"Maria,
Maria
É um dom, uma certa magia
Uma força que nos alerta [...]
É um dom, uma certa magia
Uma força que nos alerta [...]
O verso da Música de Milton Nascimento realmente traz um
alerta para a sociedade pernambucana e brasileira, de que "é preciso ter
força, é preciso ter raça" para suportar a perda brutal de mais uma de
suas Marias. Desta vez, a jovem Maria Alice Seabra barbaramente assassinada aos
19 anos confirma o que eu já sabia há tempos: o machismo mata. Isto porque, a
figura do padrasto e algoz da vítima, o Gildo, é similar, quiçá igual, a de
muitos outros homens nascidos e criados no Brasil. Infelizmente, ensina-se a
eles que mulher é mercadoria e que, por isso, é de propriedade indiscutível
deles.
Essa ideia de posse é defendida pelo machismo e resulta
em crimes dessa natureza, uma vez que muitos homens sucumbem ao desejo e violam
o corpo alheio desrespeitando a integridade física e moral da vítima. Com as
mulheres o machismo age diferente, ora recatando-as entre as "mulheres de
respeito", ora vulgarizando-as através da roupa, do modo de falar, agir ou
de se comportar. É desse modelo sexista de sociedade que várias Marias são
mortas, apenas por serem bonitas, femininas, jovens, desprendidas, ou pelo
simples fato de terem nascido mulher. É importante lembrar que mesmo após a
sansão da Lei Maria da Penha, os índices criminais em torno da violência de
gênero não tiveram mudanças positivas.
Para os mais informados, não é surpresa saber que no
Brasil os maiores casos de violência contra a mulher ocorram em casa,
geralmente por pessoas bem próximas da vítima, como maridos, pais, padrastos,
irmãos, etc. Crimes estes silenciosos, já que a vítima, devido a proximidade
com o agressor, não se sente segura e confortável para denunciá-lo. Foi o que
talvez tenha ocorrido com Maria Alice, que antes de ser morta, resolveu sair de
casa a ter que enfrentar mais uma vez o padrasto "protetor". E quem
não tem essa opção? Resta suportar as humilhações, cantadas e assédios de
homens asquerosos, que aparentemente passam por meros "cidadãos de
bem" no dia a dia. Nesse exato momento, por exemplo, talvez outra garota
esteja sofrendo violência de gênero em casa, ou pior, sendo estuprada
impiedosamente por aquele que deveria ser seu maior protetor.
Na verdade, é complicado esperar alguma transformação
nesse sentido enquanto o machismo é naturalizado em casa, na escola, na mídia,
na religião e em todos os lugares. Os perfis de menino e menina personificados
pelas cores azul e rosa já dão os primeiros indícios da dominação de um sobre o
outro. Depois vem a ideia de fragilidade, do sexo forte em detrimento do fraco.
Os colégios, ao invés de desconstruírem tais papeis, acabam perpetrando-os
ainda mais. Por sua vez, os segmentos religiosos dominantes no Brasil reduzem a
mulher a um objeto de procriação e somente só; ou reduzem-na a um pedaço
retirado da costela de Adão.
A lista piora quando a mídia coisifica a mulher nos
comercias de bebida; romantiza o gênero como excessivamente sentimentalista em
suas tramas; vulgarizam-nas em suas músicas ou ainda insistem na ideia de
"Amélia", mesmo que elas hoje tenham conseguido se libertar desse
rótulo. O fato é que desse tratado histórico/sociológico nascem vários
"Gildos" capazes de assediar, invadir, bater, machucar, trair, violar
e até matar mulheres se for necessário para saciar suas vontades mais lascivas.
Em meio a isso, Marias, Alices, Brunas, Carlas, Fernandas e Terezas são criadas
para servir aos caprichos desses indivíduos, sob pena de serem mortas caso não
sigam à risca tudo o que está na cartilha do ser homem e do ser mulher.
É lamentável constatar tais posicionamentos numa era
cercada pela informação. É uma pena saber que há mortes derivadas do machismo
ainda hoje no brasil. É triste saber que uma jovem de 19 anos teve todos os seus
planos interrompidos apenas porque os papeis de gênero ainda se dividem entre
os músculos e não pelos méritos. Mais triste ainda é saber que Maria Alice
Seabra não foi e nem será a última e que outras, neste momento, podem estar
perto de ter um fim semelhante ao dela. Marias de idade semelhantes ao dessa
jovem, talvez mais novas, mais velhas, talvez que não tenham nem nascido ainda.
Marias que se tornarão estatísticas da violência de uma sociedade sexista, onde
as minorias morrem diariamente e pouco é feito para se reverter esse quadro.
Marias que não devem ser lembradas apenas na dor, mas como disse Milton
nascimento, lembrada como:
''Uma mulher que merece
Viver e amar
Como outra qualquer
Do planeta''
Viver e amar
Como outra qualquer
Do planeta''
As Mulheres em geral precisam ter a consciência de que não são tão frágeis assim. Podemos sim nos defender e temos que lutar até a morte contra um abuso. Fico muito triste e revoltada quando leio notícias assim e cada vez mais tenho vontade de gritar para as mulheres do mundo todo : lutem para se defender, quem sabe esses agressores aprendem.
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