01 maio 2018

Cursinhos de redação para o Enem e a ética docente – por Siane Gois Cavalcanti Rodrigues*



Em tempos de divulgação dos resultados dos estudantes brasileiros no ENEM, há uma verdadeira polvorosa acerca do ranking de notas nas instituições de ensino, na mídia e nas famílias que têm filhos em idade de prestar o exame. Isso é perfeitamente compreensível, já que tal avalição traz à tona questões que dizem respeito à qualidade do ensino básico no país. No seio das famílias, por seu turno, o desempenho dos filhos na prova será determinante para o ingresso dos jovens na universidade.

Nesse ínterim, alguns cursinhos preparatórios aproveitam para fazer as suas publicidades, associando, naturalmente, os desempenhos dos candidatos aos seus nomes para angariar, no ano seguinte, mais e mais matrículas. Apinham-se, assim, em salas de aula de todas as disciplinas, um número exorbitante de alunos esperançosos de que aquele professor lhes aponte o caminho para a tão sonhada aprovação no vestibular. Não há, entrentanto, milagres nesse terreno, ainda que alguns docentes empresários de cursinho de redação propaguem essa ideia.

Há poucos dias, eu ouvi um jovem rapaz que está matriculado em um  cursinho de redação que vem ganhando muita notoriedade na cidade do Recife dizer que ele foi orientado a atribuir citações a autores aleatoreamente, mesmo que aquela pessoa nunca tenha dito aquilo, pois os corretores da redação não vão pesquisar se a fonte é mesmo correta.  Dados de pequisas também podem ser inventados e associados aos institutos porque o corretor não vai checar a veracidade da informação. Ao ouvir tal relato, não pude deixar de observar no rosto do jovem aquela velha alegria que se estampa na cara de tantos brasileiros quando o assunto é pegar atalhos, é tirar vantagem de algo, é ser, em algum momento, protagonista do famigerado “jeitinho brasileiro”. Como dira um jogador da seleção brasileira da década de 70 que, à epoca, protagonizou o que ficou posteriormente conhecido como a lei de Gerson, “(…) gosto de levar vantagem em tudo, certo? Leve vantagem você também.”

Pois bem, em tempos em que a corrupção corroi mais e mais a máquina pública, em que os escândalos envolvendo políticos de todos os níveis se tornaram corriqueiros, em que nós, cidadãos comuns, estamos, a cada dia, perdendo a capacidade de nos indignar com isso, é mesmo muito lamentável perceber como se pode alimentar em sala de aula (e de forma tão escancarada) a falta de ética. Faz-se isso quando se se ensina a alunos que, desde que eles atinjam os seus objetivos, o jeitinho brasileiro vale sim. Vale mentir. Vale burlar. Vale ser desonesto, desde que ele passe, desde que tais professores angariem mais e mais estudantes por meio das estratégias de marketing e fiquem riquíssimos. Afinal, não se trata de algo tão sério, não é mesmo? Trata-se apenas de uma pequena mentira. Trata-se da porção de desonestidade que nos cabe neste latifúndio.

E há conselhos que remetem à formação inicial desses docentes de fazer arrepiar os cabelos de quem leva a educação a sério, dados por profissionais que não investem em sua formação continuada e estão completamente alheios ao que as contemporâneas pesquisas dizem ser relevante ensinar. Conselhos que põem em xeque a competência de muitos desses professores. Esses, que dizem respeito à formação de base, são até de certa forma aceitáveis, pois sabemos que não são poucos os problemas que precisamos enfrentar para que muitos licenciandos recebam uma formação adequada em determinadas instituições de formação docente brasileiras. Mas para o outro conselho não há perdão, não há desculpas e cabe aos pais ficarem a atentos a esses sinais, para que não estejam pagando caro para que profissionais desse tipo desconstruam o que foi edificado durante anos não apenas em seus lares, mas também junto àqueles professores das escolas que, de fato, contibuem para a formação desses alunos e que, muitas vezes, sequer são mencionados na hora da colheita dos louros.


*Doutora em Letras pela UFPE e professora do departamento de letras da mesma Universidade

Visto no: Diário de Pernambuco

Um comentário:

  1. Olá boa tarde bom eu sou pessinpem redação e eu quero aprender a fazer vcs podem me ajudar

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