22 junho 2014

Prostituição: o retrato de uma sociedade doente.


Nas avenidas, nos clubes, nas saunas, na vizinhança e também na internet, muitos são os locais onde se pode encontrar a prostituição. Seus encantos enfeitiçam homens e mulheres há gerações. Diante de tamanha hipnose, parece que poucos notaram que há uma incoerência nessa relação da qual o sexo é comercializado. A priori, a sociedade tem a vaga ideia de que o profissional do sexo é aquele que recebe para cumprir um determinado papel. Entretanto, numa análise mais centrada, percebe-se que na prostituição não há papeis principais ou secundários. Distantes dessa teatralização sexual, o que se vê são duas pessoas carentes em busca de prazeres diferentes. Seres desejosos de uma satisfação mútua, mas que infelizmente são tolhidos de realiza-las por diversas razões. Então, surgem os guetos sexuais, espaços onde a concretização do prazer ganha vida, exibindo a verdadeira face da prostituição: a de uma sociedade que não aprendeu a lidar com o próprio ato sexual de forma naturalizada. 

Sem registros precisos na história da humanidade, mas lendariamente conhecida como a profissão mais antiga do mundo, a prostituição sobrevive na atualidade entre a liberdade de sua prática e o moralismo da sociedade. Dela, homens e mulheres, insatisfeitos com as imposições sociais de cada época, buscam uma realização sexual fora dos moldes convencionados pelos dogmas religiosos ocidentais, dos quais têm a monogamia como padrão. No entanto, essa espécie de transgressão, que é vista ora como deleite por alguns ora como uma afronta aos valores conjugais por outros, não está apenas limitada aos famosos profissionais do sexo. Numa sociedade onde o corpo é cada vez mais coisificado e a sexualidade humana ainda é vista como tabu, o resultado é a prostituição de indivíduos, que muitas vezes, nem sequer tem a noção de que estão sendo sexualmente comercializados.

Para efeito conceitual, denominam-se prostitutas aquelas pessoas que recebem dinheiro para realizar fantasias sexuais. Semelhantes ao gênio da lâmpada, esses profissionais fazem dos impossíveis sonhos dos seus clientes, a mais doce realidade. Exercendo essa função com total esmero, estão às mulheres, principais protagonistas desse teatro a dois. Elas que povoam ruas e bordeis onde homens vão buscar a realização sexual há muito tempo perdida. De idades, etnias e classes sociais diversas, são elas as responsáveis pelo deleite de homens, casados ou solteiros, adultos ou jovens, que encontram em seus braços a chave para a porta que abre o paraíso. Putas, cocotes, rameiras, acompanhantes, entre eufemismos e xingamentos, elas concretizam os desejos de uma sociedade acostumada a encontrar nos guetos o que foi privada de ter em casa.

Há também muitos homens que se renderam a esse tipo de atividade. Conhecidos como michês ou garotos de programa, muitos são os rapazes que se aventuram nesse submundo em busca de dinheiro, fama e sucesso. Nessa atmosfera, vale citar as travestis, que entram nessa vida muitas vezes por uma imposição social, da qual relega a elas a venda do próprio corpo como meio de sobrevivência. Entretanto, sejam entre mulheres, homens ou travestis, a carência sexual é o principal pivô da incessante busca da sociedade por estes profissionais. Sem uma educação libertária no tocante ao sexo, muitos indivíduos rompem com a moral e os bons costumes e vão saciar suas necessidades nos braços daqueles mal vistos pela sociedade. Diante disso surge a questão: quem realmente se prostitui?

A verdade é que, direta ou indiretamente, todos são prostituídos, antes mesmo de terem ciência disso. Tal violência acontece nos primeiros ensinamentos ligados ao sexo, seja dentro de casa, seja na atmosfera escolar. Nesses ambientes, falar de sexo ainda é tocar em casamento, procriação, filhos, nunca está relacionado ao prazer, a gozar a vida literalmente. Por essa razão, os indivíduos são violentados por uma educação que não ensina as várias possibilidades que o sexo pode oferecer, mas apenas a limitação procriativa em torno dele. Censurados, duvidosos e com muita curiosidade, estes seres logo são angariados pela indústria do sexo, a qual comercializa o prazer, que deveria ter sido ensinado com naturalidade em determinada época da vida, mas que agora se tornou cifra para aquisição de pseudoalegrias. É nesse momento que surgem os bordeis, pois é somente neles que o real prazer é permitido e onde deverá ser consumado por aqueles que foram privados dele a vida toda.

Seguindo esse raciocínio, a indústria pornográfica lucra muito com tudo isso. Com filmes, clubes e profissionais dispostos a satisfazer qualquer fantasia, esse ramo é um dos mais lucrativos do mundo.  Isso acontece, porque ao saber da carência sexual vivida pela sociedade, a pornografia cria os mecanismos perfeitos, capazes de preencher as lacunas da falta de educação sexual. Na realidade, muitos procuram por estes serviços, porque se sentem incompletos sexualmente. Então, surgem esses atores/atrizes entretendo essa sociedade prostituída, que vive num eterno dilema: vender uma imagem de país liberal, onde o sexo é livre, com suas mulheres exuberantes, geralmente corporificadas pelo samba, pelos comerciais de cervejas e pelos jogos de futebol; ou manter os tabus ancestrais nutridos por diversos segmentos religiosos, os quais veem o sexo apenas como um ato divinal? Seja como for, muitos indivíduos não estão contentes com esse modelo e buscam a todo custo transgredi-lo através do sexo pago.

Por outro lado, a banalização do sexo também contribui para que a sociedade seja prostituída. Numa cultura onde tudo cheira a sexo, desde cedo, desorientados e altamente motivados, muitos jovens são prostituídos pela mídia e seus atraentes reclames. Ora através da televisão e seus comerciais e problemas apelativos, dos quais a sensualidade é despertada em propagandas dúbias, novelas com cenas picantes e filmes impróprios; ora pela conduta musical, a qual tem banalizado o ato sexual, tornando-o muitas vezes vulgarizado entre homens e mulheres, sobretudo entre estas últimas. Sem referências reais, muitos indivíduos se deixam levar por isso e acabam se entregando ao deleite do sexo descompromissado. Isso reverbera em gravidezes não planejadas, doenças sexualmente transmissíveis e até em morte. Tudo porque a sociedade não aprendeu a experienciar o sexo como este deve e merece ser experienciado: naturalmente.


Então, diante de tudo isso, a prostituição aparece como salvadora da pátria. Ela é importante por inúmeras razões. A primeira porque naturaliza a prática sexual, proporcionando aos seus clientes a experiência prazerosa que foi roubada deles por causa de uma educação limitada em torno do sexo. Segundo porque, ela dá uma tapa na cara dos conservadores e sensacionalistas, que costumam inferiorizar os profissionais do sexo. Na verdade, quem se prostitui não são as garotas de programa ou os michês, mas quem procura pelos seus serviços. Eles sim são os reais prostitutos, pois durante o dia vulgarizam essa profissão, mas ao cair da noite se entregam aos encantos de moças e rapazes e se deixam levar por eles. Último ponto disso tudo é que a prostituição, e sua longínqua existência na terra, evidencia que a sociedade vive uma doença chamada: ausência de sexo. Por causa disso é que muitos pacientes lotam puteiros e ruelas atrás da cura para esse terrível mal, que infelizmente acomete muito mais gente do que se imagina. Sorte que o antídoto tem preços variados e é encontrado em diversos locais, sempre proporcionando alívio e relaxamento imediato a quem o procura.

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