19 julho 2011

Opinião: A quem interessa associar pedofilia à homossexualidade?


Visto no site Vermelho
Por Nágyla Drumond

Assistindo as repercussões sobre o pronunciamento da deputada estadual e ex-atriz global Miriam Ryos é impossível não se sentir instigada a respondê-la, politicamente, sobre a perversa relação que os setores mais conservadores de nossa sociedade insistem em estabelecer entre orientação sexual e pedofilia. Fui procurar o que etimologicamente significava o termo pedofilia: nada mais, nada menos do que amor de adultos por crianças. No entanto, a contemporaneidade tratou de mudar os conteúdos do termo que passou a ser compreendido, do senso comum à sociedade médica internacional, como um transtorno de preferência sexual.

Relações entre adultos e crianças dilaceradas pelos novos tempos? Perda da chamada infância inocente? Foram rompidos os limites do bem e do mal? Do certo e do errado? Do normal e do anormal? Com o quê, de fato, esta visão mecanicista das relações sociais contribuem para compreender e enfrentar um fenômeno sócio-antropológico e sexual, nada recente; mas, com novos significados e conteúdos?

Muito poderia ser dito, mas, por desconhecimento teórico em discorrer sobre o tema, e por intolerância em relação a todas as formas de preconceito e violência, proponho-me a fazer um brevíssimo recorte que vem me chamando atenção: a tríade pedofilia, mercado e erotização dos corpos infantis. É inegável, embora poucas e honrosas vozes se levantem na sociedade e nas casas legislativas, que há um verdadeiro e potente mercado da pedofilia que se retroalimenta da exibição do corpo de crianças, vendidos como objetos de consumo e de prazer por (e para) adultos de todas as idades, gêneros, classes sociais, profissões, relações de parentesco e, inclusive, orientações sexuais. E que se alimenta, inclusive, do que o mercado já capturou: dos desejos do público infantil, ditado como exigente e conhecedor do que deve ser consumido!

O mesmo Estado, que corretamente, desenvolve campanhas, programas, projetos de enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes é o mesmo Estado que não consegue vencer a batalha da criação de um marco regulatório para os meios de comunicação em nosso país e nem mesmo consegue avançar de maneira efetiva em conteúdos e práticas educativas e jurídico-punitivas. Gostaria de ver a mesma veemência na relação entre pedofilia e homossexualidades, contra a mídia e a indústria de entretenimento. Por exemplo, na promoção de variadas e exaustivas bandas de forró que fazem alusão à infância e ao corpo de crianças, especialmente de meninas, desde suas letras musicais, até às imagens e perfomances de “dançarinas-meninas que de tão ingênuas se tornam sedutoras”.

Vejam como as questões são muito mais complexas do que dizer, absurdamente - na tribuna de uma casa legislativa, evocando a proteção do deus católico, num Estado supostamente laico - que a pedofilia é prerrogativa de homossexuais. Aqui, me parece que a questão está nos esteriótipos sexuais e morais construídos em torno das homossexualidades, como “detentoras do poder de quebrar os bons costumes e a harmonia familiar burguesa”. Aliado a isto, a interdição do Estado, das Igrejas, da Medicina conservadora, do capital em relação ao corpo, patrimônio primeiro de todo ser humano.

As mesmas vozes que se levantam contra a livre orientação sexual, contra a união civil entre homossexuais, são as que ainda acham que “em briga de marido e mulher não se mete a colher”, são as que ainda criminalizam as mulheres pela decisão do aborto, são as que acreditam no modelo da família burguesa como uma “célula-base” da harmonia social, com meninos-rapaizinhos, tendo que demonstrar virilidade desde muito cedo e meninas-mocinhas incentivadas a consumir um padrão de beleza encomendado para menores. A estas pessoas e, apenas a estas, interessa o atalho demagógico e preconceituoso de aliar, indubitavelmente, pedofilia a homossexualidades.

Por um Estado Laico! Pelo direito à infância e à felicidade de nossas meninas e meninos! Por uma sociedade justa, democrática e igualitária!

*Nágyla Drumond: Feminista. Mãe. Socióloga. Professora Substituta UECE. Secretária Estadual de Mulheres PCdoB/CE.

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