Por Ale Rocha
Pela primeira vez em alguns anos, o telespectador brasileiro presencia um romance gay pouco caricato em uma novela da Globo. Em “Ti-Ti-Ti”, o cabeleireiro Julinho Santana (André Arteche) e o empresário Thales (Armando Babaioof) vivem os encontros e desencontros do amor, retratado de forma tocante por Maria Adelaide Amaral, autora da nova versão da trama, exibida originalmente entre 1985 e 1986. Porém, nem tudo é perfeito. Infelizmente, o casal apaixonado não aparece de mãos dadas ou abraçados. Um beijo está totalmente fora dos planos. Carícias tão comuns protagonizadas por casais heterossexuais são proibidas pela direção da Globo. Enquanto cenas que insinuam sexo entre um homem e uma mulher são aceitas sem qualquer restrição pela emissora, um beijo entre dois homens, ou duas mulheres, é vetado. Em carta endereçada à Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), a emissora admitiu que censura o ato. Em nome de Octávio Florisbal, diretor-geral da Globo, a carta assinada por Luis Erlanger, diretor da Central Globo de Comunicação, primeiro utiliza a classificação indicativa do Ministério da Justiça para se defender. “Esta não se limita a ser ‘indicativa’, uma vez que efetivamente proíbe a veiculação de programas que apresentem conteúdos considerados ’sensíveis’ fora das faixas horárias determinadas.” Ora, não há nada de sensível em um beijo. Ou, pelo contrário, ele é sensível por ser a pura demonstração de afeto e amor, seja entre um homem e uma mulher, entre dois homens ou entre duas mulheres apaixonadas. Se o Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação acatar reclamações dos telespectadores contra o beijo gay, será a institucionalização do preconceito. Em seguida, a Globo diz não ser seu papel recomendar aos autores o beijo gay ou qualquer outra causa de interesse da sociedade, pois isso caracteriza condicionamento da liberdade criativa. Concordo com a defesa da emissora. Não deve recomendar. Porém, ao mesmo tempo, é censura não permitir que os autores abordem esta e outras questões que ainda são tabus. “Insensato Coração” possui diversos personagens gays. Quase todos, infelizmente, estão ligados às cenas cômicas, como se os gays fossem palhaços de circo, aceitos apenas para divertir com vocabulário e trejeitos exagerados. Para piorar, há um homofóbico assumido na trama, o esclarecido e idealista jornalista Kleber (Cássio Gabus Mendes). Ao descobrir que seu editor é gay, desabafa com a ex-mulher Daisy (Isabela Garcia). “Agora entrou um editor lá, que eu vou te contar. Uma bichinha, fica no telefone marcando encontro com o namorado na minha frente. E eu tenho que obedecer a esse sujeito.” Infelizmente, o personagem preconceituoso deve ganhar a simpatia de parte expressiva da audiência. Isso não aconteceria se Gilberto Braga e outros autores saíssem da zona de conforto e enfrentassem os telespectadores. Se a própria Globo admite na carta para a ABGLT que “a causa é a diversidade e o respeito às diferenças, e não propriamente a homossexualidade ou a heterossexualidade”, que dê liberdade aos autores para abordar o envolvimento entre pessoas do mesmo sexo por todos os ângulos. Tenho consciência que retratar um romance gay tal qual são mostrados os envolvimentos heterossexuais causará estranheza em um primeiro momento. Contudo, já que é inegável a importância da televisão na formação cultural do brasileiro, pode ser um primeiro e importante passo para que a sociedade entenda que o afeto entre pessoas do mesmo sexo é normal. Uma enorme contribuição para que casos como as agressões gratuitas a homossexuais em grandes e pequenas cidades se tornem coisa do passado e que um direito fundamental da Constituição seja garantido: todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. Ale Rocha é jornalista, escritor e crítico de televisão. Autor de "Poltrona - O livro do maior blog brasileiro independente sobre TV". Fonte: Yahoo! |
Já está na hora mesmo de rolar um beijão na TV...aff...
ResponderExcluirTava sentindo tua falta Diogo!!! Eu li esse texto no Yahoo e realmente não entendo pq as pessoas acham tão natural ver cena de sexo explicito na tv e tem tanta aversão a um simples beijo entre homens.
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