30 novembro 2010

SEMÂNTICA E ESTILÍSTICA Teoria Conversacional



INTRODUÇÃO

Produzir linguagem significa produzir enunciados de um determinado modo, em um determinado momento sócio-histórico, o que representa, através de marcas lingüísticas, o próprio sentido e significação.

No jogo argumentativo da linguagem, as funções lingüísticas de representação e de comunicação complementam-se e se apresentam inter-relacionadas, permitindo a construção de novas representações, apreendidas e produzidas em situações sócio-comunicativas. Referindo-nos à construção de novas representações, dirigimos nossa atenção ao implícito que fundamentam, através das inferências e conhecimento prévio, a construção do sentido.

Ao produzir um enunciado, podemos regular e orientar nossas ações em um vínculo estreito com o pensamento. Dessa forma, podemos dizer que a dinâmica constitutiva da linguagem se dá, historicamente, através da ação sócio-lingüística dos falantes, pois, além de depreender o conjunto de articulações necessárias que se situa na esfera racional, também congrega as associações da vontade individual ao concretizar os atos de fala pela interação e intersubjetividade.

Considerando a multiplicidade de significações fundamentada nas intenções comunicativas do enunciador e as interações conversacionais que não consistem de enunciados desconexos ou incoerentes em situações reais de comunicação, o presente trabalho tem como objetivo o estudo do significado implícito enquanto processo inferencial de comunicação através das máximas de Grice.

A TEOARIA INFERENCIAL DAS IMPLICATURAS DE GRICE

Os primeiros textos importantes de Grice surgiram em 1956 e 1957. "Meaning" (1957) tornou conhecida a sua teoria da comunicação através dos conceitos de significação natural e não-natural (meaning-nn) tão decisivos na origem dos trabalhos sobre pragmática em especial no de Searle1. Foi, entretanto, com seu artigo "Logic and Conversation", que apareceu nas conferências realizadas pela Universidade de Harvard em 1967, em homenagem a William James que Grice provocou um dos maiores impactos teóricos na história das pesquisas sobre pragmática. Publicado em 1975, esse texto, de menos de vinte páginas, apresenta um sistema conceitual extremamente eficaz para o tratamento das complexas questões que envolvem o problema da significação na linguagem natural.

Conforme já havia demonstrado em "Meaning", a preocupação central de Grice era encontrar uma forma de descrever e explicar os efeitos de sentido que vão além do que é dito. Em última análise, como é possível que um enunciado signifique mais do que literalmente expresso. Deve haver algum tipo de regra que permita a um falante (A) transmitir algo além da frase e a um ouvinte (B) entender esta informação extra.

Grice propõe, inicialmente, um exemplo que se tornou clássico. 2 (A) e (B) estão conversando sobre (C). (A) pergunta a (B) sobre a situação de (C) no seu emprego. (B) responde: "Oh! muito bem, eu acho; ele gosta de seus colegas e ainda não foi preso". Um diálogo desse tipo observa Grice, possibilita perceber, claramente, que há duas formas de significação distintas. A resposta de (B) diz que (C) está bem e ainda não foi preso e implica ou sugere que isso pudesse ter acontecido, tendo em vista que (C) é o tipo de pessoa que pode ceder às pressões do seu trabalho e fazer algo que o leve à prisão. É a partir desse contexto que Grice introduz os termos técnicos implicitar (implicate), implicatura (implicature) e implicitado (implicatum). Seu objetivo é organizar, ao redor deles, um sistema explicativo dessa significação que (A) e (B) podem entender mas que, efetivamente, não foi dita. É importante ressaltar, aqui, que Grice usa "dito" como o significado expresso pelo enunciado em termos literais ou, em outras palavras, como a proposição em seu valor semântico. 3

Existem, dois tipos básicos de implicaturas, segundo Grice:
Implicatura Convencional que está presa ao significado convencional das palavras e a Implicatura Conversacional que não depende da significação usual, sendo determinada por certos princípios básicos do ato comunicativo.

Examinemos, inicialmente, a implicatura convencional tal como foi estabelecida, considerando os enunciados abaixo:

(1) "José é trabalhador, contudo é pobre."
(2) "João é carioca, portanto não é um homem sério."
No enunciado (1), está dito que José é trabalhador e que é pobre, mas não está dito que, sendo trabalhador, não devesse ser pobre. Isso está implicado através do significado convencional das palavras e, no caso, indicado através da conjunção "contudo”. No exemplo (2), ocorre a mesma coisa. "João é carioca" e "João não é um homem sério" é o dito.

Há, entretanto, uma implicatura convencional a partir da indicação feita pelo conetivo "portanto" de que o carioca não é serio e isso não foi, realmente, dito. Como se pode depreender dos exemplos dados, a implicatura convencional decorre da própria força significativa das palavras, sendo, por isso, intuída pelos interlocutores sem maiores dificuldades. O conceito de implicatura conversacional, porém, é o centro das atenções de Grice no seu artigo clássico e mesmo em trabalhos posteriores como o texto "Pressupositions and Conversational Implicative" de 1981.

Antes, contudo, de se analisar o conceito de implicatura conversacional, é preciso que se faça um breve comentário sobre a Teoria da Comunicação de Grice. Para ele, quando dois indivíduos estão dialogando, existem leis implícitas que governam o ato comunicativo. Isso significa que, mesmo inconscientemente, os interlocutores trabalham a mensagem lingüística de acordo com certas normas comuns que caracterizam um sistema cooperativo entre eles, para que as informações possam ser trocadas o mais univocamente possível. Grice chama, a esse conjunto de regras, "princípio de cooperação".

Não é possível, nem imaginável, segundo ele, que um ato comunicativo pudesse ser totalmente livre, a ponto de falante e ouvinte perderem o controle do próprio jogo. Ao contrário, as regras do ato comunicativo talvez tenham sido aprendidas concomitantemente à aquisição da língua, de tal forma que um falante competente do português também conhece os efeitos de sentido que uma mensagem em português pode adquirir pela ação das regras do jogo comunicacional a que está submetido. Não é por outra razão, alias, que se fala muito, hoje, numa teoria de competência comunicativa.

Nesse sentido, Grice, retomando uma formulação kantiana, sistematiza o seu "princípio de cooperação” (PC) através de quatro categorias fundamentais articuladas a máximas e submáximas.

AS MÁXIMAS DA TEORIA DE GRICE

A preocupação central de Grice era encontrar uma forma de descrever e explicar os efeitos de sentido que v o além do que é dito. Em última análise, como é possível que um enunciado signifique mais do que literalmente expresso. Deve haver algum tipo de regra que permita a um falante (A) transmitir algo além da frase e a um ouvinte (B) entender esta informação o extra.

Grice prop e, inicialmente, um exemplo que se tornou clássico. (A) e (B) est o conversando sobre (C). (A) pergunta a (B) sobre a situaç o de (C) no seu emprego. (B) responde: "Oh! muito bem, eu acho; ele gosta de seus colegas e ainda n o foi preso". Um diálogo desse tipo, observa Grice, possibilita perceber, claramente, que há duas formas de significaç o distintas. A resposta de (B) diz que (C) está bem e ainda n o foi preso e implica ou sugere que isso pudesse ter acontecido, tendo em vista que (C) é o tipo de pessoa que pode ceder s press es do seu trabalho e fazer algo que o leve pris o.

É a partir desse contexto que Grice introduz os termos técnicos implicitar (implicate), implicatura (implicature) e implicitado (implicatum). Seu objetivo é organizar, ao redor deles, um sistema explicativo dessa significaç o que (A) e (B) podem entender mas que, efetivamente, n o foi dita. É importante ressaltar, aqui, que Grice usa "dito" como o significado expresso pelo enunciado em termos literais ou, em outras palavras, como a proposiç o em seu valor semântico.

O conceito de implicatura conversacional é o centro das atenç es de Grice no seu artigo clássico e mesmo em trabalhos posteriores como o texto "Pressupositions and Conversational Implicative", de 1981.

Para ele, quando dois indivíduos est o dialogando, existem leis implícitas que governam o ato comunicativo. Isso significa que, mesmo inconscientemente, os interlocutores trabalham a mensagem lingüística de acordo com certas normas comuns que caracterizam um sistema cooperativo entre eles, para que as informaç es possam ser trocadas o mais univocamente possível. Grice chama, a esse conjunto de regras, "Princípio de Cooperaç o".

Não é possível, nem imaginável, segundo ele, que um ato comunicativo pudesse ser totalmente livre, a ponto de falante e ouvinte perderem o controle do próprio jogo. Ao contrário, as regras do ato comunicativo talvez tenham sido aprendidas concomitantemente aquisiç o da língua, de tal forma que um falante competente do portugu s também conhece os efeitos de sentido que uma mensagem em portugu s pode adquirir pela aç o das regras do jogo comunicacional a que está submetido. Não é por outra raz o, aliás, que se fala muito, hoje, numa teoria de compet ncia comunicativa.

Nesse sentido, Grice, retomando uma formulaç o kantiana, sistematiza o seu "princípio de cooperaç o"(PC) através de quatro categorias fundamentais articuladas a máximas e submáximas.

O Princípio da Cooperação - Máxima e Implicaturas

Categoria da Quantidade
Relacionada quantidade de informaç o que deve ser fornecida numa mensagem. A ela corresponde duas máximas:

Faça com que sua mensagem seja t o informativa quanto necessária para a conversação.
Não dê mais informações que o necessário.

Categoria da Qualidade
Relacionada inicialmente supermáxima "Procure afirmar coisas verdadeiras " e, indiretamente, a duas máximas mais específicas:
Não afirme o que você acredita ser falso.
Não afirme algo para o qual você não o possa fornecer evidência adequada.

Categoria de Relação
Ligada máxima "Seja Relevante".

Categoria do Modo
Ligada supermáxima "Seja Claro" e várias máximas como as citadas abaixo, entre outras:
Evite obscuridade de expressão
Evite ambigüidade
Seja breve (evite prolixidade desnecessária)
Seja ordenado.

Embora possa haver outras regras, ainda, como a da polidez, por exemplo, no circuito da comunicaç o, Grice deixa entender que as quatro categorias citadas s o suficientes para explicar o fenômeno da implicatura conversacional.

I - Nenhuma máxima é violada
(3) (A) - Estou com dor-de-cabeça. (B) - Há uma farmácia nesta rua.
(4) (A) - N o suporto mais minha m e. (B) - Freud explica isso.
(5) (A) - A crise econômica parece cada vez pior. (B) - Parece? Voc já leu "O Capital"?

Mesmo que, aparentemente, os tr s exemplos apresentem a quebra de uma máxima como a da relevância ou de uma supermáxima como a da clareza, ainda assim, n o há motivos para se afirmar que (B) violou o princípio da cooperaç o. Ao contrário, (A) poderá deduzir a implicatura conversacional exatamente por compreender que (B) está respeitando as regras do diálogo.

Em (3), (A) deduz que (B) diz haver uma farmácia na rua porque quer implicar que ela deve estar aberta e ter remédios que possam ser adquiridos por (A) para que seu problema seja resolvido.
O exemplo (4) é mais sutil, mas ainda n o representa um desrespeito ao PC. (A) depreende da resposta de (B) que ela quer implicar a natureza psicanalítica da relaç o de (A) com sua m e. No caso, a implicatura poderia remeter a um elemento do contexto cultural comum a (A) e (B) representado pelo "Complexo de Édipo".

II - Uma máxima é violada para que a outra não o seja
Neste caso, sup e-se que a máxima preservada seja mais relevante que a abandonada. (Respeito máxima de relevância quanto escolha da máxima a ser preservada)

(6) (A) - Que significa "pressuposição"? (B) - Consulte uma obra de semântica.
(7) (A) - Que horas s o? (B) - Já é tarde.
(8) (A) - Voc me ama? (B) - Eu gosto de estar em sua companhia.


Os três exemplos demonstram que a resposta de (B) quebra a máxima da quantidade por n o ser t o informativa quanto o requerido. Entretanto, (B) parece estar respondendo assim, para implicar que n o teria condiç es de oferecer uma resposta mais precisa e, por respeitar a supermáxima da qualidade, e acreditar que ela seja mais relevante no contexto que a da quantidade, prefere ser menos informativo a mentir.

No primeiro caso, (B) n o responde pergunta, oferecendo em seu lugar uma informaç o relativamente vaga mas que implica uma informaç o segura e sincera.

O exemplo seguinte também é bastante comum e os interlocutores de um diálogo, como esse, sabem perfeitamente o que (B) está dizendo e implicando. A pergunta de (A) requer uma resposta exata, a hora certa. Sabe-se, entretanto, que é muito freqüente que (B), n o tendo condiç es de dar a informaç o exigida, ofereça alguma satisfaç o pergunta, embora de forma vaga. (A) entende, perfeitamente, que (B) está dizendo que é tarde e implicando que n o pode, honestamente, dar uma resposta certa e exata para (A), mas assim mesmo, está atento mensagem e posicionando-se diante dela.

CONCLUSÃO

Ao abordarmos o conhecimento compartilhado, referimo-nos a uma intenção comunicativa que pode abranger diferentes conteúdos como o metafórico e o irônico através do significado comunicado implicitamente pelos enunciados. No decorrer das explanações, visamos à integração dos princípios que regem a conversação em uma dimensão social e psicológica nos atos de persuadir, argumentar ou simplesmente proferir um enunciado, envolvendo a subjetividade e o contexto sócio-político-histórico.

Após analisarmos as máximas de Grice em “ditos políticos”, podemos afirmar que é preciso dedicarmos uma atenção especial à comunicação verbal, em relação ao uso que as pessoas fazem da linguagem, enquanto atividade constitutiva e produtiva, pois é no jogo argumentativo da linguagem e é pelas inferências que fizemos que a comunicação se transforma em conhecimento mútuo.

Ao observarmos as implicaturas nas relações sujeito/linguagem/sujeito, que direta ou indiretamente, fazem parte do nosso cotidiano através de expressões e estruturas frasais que manifestam opiniões, divergências em idéias, ideais e decisões no contexto sócio-político-histórico, chegamos à constatação de que os atos de fala envolvem um jogo de palavras, muitas vezes, despercebido, mas um verdadeiro incluído: o implícito.

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