03 março 2013

A excitação de escrever - por Ricardo Gondim



Escrevo na ânsia de enjaular as palavras na arena onde luto comigo mesmo. Deliro sobre tornar-me escritor. Penso que as palavras podem cativar o vento. A inspiração que precede a escrita me engana. Procuro cravar pensamentos diáfanos. Anseio por narrar o inenarrável. Grafo sentimentos mas o inexprimível de minha alma me escapa. Redijo para ninguém.

No texto, sou leitor tentando expelir o engasgo preso no peito. Enquanto suo a página, caço um jeito de desentranhar o que lateja em meu espírito.

Escrevo por divagação. Minhas linhas não passam de estradas por onde fantasio desejos escondidos. Inicio o texto e logo, feito navio à deriva, me perco. Nada como um ensaio para desprender antigas convicções das âncoras da certeza. Minha redação me deixa ébrio, serpenteando nas ideias. Sinto o impulso de expressar o que não passa de intuição. Apanho da escrita. Como transformar em letra as lágrimas malcriadas?

Escrevo em estado de pura nostalgia. Vestígios trágicos de anos mal vividos clamam por vingança. Na prosa, luto para resgatar o que nunca vivi, e na poesia, celebrar a beleza que me privei de contemplar. Rabisco para ressuscitar risos esquecidos. Quero retornar a lugares deixados para trás.

Escrevo com o coração estilhaçado. Quando redijo, tento remediar decepções, debelar desesperos, sarar feridas. No refúgio da palavra, unto com o bálsamo da divagação o calcanhar que rachei nas pedras do caminho. Na angústia de corrigir, revisar, apagar, re-escrever, talvez encontre terapia. Ao tentar fazer literatura vislumbro como a excelência se distancia de mim. No desafio de cinzelar algumas frases, noto o absoluto além do meu alcance.

Escrever significa abraçar o desafio de superar-me, consciente da minha própria mediocridade – a palavra ameaça mania de grandeza. Crônicas, ensaios, poemas, novelas, romances, me afastam do falso deus que imaginei ser para aproximar-me do Verbo que se fez gente.

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