04 fevereiro 2011

Que juízo fazer sobre as recentes declarações do Papa a respeito dos preservativos?


O texto a seguir (quase na íntegra), redigido por Gian Paulo Ruzzi, aluno do Seminário Maria Mater Ecclesiae (Itapecerica da Serra-SP) e seminarista da Diocese de Campo Limpo-SP, está postado em http://www.materecclesiaedobrasil.com/2010/12/que-juizo-fazer-sobre-as-recentes.html e traz à luz um feliz esclarecimento acerca das deturpadas manchetes da imprensa mundial desse fim de ano sobre um pronunciamento pessoal do Papa Bento XVI relativo ao o uso de preservativos. Leia e confira o que realmente pensa o Papa e a Igreja sobre o assunto.

No dia 20 de novembro vários veículos de comunicação publicaram manchetes bombásticas do tipo “Uso de preservativo pode ser justificado, diz Papa”; “Papa diz aceitar uso de preservativo 'em certos casos'”; “Papa admite pela primeira vez uso da camisinha 'em certos casos'”; etc. Naturalmente, as supostas alegações do Sumo Pontífice suscitaram as mais calorosas e contraditórias reações e, como costuma acontecer quando se trata de declarações do Papa, poucas pessoas realmente se dão trabalho de ler o que de fato foi dito.

A polêmica partiu de extratos do livro-entrevista Light of the World: The Pope, the Church and the Signs of the Times (Luz do Mundo: O Papa, a Igreja e os Sinais do Tempo), que será lançado dia 23 na Alemanha, com o jornalista Peter Seewald. O autor tem ainda em seu currículo outros dois volumes de entrevistas com o então Card. Ratzinger: ‘Sal da Terra’ e ‘Deus e o mundo’ de 1997 e 2001, respectivamente.

ENTREVISTADOR: “Em África, Vossa Santidade afirmou que a doutrina tradicional da Igreja tinha revelado ser o caminho mais seguro para conter a propagação da SIDA/AIDS. Os críticos, provenientes também da Igreja, dizem, pelo contrário, que é uma loucura proibir a utilização de preservativos a uma população ameaçada pela SIDA/AIDS.”

PAPA BENTO XVI: «Em termos jornalísticos, a viagem a África foi totalmente ofuscada por uma única frase. Perguntaram-me porque é que, no domínio da SIDA/AIDS, a Igreja Católica assume uma posição irrealista e sem efeito – uma pergunta que considerei realmente provocatória, porque ela faz mais do que todos os outros. E mantenho o que disse. Faz mais porque é a única instituição que está muito próxima e muito concretamente junto das pessoas, agindo preventivamente, educando, ajudando, aconselhando, acompanhando. Faz mais porque trata como mais ninguém tantos doentes com sida e, em especial, crianças doentes com sida. Pude visitar uma dessas unidades hospitalares e falar com os doentes.

Essa foi a verdadeira resposta: a Igreja faz mais do que os outros porque não se limita a falar da tribuna que é o jornal, mas ajuda as irmãs e os irmãos no terreno. Não tinha, nesse contexto, dado a minha opinião em geral quanto à questão dos preservativos, mas apenas dito – e foi isso que provocou um grande escândalo – que não se pode resolver o problema com a distribuição de preservativos. É preciso fazer muito mais. Temos de estar próximos das pessoas, orientá-las, ajudá-las; e isso quer antes, quer depois de uma doença.

Efectivamente, acontece que, onde quer que alguém queira obter preservativos, eles existem. Só que isso, por si só, não resolve o assunto. Tem de se fazer mais. Desenvolveu-se entretanto, precisamente no domínio secular, a chamada teoria ABC, que defende “Abstinence – Be faithful – Condom” (“Abstinência – Fidelidade – Preservativo”), sendo que o preservativo só deve ser entendido como uma alternativa quando os outros dois não resultam. Ou seja, a mera fixação no preservativo significa uma banalização da sexualidade, e é precisamente esse o motivo perigoso pelo qual tantas pessoas já não encontram na sexualidade a expressão do seu amor, mas antes e apenas uma espécie de droga que administram a si próprias. É por isso que o combate contra a banalização da sexualidade também faz parte da luta para que ela seja valorizada positivamente e o seu efeito positivo se possa desenvolver no todo do ser pessoa.

Pode haver casos pontuais, justificados, como por exemplo a utilização do preservativo por um prostituto, em que a utilização do preservativo possa ser um primeiro passo para a moralização, uma primeira parcela de responsabilidade para voltar a desenvolver a consciência de que nem tudo é permitido e que não se pode fazer tudo o que se quer. Não é, contudo, a forma apropriada para controlar o mal causado pela infecção por VIH/HIV. Essa tem, realmente, de residir na humanização da sexualidade.»

ENTREVISTADOR: “Quer isso dizer que, em princípio, a Igreja Católica não é contra a utilização de preservativos?”

PAPA BENTO XVI: «É evidente que ela não a considera uma solução verdadeira e moral. Num ou noutro caso, embora seja utilizado para diminuir o risco de contágio, o preservativo pode ser um primeiro passo na direcção de uma sexualidade vivida de outro modo, mais humana.»

O que foi exposto por Bento XVI é fruto de uma profunda reflexão sobre o tema. Pessoas de boa fé, principalmente quem se diz católico, devem evitar juízos temerários e procurar conhecer as motivações do Papa e a lógica interna de seu pensamento.

Retomando. Em 2006 foi encaminhado para Congregação para a Doutrina da Fé um documento sobre o uso da camisinha na luta contra a AIDS. Este documento foi encomendado pelo próprio Bento XVI ao Card. Javier Lozano Barragán, presidente do Conselho Pontifício para a Pastoral da Saúde. O texto não continha nenhuma reflexão moral ou teológica, apenas dados e estatísticas de ordem sanitária.

Em 2009, quando o Papa esteve na África, afirmou que a mera distribuição de preservativos não ajudaria a controlar a epidemia de AIDS naquele continente, pelo contrário, poderia agravar o problema. De fato, é plausível afirmar que os métodos anticoncepcionais e, mais tarde, os preventores das DST são, provavelmente, o principal catalizador da revolução sexual de meados dos anos 1960 e início dos anos 1970. Enfim, a percepção do Santo Padre é que distribuir preservativos, dentro de um contexto sociocultural que desvincula o binómio sexo-amor, ou seja, sexo-responsabilidade pelo outro, pode incentivar um comportamento sexual irresponsável. Segundo suas palavras: “a mera fixação no preservativo significa uma banalização da sexualidade, e é precisamente esse o motivo perigoso pelo qual tantas pessoas já não encontram na sexualidade a expressão do seu amor, mas antes e apenas uma espécie de droga que administram a si próprias”.

Na época, o Papa foi massacrado por todos os lados simplesmente por dizer o óbvio: somente distribuir camisinhas não resolve o problema da AIDS! Hans Küng, oportunista e rancoroso como sempre, chegou a dizer que Bento XVI ficará na história como um dos responsáveis pela propagação da AIDS na África e morte de milhões de pessoas.

Entrando no problema propriamente dito: a resposta da segunda pergunta de Peter Seewald, ou seja, de que “é evidente que ela não a considera – a utilização de preservativos – uma solução verdadeira e moral” deixa bastante claro que, da parte do Papa, não existe nenhuma mudança no juízo moral que a Igreja faz tanto dos anticoncepcionais como dos preservativos. O padre Federico Lombardi S.J., diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, esclarece: “o Papa não reforma ou muda o ensinamento da Igreja, mas o reafirma, colocando-se na perspectiva do valor e da dignidade da sexualidade humana, como expressão de amor e responsabilidade”.

A grande confusão que muitos fazem, por limitação ou por malícia, é falsear o discurso do Magistério de modo que pareça com algo semelhante a ‘faça sexo, apenas não use camisinha, por que camisinha é pecado’. Ora essa! Quem reduz o ato sexual à sua dimensão unitiva reduze-o, na verdade, à dimensão meramente egoística e já vive à margem da compreensão que a Igreja tem da sexualidade humana!

A proibição Magisterial do uso de anticoncepcionais é derivada – ou seja, secundária – da antropologia cristã que não identifica sexualidade apenas com genitalidade, mas a entende como elemento constitutivo da identidade da pessoa, como complementariedade e comunhão, como amor fecundo e abertura à vida.

Alguém poderia propor: quem não entende ou não concorda com estes princípios está dispensado da proibição em relação à anticoncepção? Um ‘raciocínio’ como este é simplesmente um atentado à razão humana! Quem rejeita o antecedente, rejeita também o consequente! Quem rejeita de forma contumaz os princípios fundamentais da moral sexual cristã já se auto exclui, ao menos parcialmente, da comunhão de fé da Igreja – note-se bem que eu não disse exclusão da Igreja.

Mas, e a justificativa que o Papa enxerga em casos como os de prostitutas, como entender? Não se trata aqui de uma exceção à regra. Quem se prostitui, independentemente de grau de culpabilidade que tenha, já não vive – como é evidente de se notar – o que o católico entende por sexualidade plenamente humana.

A declaração de Bento XVI se fundamenta em um princípio geral da moral: “um mal que realmente está aí não se pode combater à custa de uma desgraça ainda maior” (DZ 4453). O que poderá estar em jogo no intercâmbio sexual com garotas ou garotos de programa – além da real dimensão da sexualidade que já está comprometida pelo ato em si – será a vida de ambas as pessoas.

A afirmação do Papa é uma questão de bom senso! Entretanto, sua genialidade e magnanimidade conseguem vislumbrar ainda a possibilidade de “um primeiro passo para a moralização, uma primeira parcela de responsabilidade para voltar a desenvolver a consciência de que nem tudo é permitido e que não se pode fazer tudo o que se quer”.

Quem interpreta as palavras do Santo Padre como uma possível revisão da moral da Igreja – tanto os que veem algo de positivo em qualquer mudança nesse sentido, como Michel Sidibé, diretor do programa Unaids criado pela ONU para combater a propagação do vírus da AIDS, que celebra de modo claramente provocativo a colocação do Papa, como seus críticos fariseus que arrotam tradição sem entender a autenticidade da Tradição da Igreja – deixam transparecer seus preconceitos e ignorância sobre o verdadeiro sentido da Moral e da Fé, que é O Amor, que é Deus.

4 comentários:

  1. É complicado! As religiões em uma grande maioria, empata a sociedade e avançar psicologicamente e deixar de lado preconceitos sobre algo tão óbvio.

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  2. Acho que as religiões não se deviam de meter em certos assuntos, entendo o controlo da natalidade e e isso é algo muito problemático mas...quando é a saude que esta em causa o sofrimento, enfim é um assunto delicado até porque cada ser quando nasce tem o seu karma a cumprir será que devemos alterar as circunstancias,na verdade não me acho com capacidade para opinar nesta materia
    Bj

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  3. O papa para mim não tem autoridade para nada, muito menos definir algo tão pessoal,privado.
    Que dizer de uma religião sem escrúpulos que matou tanto e até se aliou até com o terceiro reich?

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  4. Viva ao skin by skin. kk

    Bjos amigo, saudades. <3

    Adorei o novo layout. *.*

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