mais puritanos rapidamente levantarão a bandeira
da promiscuidade para acusar quem opta por essa forma de relacionamento. Tal
atitude, além do inegável tom conservador, ignora uma realidade vista
claramente: todos usam todo mundo. Seja por uma noite de prazer, seja por mera
conveniência, estamos todos em constante relação de interesse com o outro. Ir
de encontro a isso é ignorar a influência do capital no convívio humano também
no campo afetivo. Assim, ao invés de sentenciar os contatinhos no bojo das
vulgaridades, o mais sensato seria rever esse modelo tacanho de
namoro/casamento, o qual inicia-se e termina-se cada mais abruptamente.
Poucas são as uniões
não precipitadas. Na ânsia de estar com o outro, firmamos um acordo sem ler as
entrelinhas desse contrato, o qual é repleto de cláusulas e pouquíssimas
brechas, fazendo com que, quando haja um conflito, ambos estejam sufocados. Não
é de se espantar que no Brasil tenha aumentado significativamente o número de
litígios, alguns até de forma violenta, bem como de pessoas que trocam de
parceiros como de roupa, até mesmo em ambientes ditos mais improváveis como
espaços religiosos. Esse fenômeno, apesar de ignorado, na prática refere-se a
precipitação dos envolvidos. Estamos divididos em dois polos bem claros:
aqueles que buscam ensandecidamente por uma alma gêmea e o outro que não quer
perder tempo apenas com uma única pessoa quando o mundo oferece um leque gigantesco
de possibilidades. A questão é que o segundo lado dessa moeda é hipocritamente
acusado de lascivo, quando ambos os lados praticam, de fato ou em pensamento, a
política de ter, ou idealizar alguém, para preencher o que nos falta.
Os contatinhos, portanto,
limitam a chance de escolhermos apressadamente alguém que pode não ser o grande
amor de nossa vida. É a nossa zona de conforto, o purgatório, uma espécie de
transição para algo melhor que mais cedo ou mais tarde virar. Também faz parte
das novas modalidades cibernéticas, em um mundo onde a desconectividade é
impossível. Serve para ampliar a nossa noção de tempo, o qual é adiantado para
estar com o outro cujo o ritmo nem sempre está em compasso com o nosso. Mais
que isso, os contatinhos confrontam as verdades frágeis que criamos para
defender uma monogamia incapaz de deter o curso de nossas paixões. Claro, em
países como o Brasil, o machismo e a misoginia nem sempre equiparam a balança
dessas experimentações, o que está sendo paulatinamente combatido e revisto. Assim,
caso você não esteja certo de que encontrou a pessoa da sua vida, não aniquile
a pluralidade que te serviu nesse processo. Permita-se experimentar os outros e
ser provado por eles. Não se precipite: os contatinhos são importantes.